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Capital

Dificuldade dupla: recuperar infrator inclui combater droga

Paula Vitorino | 18/10/2012 11:23
Dificuldade dupla: recuperar  infrator inclui combater droga
Atrás das grades, ressocialização passa pela recuperação das drogas. (Foto: Rodrigo Pazinato)
Atrás das grades, ressocialização passa pela recuperação das drogas. (Foto: Rodrigo Pazinato)

“Roubei para comprar droga e acabei matando por causa dela também. Tava usando muita droga na época (em 2011)”. A frase é de jovem de 18 anos, internado há 1 ano e 3 meses na Unei (Unidade de ) Dom Bosco, mas reflete a realidade da maioria dos adolescentes infratores.

A droga, seja de qualquer tipo, é fator comum na vida de 80% dos 67 adolescentes internados atualmente na unidade, de acordo com a direção. Mais que isso, ela também motivou ou foi a própria causa do crime praticado.

No quadro geral dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa, seja de internação ou em liberdade, a maioria roubou, furtou e até matou para sustentar o vício. A pasta-base de cocaína é a líder, mas a maconha é a porta de entrada para o vício, avalia direção.

São cerca de 250 internos nas uneis de todo o Estado e 400 adolescentes que cumprem medida de meio aberto só em Campo Grande.

"Comecei com cigarro e pasta-base. Eu quero parar", conta adolescente de 14 anos, internado há 1 mês por participação em sequestro.

Diante desse ciclo vicioso que leva ao crime, a ressocialização, que é objetivo das Uneis, passa pela recuperação do adolescente da dependência química.

“A droga é hoje o principal fator que leva ao crime. Às vezes ele pratica para sustentar o vício, para pagar a dívida com o traficante”, diz o juiz da Vara da Infância, Juventude e Idoso, Roberto Ferreira Filho.

Sendo assim, esse adolescente precisa ser recuperado, tratado, para não voltar a ter as mesmas motivações e praticar crimes. O juiz ressalta que quando se fala em menor infrator o foco não é na punição, mas na recuperação.

“É claro que a medida tem o caráter de responsabilizar o adolescente pelo ato, mas o mais importante é evitar que ele volte a fazer a mesma coisa. Então, se você aplica só a punição ele volta do mesmo jeito para a roda de convivência, para as drogas, para família desajustada e, então, vai voltar a fazer novamente a infração. Então, o que nós queremos e precisamos é tratá-los”, explica.

Nesse processo de resgate da vida do adolescente, o juiz também lembra que por trás do ato infracional de um adolescente sempre existe todo um “processo de vida”, que além do vício muitas vezes foi marcado por traumas, que contribuíram para o levar até o caminho do crime.

Por isso, todo adolescente infrator tem um PIA (Plano Individual de Atendimento), que tem o objetivo de fazer uma radiografia da vida do jovem, com destaque para a dependência química.

Tratamento - É com base no PIA, que é atualizado a cada três meses pela equipe socioeducativa da Unei, que o melhor tratamento para cada adolescente é indicado.

O juiz explica que existem níveis de drogadição: aquele que só utiliza a droga ocasionalmente, o usuário frequente e o mais grave, que é o dependente crônico, que não consegue mais ficar sem a droga.

No entanto, ele afirma que na realidade do adolescente infrator a maioria faz uso constante da droga ou já se tornou um dependente crônico.

A partir de uma primeira avaliação, é definido se o adolescente precisa passar por internação para desintoxicação, ou até para período de tratamento, ou apenas atendimento ambulatorial, com medicação.

“Normalmente não precisa haver internação no tratamento. Se ele já está cumprindo medida de internação na Unei, ele já está em abstinência, então, basta o tratamento ambulatorial com os medicamentos”, diz.

Dentro da unidade não é permitido nem o uso do cigarro. Já houve casos de visitas tentarem levar drogas para os internos, mas os agentes flagraram o ato.

Os psicólogos da Unei Dom Bosco explicam que os adolescentes recebem acompanhamento fora da unidade no CAPS AD (Centro de Apoio Psicossocial Álcool e Droga), com a medicação.

Dentro da unidade a equipe de saúde acompanha o adolescente, cuidando também da parte psicológica, mas ainda não existe um programa especifico, com terapias, por exemplo, para o tratamento da droga.

No caso da desintoxicação, o adolescente pode ser levado para o Hospital Nosso Lar ou Regional, em Campo Grande. Mas quando existe a necessidade de internação por um período maior para o tratamento o adolescente vai para uma chácara mantida pelo Estado, no município de Jaraguari.

O juiz frisa que “Campo Grande já necessita de um espaço assim”.

Decisão - Mas além, e talvez até mais importante que toda a estrutura para tratamento, está a vontade do próprio adolescente em mudar de vida e largar o vício.

Os psicólogos dizem que existem meninos que pedem para receber o tratamento e nesse caso a recuperação tem praticamente 100% de chances de ter resultado positivo. Mas quando o tratamento é imposto ao adolescente, a recuperação é mais difícil, pois a maioria não conclui o processo.

Em casos graves e quando o usuário não tem noção do grau de dependência que está vivendo, o juiz explica que pode ser determinada a internação compulsória. Nesse ano, ele diz que em apenas um caso foi preciso aplicar a medida.

Mas ele avalia que de modo geral “é pouco provável que vá ter sucesso o tratamento” quando ele é imposto ao usuário.

Ele diz que o ideal é que a própria equipe de profissionais da Unei faça o trabalho de “convencimento” do adolescente, procurando conscientizar sobre o mal da droga.

No entanto, aponta outro fator que dificulta a recuperação: a idade. “Quando se trata de criança e adolescente falta a motivação própria porque muitas vezes eles não têm a consciência ainda sobre o mal da droga e vêm de uma família desajustada”, explica.

Nesse ponto, a presença da família é fundamental, mas também um dos maiores problemas, pois muitos conhecem a droga dentro de casa. Além disso, os adolescentes enfrentam realidades críticas no contexto familiar e muitas vezes o abandono.

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