Guavira volta às ruas e renova o sabor da primavera em Campo Grande
Fruta símbolo do Cerrado traz renda extra na temporada, lembranças e novos admiradores

A fruta símbolo de Mato Grosso do Sul voltou às ruas de Campo Grande. É o início da temporada da guavira, que anuncia o fim da seca e o começo das chuvas. Desde o amanhecer de sexta-feira (31), as primeiras barracas já chamavam a atenção em frente ao Cemitério Cruzeiro e no Mercadão Municipal. Para quem vende e para quem compra, a cena se repete todo ano, mas nunca perde o encanto.
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A guavira, fruta símbolo de Mato Grosso do Sul, retorna às ruas de Campo Grande marcando o início de sua temporada. Comerciantes já montam suas barracas em pontos estratégicos da cidade, como o Cemitério Cruzeiro e o Mercadão Municipal, atraindo consumidores que buscam o sabor característico do Cerrado. A safra, que costuma durar apenas um mês, teve início tardio este ano devido à seca prolongada. Grande parte da fruta comercializada vem do Paraguai, onde a produção é mais abundante. Vendida a R$ 20 o litro, a guavira desperta memórias afetivas nos consumidores e representa uma importante fonte de renda para comerciantes temporários.
O comerciante e cabeleireiro Renato de Menezes, de 38 anos, veio de Indianápolis, no Paraná, e desembarcou na Capital nesta semana, animado com o novo trabalho temporada da fruta. “Cheguei na terça e fico até meados de dezembro, quando a safra termina”, conta. É a primeira experiência vendendo guavira e também a primeira vez em Mato Grosso do Sul.
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Ele explica que foi convencido pelo fornecedor a apostar na fruta. “Ele me disse: ‘Renatão, você vai adorar, nem vai ver o dia passar porque é um cliente saindo e outro chegando’”, lembra rindo. A promessa foi de boa renda e Renato espera faturar 40% a mais do que costuma ganhar vendendo frutas tradicionais como maçã, laranja e pitaya.
A confiança não é à toa. “As guaviras chegaram às 9h e já deslanchou. E olha que é o primeiro dia, ainda estão meio verdes”, comemora sobre a procura.
Entre os primeiros clientes estava Sirlene Nunes, de 46 anos, dona de casa e moradora de Camapuã. Ela vem a Campo Grande toda semana para acompanhar a filha que estuda na cidade e não resistiu à banca cheia. “Passei de manhã, vi a barraca e voltei agora à tarde. Eu adoro guavira. Conheci com 30 anos e nunca mais deixei de comprar. É só uma vez por ano, tem que aproveitar”, diz.
Sirlene gosta da fruta pura, sem misturas. Já fez até um curso sobre colheita, mas prefere comprar. “O sabor dela é único. Não é só fruta, é lembrança boa”, completa.
Fruta e memória
Para Marcos Antônio Guia Lopes, de 68 anos, a guavira é uma viagem no tempo. Tataraneto do desbravador que dá nome ao município de Guia Lopes da Laguna, ele nasceu em São Paulo, mas conheceu a fruta nos anos 1970, em Miranda. “Em São Paulo tem de tudo no Mercadão, menos guavira”, brinca.
Morando em Campo Grande há dois anos, Marcos cultiva um pé de guavira na chácara que mantém na saída para São Paulo. “Dá pouco fruto, então compro aqui sempre que posso. É afetivo. Quando vi de novo, veio aquele cheiro de infância”, conta. Hoje ele levou só um litro porque as frutas ainda estão verdes, mas promete voltar.
Cruzando a fronteira

No Mercadão Municipal, o movimento também começou forte. O comerciante Paulo Maja, de 41 anos, trabalha no local desde 2009 e há três anos decidiu incluir a guavira nas vendas. O lado negativo é que o fornecedor nem é brasileiro. “A maior parte vem do Paraguai, porque lá tem mais. Aqui é mais difícil de achar”, explica.
A temporada costuma durar apenas um mês. “No Paraguai, dá em outubro; no Brasil, em novembro. Mas este ano atrasou por causa da seca. Ficamos dois meses sem chuva e a fruta só começou a aparecer no dia 25”, detalha.
Ele aponta a diferença entre as frutas dos dois lados da fronteira. “A paraguaia é maior, mas a nossa é mais doce.” Segundo Paulo, os primeiros dias são lentos porque as guaviras chegam verdes, mas a procura cresce rápido. “Tem cliente que vem atrás desde o começo do mês. Eles lembram da infância, do gosto do Cerrado.”
Para fortalecer essa memória, em 2022 o governo do Estado plantou guavira no Parque das Nações Indígenas, mas o plano era passear e catar a fruta do pé não vingou. As árvores secaram.
Férias pela guavira
O servidor público Fábio Campos, de 44 anos, vem de Ponta Porã e tira férias nesta época todos os anos para trabalhar com a fruta. “São seis anos viajando pra trazer guavira pra cá. Aqui mesmo em Campo Grande você não acha com facilidade”, explica.
Ele conta que conheceu o fruto ainda criança, pelos picolés feitos pela tia. “Tem muito sentimento envolvido. E tem cliente que me procura todo ano, já virou tradição.”

No mesmo corredor do Mercadão, a trabalhadora rural Ceneide Souza, de 55 anos, parou na banca para comprar não para comer, mas para plantar. “A gente tem que valorizar isso aqui senão nosso planeta vai acabar”, diz. Moradora de uma fazenda em Figueirão, ela costuma vir a Campo Grande todo mês para consultas médicas. “Vi a guavira e parei na hora. Tenho esse costume, sempre planto.”
Ceneide diz que espera o ano todo por esse período. “Fico contando os dias pra chegar a época da guavira. É um presente do Cerrado.”
O pai dela, José França de Souza, de 85 anos, também estava por ali. “Eu gosto de plantar desde sempre, e a guavira é especial. Lá na fazenda a nossa é menorzinha, não é tão suculenta quanto essas daqui”, comenta.
Um símbolo do Cerrado

Entre os veteranos do Mercadão, o comerciante Carlos Corrêa, de 61 anos, é quase uma enciclopédia viva das feiras de Campo Grande. Trabalhou ali desde os 13 anos e lembra quando a guavira começou a ganhar espaço. “Faz uns 15 anos que ela apareceu com força. Antes, o pessoal colhia nos campos. Com o desmatamento, isso mudou.”
Mesmo aposentado, ele continua frequentando o local e comprando guavira com o amigo Fábio. “Já vi muito turista provar e se apaixonar. Às vezes acham caro, R$ 20 o litro, mas é um trabalho difícil, de colheita delicada. Guavira é patrimônio cultural de Mato Grosso do Sul, deveria ser mais valorizada, com políticas de preservação.”
Com o cheiro doce no ar e o vai e vem de fregueses nas barracas, a safra de 2025 promete ser de boas vendas e de reencontros com memórias que só a guavira desperta.
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