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As transformações socioespaciais no Centro-Oeste e a expansão de Brasília

Por Aldo Paviani (*) | 19/07/2017 09:17

A Marcha para o Oeste, preconizada pelo governo Vargas, foi processo concretizado nos últimos 60 anos. A ideia central era povoar o interior, sobretudo o Centro-Oeste, onde era incipiente a ocupação do território, e promover o desbravamento da fronteira agrícola. O processo teve período de pico com a construção de Brasília, a partir de 1957.

Os mapas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram o sucesso do deslocamento da mancha populacional e urbana para o interior. Esse povoamento resultou no avanço do agronegócio, com sacrifício dos biomas, que foram perdendo terreno. Por isso, deve-se redobrar os cuidados ambientais, pois o cultivo da soja e a criação de gado avançam.

Essas atividades se caracterizam por ter fome de terras, ocupando grandes extensões do Centro-Oeste, chegando às fímbrias da Amazônia. A mídia anuncia desmatamentos e queimadas de porções da floresta, que sacrificam espécies vegetais e animais, muitos em extinção.

Além dos aspectos ambientais, nota-se intenso povoamento urbano, em lugares que funcionam como entrepostos e fornecimento de insumos para a pecuária e a agricultura. Além disso, a estocagem de soja e de carnes requer meios de escoamento e infraestruturas, estradas e ferrovias, ainda em construção.

Nos anos 1990, houve demanda de mão de obra no Centro-Oeste, ocasionando migração de trabalhadores. Com isso, as cidades incharam, como é o caso de Campo Grande, Rondonópolis, Goiânia, Cuiabá e Anápolis. Na última, houve instalação de indústrias de variados portes. Foi construído aeroporto de cargas, com duplicação da rodovia Brasília-Goiânia.

Com a implantação da capital federal, revigoraram-se as correntes migratórias para atender a construção civil. Nos últimos anos, houve redução migratória, que não chegou a evitar o exagerado crescimento vegetativo. De fato, a Codeplan (Pdad/2015) estima que, dos 2.906.574 habitantes do Distrito Federal (DF), 1.421.808 aqui nasceram e 1.484.808 pessoas migraram de outras unidades da Federação.

Portanto, há certo equilíbrio entre o crescimento populacional interno e a atenuação do ímpeto migratório de 40 ou 50 anos passados. Isso não afasta a preocupação com o exponencial crescimento de Brasília e de seu colar metropolitano, com mais de 4 milhões de habitantes.

A escala urbana do DF se agigantou, sendo uma das grandes cidades brasileiras - metrópole nacional - segundo o IBGE. Todavia, a expansão demográfica não se fez acompanhar de diversificação de atividades econômicas de igual envergadura.

Em outras palavras, as pesquisas revelam que, desde muito tempo, está o DF refém de atividades terciárias e quaternárias públicas e privadas. Por injunções várias, o setor industrial é incipiente e tem potencial de expansão. Nesse caso, deve-se dar especial atenção ao ambiente natural.

Nas últimas décadas, o DF apresentou elevadas taxas de desemprego, atingindo 132 mil pessoas ou 16,5% em 1996. Em 1997, os desempregados eram 156.600, ou 18,1%, conforme Pesquisa de Emprego/Desemprego (PED/Dieese, 1997).

A curva dos desempregados se mantém ascendente: passados 20 anos, o número de desempregados quase foi multiplicado por dois - 338 mil, ou 20,4% da população economicamente ativa (PEA) de maio de 2017 (PED/Dieese/Codeplan/Setrab).

Nessas duas décadas, a PEA se ampliou: era composta de 861.400 pessoas, em 1997, e, em 2017, chegou a 1.658.000 pessoas com idade acima de 14 anos. Isto é, chegamos perto de uma duplicação de números, o que exige economia diversificada e robusta para que as atividades ganhem terreno.

O perfil de empregos, estabelecido ao se inaugurar Brasília, se esgotou nesse percurso de 57 anos. Em recente estudo da Codeplan (Idecon/1º Trimestre/2017, p. 7), constata-se que "o setor de serviços é o maior responsável pela dinâmica econômica do DF, representando 92,9% da economia".

Esse setor chegou ao limite de expansão, tornando-se insustentável. Também será incontrolável, em razão da grave crise nacional que se abate sobre o DF, por sua dependência do poder central. Fechada a torneira dos gastos e dos investimentos federais, a crise será ampliada.

Diante desse quadro e da estimativa de emprego apontada pela PED, as localidades mais carentes e distantes do DF apresentam desemprego mais preocupante. Pelo exposto, considera-se necessário olhar o futuro com planejamento de médio e longo prazos para o DF.

Em resumo, como será o futuro? Como projetar mudanças ou transformações nas estruturas socioespaciais para ampliar a qualidade de vida dos habitantes desta grande região, em especial de Brasília?

(*) Aldo Paviani é professor emérito da Universidade de Brasília e Pesquisador Associado Departamento de Geografia e do Núcleo de Estudos Urbanos e Regionais (NEUR/CEAM/UnB). Graduado em Geografia e História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e Livre Docente/doutor pela Universidade Federal de Minas Gerais. Tem experiênica em Geografia Urbana, atuando principalmente nos temas: urbanizacão em Brasilia, gestão do território, planejamento urbano, exclusão socioespacial e emprego/desemprego em áreas metropolitanas.

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