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Conversa de Arquiteto

O que aconteceu com o Plano Urbanístico da UFMS, 50 anos depois de criado

Angelo Arruda | 06/07/2016 06:25
Paliteiro, o símbolo da UFMS.
Paliteiro, o símbolo da UFMS.

Pedro Pedrossian assumiu pela primeira vez o governo do Estado de Mato Grosso em 1966. Jovem engenheiro com 38 anos, eleito em 1965 com o apoio da esquerda, derrotando Lúdio Coelho, e embalado por uma campanha eleitoral moderna para seus tempos, apesar da ditadura militar, me contou certa vez, em entrevista em 2001, que uma de suas primeiras intenções foi criar uma universidade estadual em Cuiabá e outra em Campo Grande. O motivo: o estado de Mato Grosso era um dos mais atrasados nas estatísticas educacionais, não tinha professores suficientes para atender a rede pública e ele planejou as universidades com essa finalidade.

Alguns amigos dele do Mackenzie logo lhe deram a mão para essa empreitada e lhe apresentaram o arquiteto Oscar Arine, formado na USP. Pedrossian fez a encomenda do projeto de Cuiabá para Oscar Niemeyer – artigo aqui publicado ano passado – e pediu para Arine o plano para Campo Grande. Arine convidou outros amigos da USP, dentre eles, Sérgio Zaratin de sua turma de 1960. Eles começaram a esboçar as primeiras ideias ainda naquele ano de 1966. Todos os membros da equipe eram filiados ao PCB.

Capa do Estudo encomendado por Pedrossian.
Capa do Estudo encomendado por Pedrossian.

Nos livros de memórias dos ex-professores João Pereira da Rosa de 1993 e de Hércules Maymone de 1989, demonstram que em 1967, o Governo do Estado autorizou a compra de uma área de 96 hectares para o Instituto de Ciências Biológicas de Campo Grande e com essa decisão, iniciou-se a construção da cidade universitária. A primeira construção edificada foi a do Instituto de Ciências Biológicas, a segunda foi o Centro de Ciências Humanas e Sociais - CCHS e assim sucessivamente. Ou seja, em 1970 quando foi criada a Universidade Estadual de Mato Grosso a cidade universitária estava com a maioria de sua estrutura física em construção.

O plano urbanístico dividia a área em diversas zonas, como se vê na planta abaixo. A zona 1, denominada de “Acadêmica” é a área onde se localizam os edifícios atuais com suas estruturas de salas de aula e laboratório e administração de cursos. Essa área fica no miolo do espaço universitário, onde convergem todas as demais zonas determinadas pelo plano. Notem que os estacionamentos se localizavam fora dessa área central, no caso nas proximidades da via de circulação. A zona Comunitária, espaço destinado as atividades de extensão ou de uso da comunidade em geral, inclusive e externa à UFMS, com o Estádio de Futebol e outros usos; a zona Desportiva e Social, nas proximidades da rotatória ao fundo do Morenão; as unidades administrativas posicionadas numa região central as demais zonas com o hospital e o lago do Amor.

Esta planta abaixo, histórica pelo seu contexto, reflete a ideia de um plano para uma universidade completa, com todos os requisitos necessários ao seu bom funcionamento, integrados em suas competências e com localização de todos os principais espaços voltados para o ensino, pesquisa e extensão. Esse plano foi sendo desvirtuado pelos reitores ao longo dos últimos 20 anos.

Visão geral do Plano de 1966.
Visão geral do Plano de 1966.

Atualmente, a cidade universitária em Campo Grande possui uma área possui de 170 hectares, mas a aquisição desta área ocorreu em várias etapas, conforme nos relata o professor João P. da Rosa. “O chamado terreno I foi adquirido em 1967 para o Instituto de Ciências Biológicas no Governo Pedro Pedrossian Refere-se aos 49 hectares onde estão localizados os Centros de Ensino, Estádio Universitário, Auto-Cine, Parque Aquático, Restaurante, Monumento Símbolo, Teatro Universitário, Caixa D’água, Conjunto Poliesportivo e Ginásio de Esportes.

Cerca de 20 hectares foram acrescidos a essa área para construção do Hospital Universitário, Estação de Tratamento de Esgotos, Lago do Amor e sua barragem. O Terreno II, compreendendo 101 hectares, foi adquirido no Governo do Dr. José Fragelli. Neles estão o hospital Veterinário, delegacia do MEC, Serralheria, Diretoria de Obras, Os Laboratórios de: Química, Anatomia, Fisiofarmacologia, além do Biotério, da cantina e de todas as construções do lado direito da Avenida Filinto Muller, área cedida ao Governo do Estado de Mato Grosso do Sul, pelo Reitor Edgard Zardo” . Em 16 de setembro de 1969, o Governo do Estado sancionou a Lei N° 2.947, que criou a Universidade Estadual de Mato Grosso.

O estádio de futebol, considerado na época, o maior Estádio Universitário da América Latina com capacidade para 40 mil espectadores foi inaugurado em março de 1971. Ficou conhecido como “Morenão”, apesar de ter sido denominado Estádio Pedro Pedrossian, em homenagem ao governador.

Maquetes do Morenão e do Moreninho (esse não construído)
Maquetes do Morenão e do Moreninho (esse não construído)

O autocine (drive in) foi construído rapidamente, conforme Rosa (1993), e tornou-se um ponto de referência da Cidade Universitária. A estrutura física do autocine era: uma lanchonete, a sala de projeção, o pátio com os cogumelos contendo os alto-falantes, o telão de cimento, a portaria com a entrada e saída para carros e a bilheteria. Os recursos oriundos dos bilhetes do autocine foram destinados, através de uma portaria da Reitoria, para compra de livros para a biblioteca central e das bibliotecas das unidades que compunham a universidade.

Outras importantes edificações que compunham a cidade universitária eram: o restaurante universitário, a Piscina olímpica, o Hospital Universitário, a Policlínica Odontológica e o Teatro Universitário.

Conforme verificamos na figura abaixo, onde se apresentam os principais edifícios previstos no Plano Urbanístico, a configuração de 1966 contempla a estrutura original com os prédios dos centros – CCET, CCHS e CCBS-, o Morenão, o Auto Cine, O Restaurante e o Glauce Rocha e as piscinas além do Hospital Universitário. Esse prédios foram projetados por equipes de arquitetos de São Paulo e pelo arquiteto campo-grandense Armênio Arakelian, amigo de Oscar Arine e de Pedro Pedrossian.

Armênio projetou o Glauce, o Restaurante e o HU. Os edifícios acadêmicos que dão a linguagem da UFMS – corredores com ampla circulação aberta com jardins e salas de aula formando um complexo sistema de malha – foi da equipe de Sérgio Zaratin. As obras foram tocadas pela Construtora Construmat Engenharia.

A outra planta abaixo, vemos o sistema de ampliação dos espaços acadêmicos, preenchendo paulatinamente, os vazios deixados pela malha ortogonal. É um sistema modular de projetar, com esquadrias e vãos iguais que se repetem e se reproduzem de acordo com as necessidades de cada espaço.

Planta de implantação.
Planta de implantação.
Planta da expansão
Planta da expansão

Atualmente, com uma estrutura que abriga um campus em Campo Grande que foi sendo ampliado sem seguir o Plano Urbanístico de 1966, a UFMS precisa, urgentemente, rever seu plano de novas edificações.

Espaços foram sendo erguidos sem observar, minimamente, as condições gerais de uma universidade que está localizada em área com alto interesse ambiental de preservação, cercada de prédios importantes da arquitetura brasileira. Construções são realizadas, atendendo necessidades das áreas mas, reitores tem sido “arquitetos”, determinando local e tipo de construção que querem.

Com isso, como disse o engenheiro Fausto Mato Grosso, ex-professor, em artigo de 2014: “Quanto às novas construções, não se percebe uma harmonia mínima entre elas e o núcleo original dos prédios. Salta aos olhos uma poluição de estilos, uma distribuição aparentemente caótica na implantação de novos blocos, a perda de áreas verdes, a existência de construções precárias. Parece que a lógica dominante, aqui também, é de que governar é construir obras, aparentemente o planejamento foi substituído pela cultura do imediatismo”.

Essa UFMS que aparece nessa foto área do Google, possui o quinto orçamento público de Mato Grosso do Sul, um exército de docentes e técnicos administrativos para educar mais de 10 mil alunos, precisa de um Plano Novo, inclusive de um Novo Campus em Campo Grande, sob pena de, nos próximos anos, a acessibilidade e a qualidade dos edifícios serem tão afetados que vai ficar difícil entrar e sair de lá. A UFMS precisa discutir seus rumos urbanísticos e os arquitetos de nossa cidade deveriam se aproximar mais daquele espaço, que inclusive já graduou mais de 300 profissionais.

Planta Aérea atual.
Planta Aérea atual.
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