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Capital

Livre para quem pode pagar, celular dá a presos vida ativa nas redes sociais

Só nesta semana, reportagem do Campo Grande News identificou dois detentos postando fotos, ambos ligados ao PCC

Marta Ferreira | 27/02/2020 06:31
Max Aquino em foto publicada na segunda-feira (24) de dentro de cela da Máxima. (Foto: Reprodução Facebook)
Max Aquino em foto publicada na segunda-feira (24) de dentro de cela da Máxima. (Foto: Reprodução Facebook)

No meio do Carnaval de 2020, a folia não aconteceu só nas ruas em Campo Grande. Na segunda-feira (24), o detento Max Aquino Guerreiro, 28 anos, não apenas “curtia” o período dentro da cela no EPJFC (Estabelecimento Penal Jair Ferreira de Carvalho), a popular “Máxima”, como tornava isso público no Facebook, em demonstração clara do descontrole do acesso a celulares e consequentemente à internet no sistema prisional. A farra inclui até Wi-Fi, dentro do próprio ambiente prisional ou em casas de apoio vizinhas, conforme a apuração de reportagem.

Max atualizou a página na rede social na segunda-feira no fim da manhã. Postou foto segurando garrafa pet com líquido esbranquiçado, que parece ser “maria louca”, a bebida alcoólica típica dos presídios. No rosto, sorriso de deboche estampado.

Mais que isso. O detento ainda usou a rede social para citar o lema numérico da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). “É nois tmj curtindo o Carnaval sempre 15 3 3”, escreveu. O número é em alusão às letras P, C e C, e sua ordem na sequência do alfabeto.

Max Aquino durante julgamento por tentativa de homicídio, em outubro de 2019. (Foto: Arquivo)
Max Aquino durante julgamento por tentativa de homicídio, em outubro de 2019. (Foto: Arquivo)

Max, condenado a 4 anos de reclusão por tentativa de homicídio ocorrida em 2013, durante cena de ciúmes da ex-mulher com um primo, também responde a processos por receptação de produto furtado e por roubo a mão armada.

O perfil do criminoso no Facebook tem quase 600 amigos. Nas postagens, há outras fotos dentro do alojamento, como uma de dezembro de 2019. Há mensagens falando de Deus dividindo o espaço virtual com a alusão à facção criminosa.

Na “Máxima”, onde estão mais de 2,5 mil homens, um pavilhão inteiro é dedicado aos “irmãos” do PCC. A unidade prisional é dominada pelo grupo criminoso, cuja atuação extrapola o mundo dos detentos. A face violenta tem sido mostrada em julgamentos de desafetos, nos quais o final costuma ser de assassinato por meios cruéis.

Davi Miguelão, envolvido em execução no "tribunal do crime" do PCC, tem atualizações recentes na rede social, mesmo preso. (Foto: Reprodução Facebok)
Davi Miguelão, envolvido em execução no "tribunal do crime" do PCC, tem atualizações recentes na rede social, mesmo preso. (Foto: Reprodução Facebok)

Usa quem pode pagar - Com endereço no Parque do Lageado, bairro pobre na região sul de Campo Grande, Max Aquino Guerreiro não está “sozinho” no uso indiscriminado da internet dentro do cárcere por integrantes do PCC. A facção, conforme a reportagem identificou, cuida de dar estrutura, para garantir tanto a comunicação dos integrantes com o mundo externo quanto o uso para atividades criminosas, rotineiramente noticiadas. A suspeita sobre as formas de entrada dos equipamentos no lugar vão desde a conivência de servidores até esquemas prosaicos, como a “pesca” de aparelhos no pátio dos estabelecimentos, ou ainda os malabarismos feitos por parentes, como mulheres e mães durante as visitas.

Para o detento, há um custo, obviamente. Assim como do lado de fora, dentro do cárcere é preciso desembolsar recursos para conseguir o acesso ao celular. Existe um mercado interno para isso, até com a modalidade de aluguel de aparelhos pelos condenados mais “abastados” ou com maior poder na hierarquia específica da cadeia.

Outro caso identificado pela reportagem nesta semana foi o de Davi Miguelão, 22 anos, na cadeia por envolvimento em execução durante “tribunal do crime”, ocorrida em maio de 2018. A vítima, de 21 anos foi decapitada, na casa de Miguelão, no bairro Santa Emília, depois de afirmar ser integrante da facção CV (Comando Vermelho), de acordo com as investigações. Ele também responde a ação criminal por roubo de veículos.

Encarcerado no Presídio de Trânsito, ao lado da “Máxima", Davi Miguelão tem atualizações recentes no Facebook. No dia 17 de fevereiro, decidiu trocar de foto. Fez isso duas vezes com diferença de poucos minutos. Já havia mudado a imagem em 30 de janeiro. Nos registros, ao fundo, ventilador e roupas estendidas na cela.

Mais “popular” que o outro preso citado nessa reportagem, Davi Miguelão tem 1,3 mil amigos virtuais e, segundo apurado, não costumava demorar a responder as solicitações de amizade.

Equipe do Batalhão de Choque durante uma das operações pente-fino na Máxima. (Foto: Marcos Maluf)
Equipe do Batalhão de Choque durante uma das operações pente-fino na Máxima. (Foto: Marcos Maluf)

Punidos – A Agepen (Agência de Administração do Sistema Penitenciário) informou que ambos os internos tiveram o aparelho apreendido, foram colocados em cela de segurança e vão responder a espécie de processo interno. O reflexo disso, conforme a Agepen, é o aumento do tempo de prisão a ser cumprido. 

Sobre o combate às irregularidades, a Agepen informou que, “para inibir a entrada de materiais ilícitos, estão em funcionamento scanners corporais em unidades penais da Capital e do interior”.

De acordo com o órgão, “os portais detectores de metal e as esteiras para revistas em pertences também são ferramentas utilizadas diariamente”.

Ainda segundo informado, os servidores da Agepen constantemente realizam vistorias nas celas dos presídios para inibir a utilização de materiais ilícitos. Parte dessas ações tem apoio de outras forças de segurança, como é o caso do Batalhão de Choque da Polícia Militar, que só em 2019 esteve nove vezes na Máxima. As suspeitas de conivência de funcionários motivam sindicâncias e a punição mais severa prevista é a exoneração do cargo público.

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