Há 16 anos, promessa de 70 km de corredores de ônibus patina e divide opiniões
Em audiência, secretário municipal garantiu que a meta da atual administração é concluir as obras até 2028

Há mais de uma década, Campo Grande convive com a promessa de implantação de uma rede de 70 quilômetros de corredores exclusivos para ônibus. Entretanto, parte do plano segue no papel, com obras paralisadas, atrasos e críticas da população. O tema foi debatido na manhã desta sexta-feira (20), em audiência pública realizada na Câmara Municipal.
RESUMO
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Campo Grande enfrenta desafios na implantação de 70 km de corredores de ônibus, promessa com mais de uma década. Obras paralisadas, atrasos e críticas da população marcam o projeto, debatido em audiência pública na Câmara Municipal. A prefeitura garante a conclusão até 2028, apesar dos problemas herdados de gestões anteriores. O projeto, iniciado em 2009, visa priorizar o transporte coletivo e aumentar a velocidade dos ônibus. A Agetran aponta ações judiciais e burocracia como entraves, além da desistência de empresas licitadas devido à defasagem de valores. Recursos existem, mas processos e burocracia atrasam o andamento. A prefeitura busca incluir as obras no PAC para garantir recursos e agilizar a conclusão. Comerciantes criticam os impactos negativos nos negócios locais, enquanto a lentidão das obras e o aumento de acidentes geram preocupações. A Agetran atribui os sinistros à imprudência dos condutores.
Representando a prefeita Adriane Lopes (PP), o secretário de Governo e Relações Institucionais, Youssef Domingos, afirmou que os corredores de ônibus são um problema antigo, que se arrasta desde gestões anteriores. Ainda assim, garantiu que a meta da atual administração é concluir as obras até 2028.
Segundo a diretora-adjunta da Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito), Andréa Figueiredo, o projeto dos corredores foi apresentado em 2009, com a elaboração do primeiro Plano Diretor de Transporte e Mobilidade Urbana de Campo Grande. A proposta segue diretrizes da Lei Federal nº 12.587/2012, que obriga os municípios a adotar políticas voltadas à mobilidade urbana sustentável.
A primeira implementação do projeto foi em 18 de abril de 2022, no corredor da Rua Brilhante, seguido pelas avenidas Marechal Deodoro, Bandeirantes e Calógeras, além das ruas Rui Barbosa e Bahia.
De acordo com Andréa, o objetivo é priorizar o transporte coletivo e ampliar a velocidade dos ônibus. No entanto, ela lamenta a dificuldade de avançar com as obras, atribuindo o problema à “falta de empatia” com o coletivo. “O que impede a continuidade das obras são as ações judiciais que param o processo. Muitas vezes, quando ganhamos a causa, o empresário vencedor da licitação já não quer mais seguir, pois o valor está defasado".
Segundo a Agetran, há recursos disponíveis para concluir os corredores. “Existe verba suficiente. O problema são os processos judiciais e a burocracia que atrasa tudo. Quando a empresa abandona, temos que licitar tudo de novo”, afirmou Andréa. Além disso, Youssef havia citado que a prefeitura irá tentar incluir as obras no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo federal como forma de garantir recursos e acelerar a conclusão do projeto.
Na percepção de Andrea, há uma necessidade urgente de melhorar a mobilidade, considerando o aumento da frota na cidade. “Curitiba começou com os corredores em 1974, quando tinha 141 mil veículos. Hoje, Campo Grande tem quase 700 mil veículos registrados. Estamos entre as 15 capitais com mais carros no Brasil. Vamos esperar quanto tempo para fazer o que é essencial?”
A opinião também foi compartilhada pela arquiteta e estudiosa de mobilidade urbana, Luza Basso Driessen, que destacou que pensar em corredores de ônibus e investir em infraestrutura para o transporte coletivo “é o futuro” e já tem sido prática adotada em grandes centros urbanos, por também ser uma alternativa mais sustentável.
“É necessário, cada vez mais, investir no transporte coletivo. Ontem mesmo eu estava vendo uma notícia sobre Paris, que conseguiu reduzir significativamente as emissões de carbono — de CO2 — na cidade, com investimento em transporte coletivo, em bicicleta e, sim, no futuro, com uma restrição maior ao acesso ao veículo individual”, aponta Luza.
Entretanto, para Campo Grande, Luza ressaltou que ainda é necessário planejar melhor o uso do solo com a integração do transporte coletivo, pois hoje se observa um esvaziamento na região central. “O próprio plano diretor estabelece que é necessário adensar o centro, mas a gente tem visto uma perda de população. Então, também não é só uma questão da mobilidade — a gente não pode enxergar a mobilidade isolada, a gente tem que enxergar como um todo".
Discussão antiga - Apesar da justificativa técnica, os corredores não são unanimidade. Comerciantes e moradores das áreas impactadas criticam a forma como o projeto vem sendo implementado. Segundo o diretor-financeiro da ACICG (Associação Comercial e Industrial de Campo Grande), Paulo de Mattos Pinheiro, os corredores afetam diretamente o comércio local.
“Não somos contra o corredor, mas a forma como ele foi feito está prejudicando muito o comércio. Já vimos lojas fecharem na Brilhante e na Bandeirantes. Quando o corredor chegar à Rua 14 de Julho e à Rui Barbosa, o impacto no Centro será ainda maior. Está matando as empresas”, afirmou.

Outro ponto criticado é a lentidão das obras. A Avenida Gunter Hans é exemplo disso. O processo licitatório foi publicado em setembro de 2020 e a obra começou em março de 2021. No entanto, em 2023 a empresa responsável rescindiu o contrato, e o corredor ficou abandonado até janeiro deste ano.
O trecho previa intervenções entre as ruas Eduardo Contar e Túlio Alves Quito, e na Avenida Marechal Deodoro, entre as ruas do Sul e Panambi Vera, com pontos de ônibus centrais como os da Rui Barbosa e da Brilhante. A Agetran afirma que essa e outras obras serão retomadas. “A Gunter Hans está em conclusão. Faltam as estações na Bandeirantes e na Bahia. A Calógeras, Guri Marques e Costa e Silva também estão em fase de execução de projeto”, explicou Andréa.
Para o representante do movimento “Ligados no Transporte”, Eric Martins, a lentidão nas obras compromete a credibilidade do projeto diante da população. No entanto, ele defende a necessidade da construção dos corredores. “A obra começa e já causa transtorno ao comércio e aos usuários. E, como ela não termina, gera uma imagem negativa de algo que deveria ser bom. A gente defende os corredores, mas é preciso que as obras andem”, afirma.
Imprudência no trânsito - O aumento no número de sinistros de trânsito em regiões com corredores também foi tema de debate. O Campo Grande News já noticiou acidentes recorrentes em locais como a Rua Brilhante e a Avenida Bandeirantes.
Para o diretor-presidente da Agetran, Paulo Silva, os acidentes têm como principal causa a imprudência dos condutores. “Grande parte está relacionada à conversão à esquerda indevida. E 40% das autuações da Agetran são para motoristas inabilitados”, disse.
Ele também argumenta que os corredores são essenciais para a população que depende do transporte público. “Campo Grande tem cerca de 946 mil habitantes e 700 mil veículos. Isso significa quase um carro por pessoa. Quem anda de carro não quer corredor. Mas quem pega ônibus precisa que ele exista e funcione”, afirmou.
A reportagem questionou a Agetran sobre o total de quilômetros de corredores de ônibus já implantados e quantos estão efetivamente em funcionamento. Até o momento, a agência não respondeu. O espaço segue aberto para manifestação.
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