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No século XXI, a fotografia é hiper

Por Juliano Serra Barreto (*) | 22/08/2011 07:00

Hiperfotografia é o termo usado para a transformação resultante do encontro do mundo digital com as centenárias técnicas e práticas fotográficas. No mundo de celulares, câmeras inteligentes e fotoblogs, de interatividade e movimento constantes, a fotografia digital vem provocando importantes modificações socioculturais, que vão muito além das incríveis novidades tecnológicas advindas do pixel, o elemento da imagem.

Fotos em 3D, panoramas em 360º, imagens georreferenciadas e imersivas, visão noturna e novas apropriações fotográficas na videorreportagem configuram um inédito e infinito universo de possibilidades de recriar a realidade, tanto num sentido documental quanto artístico. Vide Mediastorm e a agência fotográfica Magnum. Os limites éticos entre um e outro uso dependem, é claro, do agente produtor.

O termo hiper se origina do grego hupér, tendo como significado: acima, acima de, super, muito, demais, para lá de. Apenas a possibilidade de conferir como ficou uma foto que acabou de ser feita poderia merecer este prefixo (e a Polaroid seria a pioneira). Entretanto, trata-se de muito mais que isso, quando se junta o tratamento digital e a inserção na rede mundial.

Um dos primeiros a conceituar o termo hiperfotografia foi Fred Ritchin que, em 1990, estabeleceu uma analogia com o hipertexto, em suas características associativas, não-lineares, multivocais, de narrativa aberta e descentralizada. Para ele, com essas novas possibilidades, a hiperfotografia torna-se capaz de reconfigurar o campo do visual, muito além da fotografia analógica.

Tanto a fotografia convencional como a hiperfotografia são formas de entendimento da realidade. Porém, como diz Bueno (2010), “no discurso hiperfotográfico, o conteúdo imaginário se sobressai ao fator existencial; há uma reconstrução do objeto a ponto de torná-lo outro e esse processo está mais para a criação de um universo imaginário artístico, controlado subjetivamente, do que para a representação de existentes”. Em outras palavras, “se a fotografia convencional percorre a realidade pelo lado existencial, a hiperfotografia se move entre o caos e as possibilidades criativas, no mundo das

representações hipotéticas”.

Filha do capitalismo moderno, a fotografia é a resposta da era da máquina à busca do realismo. Para o senso comum, a principal lógica da fotografia é que a mensagem é sempre referente a uma realidade concreta, portanto denotada. A conotação é mais afeita à pintura, ao teatro, à musica e raramente reconhecida na fotografia. Mas a fotografia digital tornou a gravação de imagens uma forma de lazer e de construção de identidades, e a cibercultura, a interatividade, acentuam um prazer fotográfico, propondo novos significados e usos das imagens pessoais e da realidade cotidiana.

As experiências se multiplicam e vemos a cada dia novos mundos criados pela imagem sintética, como no trabalho de J.F. Rauzier que justapõe milhares de fotografias para criar uma imagem realista e superdetalhada, porém imaginária. Ou no de Stefan Wojnecki, igualmente instigante artista da fotografia pós-midiática. E também nos hibridismos de Richard Linklater nos filmes Walking Life e A Scanner Darkly.

Hoje, com os reduzidos custos, a fotografia vai se tornando tão efêmera e profusa quanto a palavra falada. Somente no Flickr são inseridas 5.000 imagens por minuto. Na internet, onde o texto e a imagem perdem a relação hierárquica, as imagens passam a compor novas maneiras de conversação, em que a informação não é exclusiva da palavra e a foto não é mera ilustração do texto.

Na hiperfotografia, os links são a chave de uma conversa múltipla e variada, em que um assunto leva a outro, num diálogo em que muitos se conectam a muitos outros. Na hiperfotografia a imagem “explode em seu poder conotativo de comunicar algo e passa

a ser uma forma corriqueira de registro, observação, comentário”

(Silva, 2007)

O Dia Mundial da Fotografia comemora o processo fotográfico, criado por Louis Daguerre, e declarado “Livre para o Mundo” a 19 de agosto de 1839 pelo governo francês. Nestes 172 anos de existência da Fotografia, atingimos um momento de potencialidades infinitas tanto

técnicas quanto sociais, e um futuro luminoso, porque é fotográfico, mas que guarda em si todo o passado de representações que nos trouxeram até aqui.

(*) Juliano Serra Barreto é professor Adjunto do Departamento de Desenho Industrial, do Instituto de Artes, da Universidade de Brasília. Possui Graduação em Cinema pela Universidade Federal Fluminense, Mestrado em Arte e Tecnologia da Imagem e Doutorado em Ciência da Informação e Documentação, ambos pela Universidade de Brasília. É pesquisador no grupo Representação e Organização da Informação e do Conhecimento/UnB. Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Fotografia e Cinema.

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