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O perigo da riqueza

Por José Pio Martins (*) | 17/06/2016 13:58

Em palestra para uma família empresária, a filha do fundador me perguntou quais os maiores perigos em que incorrem os herdeiros. Respondi que são vários, mas destaco perigos bastante sérios. O primeiro é acreditar que, por ter herdado patrimônio, o jovem automaticamente herda talento e vira empreendedor.

Quem pensa assim acaba tornando-se arrogante e pavimenta o caminho do próprio fracasso. Estudos mostram que muitos herdeiros e ganhadores de loterias voltam a ser pobres justamente por pensarem que a riqueza os tornou empresários. Eles compram fazendas, abrem negócios, até que, por falta dos talentos de empreendedor, acabam na falência.

Empreendedor ou empresário é alguém que tem certas características peculiares – tais como visão comercial, estômago para correr riscos, capacidade de liderança, espírito de iniciativa e tirocínio para negócios – sem as quais o sucesso é impossível. Tais virtudes não vêm com prêmio de loteria nem com herança. Nos bancos escolares aprendem-se técnicas e ciências, mas não se adquirem dons naturais típicos do empresário.

O segundo perigo é perder (ou não ter) a capacidade de ouvir. Herdeiros bafejados pela riqueza patrimonial correm o risco de perder a capacidade de ouvir. Alguns já não têm essa virtude mesmo antes de a fortuna cair-lhes nas mãos. É um defeito grave. É grande a lista de empresas falidas nas mãos de herdeiros que não têm o talento nem a capacidade empreendedora dos pais, mas não se deram conta disso, tornaram-se arrogantes e não cultivaram a capacidade de ouvir.

A soma de juventude, herança milionária e poder de decisão pode ser uma bomba nas mãos de jovens que não foram preparados para fugir dos vícios próprios de quem herda fortunas. Foi por aí que respondi ao questionamento da moça, a quem sugeri estudar e se preparar para progredir por mérito e conhecimento. Também sugeri um programa de treinamento para descobrir se ela tem ou não os talentos e as habilidades típicas do empreendedor.

Antes de herdar a fortuna e assumir a liderança dos negócios, o jovem deve cultivar as virtudes da humildade e da capacidade de ouvir e aprender. E, se descobrir que lhe faltam os talentos do empreendedor – o que não é nenhum demérito –, deve entregar a direção dos negócios para profissionais honestos e competentes. Herdeiros podem preservar e expandir o patrimônio participando dos conselhos de administração e contratando assessores e auditores para acompanhar e fiscalizar os negócios.

A absoluta maioria das empresas brasileiras é de natureza familiar e elas serão herdadas por filhos, netos e parentes dos donos. Logo, é do interesse do país que esse tema seja difundido e faça parte dos cursos de graduação e dos programas de treinamento. A propriedade do capital não é um privilégio a serviço da vida boa dos possuidores. Pelo contrário: em um sistema competitivo, os proprietários devem ajustar suas ações aos interesses do consumidor e ser eficientes para competir e ter sucesso nos negócios. Ou é isso ou é a falência.

Os herdeiros que não entenderem isso e não descerem do pedestal da arrogância acabarão por validar o velho ditado popular: “pai rico, filho nobre, neto pobre”. O fracasso dos ricos não prejudica apenas a eles. Perdem todos. Perdem os patrões, perdem os empregados, perde o país.

(*) José Pio Martins é economista.

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