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Comportamento

Serão da Saudade em colégio arranca lágrimas e promove encontro de gerações

Elverson Cardozo | 25/01/2015 07:05
Evento reuniu alunos, ex-alunos, professores e pais. (Foto: Marcos Ermínio)
Evento reuniu alunos, ex-alunos, professores e pais. (Foto: Marcos Ermínio)
Dona Vera se emociona ao falar da escola. (Foto: Marcos Ermínio)
Dona Vera se emociona ao falar da escola. (Foto: Marcos Ermínio)

Em meio a uma quantidade enorme de lembranças e a um turbilhão de emoções, Vera Lucia Moraes dos Santos, de 63 anos, não aguentou e chorou. Com o olhar carregado, tentou explicar o que sentia: “Não sei o que vai ser. Minhas pernas, quando descem do ônibus ali na Maracaju, já entram aqui”.

Ela se referia ao Colégio Latino Americano, localizado na Rua 13 de Maio, quase esquina com a Maracaju, no Centro de Campo Grande, que anunciou seu fechamento este mês após 36 anos e que, ontem (24), promoveu um “Serão da Saudade”, com alunos, ex-alunos, pais e professores.

Emocionada, dona Vera disse mais: “Eu não imagino nada depois daqui. Eu entro aqui e esqueço o mundo lá fora. Saio, cuido do meu cachorro, durmo e volto para cá”. A declaração veio depois de uma breve apresentação: “Sou auxiliar de secretaria. Faço modelo 18,19, transferência e declaração para a diretoria assinar. Também atendo ao público”.

Na função há 15 anos, a senhora lembra que a sala onde hoje trabalha, e que em breve terá de deixar, já foi ocupada pela mãe, pela filha, por um neto e por um bisneto. “Isso aqui é uma escola família”, repetia.

Proprietário, João Samper, diz que chorou lendo texto de ex-aluno. (Foto: Marcos Ermínio)
Proprietário, João Samper, diz que chorou lendo texto de ex-aluno. (Foto: Marcos Ermínio)

Para ela, que sempre teve o colégio como a segunda casa, o anúncio oficial do fechamento caiu como uma bomba. Dona Vera está bem triste. Mas não foi só ela que chorou.

O próprio dono da escola, o professor de história João Samper, de 63 anos, derrubou algumas lágrimas neste sábado. “Chorei lendo o texto de um aluno que disse que o sobrenome de muitos de nós é Latino Americano”, contou.

O sábado foi de reencontros e abraços apertados. A direção da escola colocou, no pátio, alguns murais para que alunos e ex-alunos pregassem fotos. No palco, alguns deles se apresentaram. Professores também entraram na brincadeira.

Solideia Stael Nonato Leite, de 59 anos, se rendeu à emoção. “Eu era a Tia Sol. Fui inspetora de alunos por 14 anos. Entrei como jardineira para pagar os estudos das minhas duas filhas. À época, as meninas, relembrou, ganharam bolsas. Hoje uma é pedagoga, coordenadora de uma escola do Município e a outra professora de educação física.

Solideia também se emocionou. (Foto: Marcos Ermínio)
Solideia também se emocionou. (Foto: Marcos Ermínio)

Solideia é grata ao emprego que trouxe oportunidade para as filhas e, para ela, experiência de vida. “Aqui eu cresci como mãe e mulher. Eu me emociono de ver as crianças que eu cuidei. Muitos eu acompanhei desde pequeno. Tem gente que está fazendo faculdade. Eles chegam e falam: Oi, tia Sol”.

É verdade. A acadêmica de Odontologia, Loreane Ricalde, de 19 anos, não se esquece de Tia Sol. “Ela cuidava da gente. Era o sorriso da nossa manhã e a despedida para o almoço”.

Os amigos de sala Rafael Kenzo, de 21 anos, e Leonardo Robles, de 20, têm as mesmas recordações. Os três cursaram o Ensino Médio no Latino e, ontem, fizeram questão de ir ao evento. No encontro, voltaram ao passado.

“A gente fingia que tinha coisas da Gincana Literária para fazer e matava aula”, confidenciou Leonardo, hoje estudante de engenharia ambiental. “Na Feira de Ciências a gente também vazava”, completou.

Tia Sol, a ex-inspetora, com os ex-alunos: Loreane, Rafael e Leonardo. (Foto: Marcos Ermínio)
Tia Sol, a ex-inspetora, com os ex-alunos: Loreane, Rafael e Leonardo. (Foto: Marcos Ermínio)

O professor de biologia Anderson Cação, de 40 anos, lembra bem dessas feiras. “Parava a escola. Levava o dia todo. Chegou uma época que começaram a fazer em uma chácara”. Também se recorda das viagens para Piraputanga.

“Todo ano a gente fazia com um grupo de mais ou menos 100 alunos. Era aula de campo”, afirma, ao mencionar, ainda, as viagens para Angra dos Reis, para um curso de Biologia Marinha.

Professor de biologia Anderson Cação lembrou da época que era mais cabeludo. (Foto: Marcos Ermínio)
Professor de biologia Anderson Cação lembrou da época que era mais cabeludo. (Foto: Marcos Ermínio)

Há 18 anos no colégio, Anderson acompanhou de perto todas as dificuldades. Ele sabia que o Latino não estava muito bem das pernas, mas não imaginava que fosse fechar.

A notícia trouxe tristeza ao professor. Nostálgico, Anderson se lembrou dos amigos que fez, entre alunos em professores e, no celular, mostrou uma foto de 13 anos atrás, da época em que tinha mais cabelo.

O tempo passa, as coisas mudam, mas as lembranças permanecem. A bancária Gisele Sena Bertolazo, de 29 anos, se recorda até hoje de João Samper, o proprietário do Latino, caminhando pelo pátio. “Era nosso mestre”, declarou.

Por isso, ontem, a mulher apareceu no Serão para dar um abraço no professor e pedir uma dedicatória no livro mais recente lançado por ele. É para guardar com carinho.

João assinando dedicatória para a ex-aluna Gisele Sena, hoje bancária. (Foto: Marcos Ermínio)
João assinando dedicatória para a ex-aluna Gisele Sena, hoje bancária. (Foto: Marcos Ermínio)

João agradece a todas as homenagens recebidas, mas esclarece que, embora seja historiador, não vive de passado. “Quem gosta de criar raiz é arvore”. O colégio fechou por problemas financeiros, reforça, mas ficará aberto para cursinho pré-vestibular, cursos técnicos e de ensino superior a longa distância.

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