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Comportamento

Sem paz, mais de 2 mil mulheres têm proteção judicial contra tortura psicológica

Paula Maciulevicius | 07/06/2016 06:05
O assunto está sempre em pauta, principalmente quando essa soma termina na subtração de vidas. (Foto: Arquivo/Paulo Francis)
O assunto está sempre em pauta, principalmente quando essa soma termina na subtração de vidas. (Foto: Arquivo/Paulo Francis)

Assim como acidentes, que deixam mais sequelas que o número de mortes, a violência contra a mulher é uma tortura psicológica permanente. O assunto está sempre em pauta, principalmente quando essa soma termina na subtração de vidas.

Em Campo Grande, segundo cálculo feito ontem pelo Tribunal de Justiça, 2.028 mulheres estão com medida protetiva em vigência, contra os ex-companheiros. Isso significa que conseguiram manter distância dos agressores, por determinação judicial. Mesmo assim, a tormenta psicológica continua.

A autônoma a quem damos o nome fictício de "Maria", tem 49 anos. Os últimos 14 deles foram passados ao lado de um homem que nunca lhe ergueu a mão, mas a agrediu verbalmente todos os dias.

"Ele começou a procurar defeitos em mim, a falar que eu nunca dava atenção para ele. O que não era verdade e a me acusar de coisas que eu não fazia. Eu... Estou com a cabeça abalada".

Na mesma velocidade que as palavras saem, as lágrimas escorrem pelo rosto de quem tenta buscar o erro em si pelo que está acontecendo. Além de tudo, Maria se culpa. As agressões, segundo ela, se intensificaram nos últimos 12 meses, depois que o então marido começou um envolvimento com outra mulher.

Só na Capital são duas mil e vinte e oito - mulheres com medida protetiva em vigência, contra os ex-companheiros. (Foto: Arquivo/Pedro Peralta)
Só na Capital são duas mil e vinte e oito - mulheres com medida protetiva em vigência, contra os ex-companheiros. (Foto: Arquivo/Pedro Peralta)

A implicância verbal dele chegou às filhas dela e aos netos, por quem Maria daria a vida. E hoje nem as filhas podem mais lhe visitar.

"Como você vai se sentir bem se a pessoa está te acusando? Ele falava que eu me prostituía para os meus patrões e começou a se envolver com outra pessoa. Se ele está envolvido, para que ficar fazendo isso comigo?", se pergunta.

Na memória estão as falas repetidas inúmeras vezes: "de que eu tinha outro, que eu estava fria com ele. Mas se ele está com outra pessoa, você não vai ser a mesma. E meu sentimento, como fica?"

No trabalho, todo mundo sabia do caso extraconjugal que ele mantinha e como continuava a agir como marido doente. "Até que eu fiquei desempregada. Ele não me deixava mais trabalhar. Dizia por que eu precisava? Se eu estava passando fome por acaso..." Como a resposta era negativa, ela acabou saindo do emprego.

Se sempre foi assim? Maria nega. Lembra dos bons tempos do passado, quando era 'meu amor para lá, meu bem para cá'. O último emprego foi num restaurante e ela só pode cumprir o expediente porque tinha familiares trabalhando junto. "Aí ele não implicava..."

Em dezembro de 2015 ela registrou o boletim de ocorrência pela violência psicológica e entrou com o pedido de medida protetiva. "O que mais me doeu foi ele me acusar. Dizia até que eu era uma pessoa boa demais, e por isso todo mundo se aproveitava de mim e que para eu conseguir emprego, tinha que me deitar com o patrão", recorda.

Se é violência? Maria enxergou como sendo. "É, psicológica", responde. E como ela percebeu isso? Nos efeitos colaterais que o corpo demonstrava a partir do que ela ouvia. "Comecei a perder cabelo, a ficar sem comer, a perder a fome mesmo. Eu ficava martelando cada coisa que eu ouvia. Como que isso não vai ser uma violência?"

Por um ponto final na história não foi difícil. "Ainda está sendo".

Número das medidas é alto, reflexo dos alarmantes dados de violência doméstica no País. (Foto: Arquivo/Marcos Ermínio)
Número das medidas é alto, reflexo dos alarmantes dados de violência doméstica no País. (Foto: Arquivo/Marcos Ermínio)

A tortura psicológica ganhou uma trégua. O ex-marido respeita a medida protetiva. Foi intimado pela Justiça para entender que o descumprimento significa prisão.

O documento é dado à mulher em caso de risco à sua integridade física e psicológica. "Sempre que é concedida uma medida que vai desde a proibição de aproximação e contato do suposto agressor, até o afastamento do lar", explica a juíza da 3ª Vara de Violência Doméstica da Casa da Mulher Brasileira, Jaqueline Machado. 

Sobre o número de medidas em vigência, a juíza descreve que corresponde às mulheres que procuram atendimento. "É um número alto, porque a violência doméstica, não só no Estado, como no Brasil, ela é alarmante". 

Para "Maria", o documento representa certa tranquilidade. "Ele viu que a coisa era mais séria e sabe que a Justiça ficou do lado da mulher".

Hoje, Mato Grosso do Sul tem a maior taxa de procura por atendimento na rede pública de saúde após um caso de violência contra a mulher. São 37,4 casos a cada 10 mil habitantes.

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