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As sociedades em conta de participação e os negócios imobiliários

Por Luiz Felipe D’Ornellas | 30/03/2018 10:15

Um tipo de associação amplamente utilizada pelo setor imobiliário é a Sociedade em Conta de Participação (“SCP”). Neste tipo de modalidade, duas ou mais pessoas (físicas ou jurídicas) se reúnem para exploração de determinados negócios e/ou projetos, de modo a somar esforços e recursos, participando, pois, dos resultados obtidos ao longo da vigência da sociedade.

Possível citar como exemplo desses negócios além das incorporações prediais, os loteamentos; as atividades médico-hospitalares cujo propósito é o tratamento que dependa da aquisição de um equipamento de alto custo, por exemplo; a exploração de artigos de época (Páscoa, Natal, Dias das mães, Carnaval, etc); investimento em startups; entre outros.

Em outras palavras, este tipo de sociedade é definido como um contrato para uso interno entre as partes signatárias, existindo somente entre elas e não aparecendo perante terceiros.

A SCP no setor imobiliário é utilizada muita das vezes para captação de recursos com investidores, e revela-se vantajosa, principalmente com relação à tributação.

O dispositivo legal que instituiu a Sociedade em Conta de Participação é o Código Civil, nos seus artigos 991 a 996.

Art. 991. Na sociedade em conta de participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos resultados correspondentes.

Parágrafo único. Obriga-se perante terceiro tão-somente o sócio ostensivo; e, exclusivamente perante este, o sócio participante, nos termos do contrato social.

A SCP possui dois tipos de sócios: o sócio ostensivo, que é o responsável por exercer a atividade constitutiva do objeto social da SCP em seu nome e sob sua própria e exclusiva responsabilidade perante terceiros; e, o sócio participante ou sócio oculto, que não aparece perante terceiros, permanecendo “oculto” na sociedade, obrigando-se tão somente perante o sócio ostensivo, nos termos do contrato da SCP.

Assim, na Sociedade em Conta de Participação, a atividade constitutiva do objeto social será exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos resultados correspondentes.

Os direitos dos sócios participantes são, em regra, os mesmos dos sócios de qualquer sociedade empresarial, ou seja: i) participação nos lucros e/ou resultados, na proporção ou não do capital investido, conforme convencionado no contrato de SCP; ii) direito de responsabilizar o sócio ostensivo por abuso ou descumprimento das obrigações previstas no contrato de SCP; iii) direito de exigir a dissolução da sociedade, nos casos e nas hipóteses previstas no contrato, entre outros.

Importante mencionar que a SCP não possui personalidade jurídica, o que significa dizer que seu contrato de constituição não necessita de registro para sua existência, tampouco de qualquer outra autorização ou aprovação de qualquer órgão. Em razão da ausência de personalidade jurídica, o sócio ostensivo é quem responde por suas atividades, conforme mencionado anteriormente.

No entanto, nada obsta que se efetue o registro do ato constitutivo da sociedade no Registro de Títulos e Documentos, com a finalidade de proteção dos interesses dos envolvidos.

Apesar da ausência de formalidades, a SCP precisa ter uma escrituração contábil específica, razão pela qual é obrigatória a emissão de um Cartão CNPJ.

A Receita Federal do Brasil, por meio da IN 1.470/2014, traz as normas pertinentes ao CNPJ, no Anexo V - onde consta a Tabela de Natureza Jurídica e Qualificação do Quadro de Sócios e Administradores – na qual admite a inscrição no código “212-7 - Sociedade em Conta de Participação”.

Importante lembrar que a inscrição no CNPJ não altera a natureza jurídica da SCP, uma vez que este CNPJ não possui capacidade jurídica, ou seja, não contrata, não compra, não vende, não assume responsabilidades (as quais são todas realizadas pelo sócio ostensivo, conforme mencionamos anteriormente).

A contribuição financeira do sócio participante tal como terrenos ou aportes de capital, juntamente com a do sócio ostensivo, constituem patrimônio especial, objeto da conta de participação relativa aos negócios sociais, observando que a especialização patrimonial somente produz efeitos em relação aos sócios.

Com relação à tributação, a distribuição de lucros ou dividendos é considerada isenta, em qualquer circunstância, mesmo os lucros distribuídos da SCP. Assim, todo e qualquer repasse financeiro aos sócios da SCP será feito a partir do lucro contabilmente apurado - originário da venda das unidades – configurados como isentos de tributação.

Tal entendimento também poderá ser aplicado caso o sócio da SCP queira receber a própria unidade edificada a título de lucro, porém o mesmo deverá arcar com o ITBI decorrente da escrituração do referido nem em seu nome.

Diante disso, na declaração de renda Pessoa Física deverá ser informado no campo próprio os “lucros distribuídos de SCP” no grupo de rendimentos isentos e não tributados. No caso de sócios pessoa jurídica os lucros distribuídos de SCP são contabilizados como receitas não tributadas e declaradas na DIPJ.

Os resultados da SCP devem ser apurados pelo sócio ostensivo, que também é responsável pela declaração de rendimentos e pelo recolhimento dos tributos e contribuições devidos pela SCP.

Há que também se considerar a possibilidade de se instituir uma governança corporativa na SCP. Muito comum a criação de um Comitê ou Conselho Fiscal, composto por profissionais com determinada expertise indicados pelas partes signatárias do contrato de SCP, cujas funções podem ser: orientação; fiscalização; auxilio na tomada de decisões técnicas; etc., a serem tomadas no âmbito da SCP.

Como a SCP não possui personalidade jurídica própria, mas tem natureza contratual, a dissolução da sociedade se dará com uma simples prestação de contas, a ser levada a efeito pelo sócio ostensivo em favor dos participantes, tendo em vista o negócio empreendido e a parte dos lucros ou prejuízos que toca a um e outros.

Deste modo, o sócio ostensivo deverá observar no processo de liquidação as normas relativas à prestação de contas previstas na lei, uma vez que essa sociedade não segue as regras de registro e publicidade, pois seus efeitos operam apenas entre os integrantes e nunca perante terceiros.

Por fim, imprescindível mencionar que a falência do sócio ostensivo acarreta a dissolução da SCP e a liquidação da respectiva conta.

Sendo essas as considerações pertinentes a respeito das Sociedades em Conta de Participação, e entendendo que as SCPs são excelentes “veículos” para operacionalização de ótimos negócios imobiliários, orienta-se a procura de profissional qualificado e experiente para a implementação dessa estrutura, a fim de gerar segurança a todos os envolvidos.

*Luiz Felipe D’Ornellas é advogado especialista em Direito Societário

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