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Capital

Promotor dedica 2 horas para rebater versão de tortura e mostrar “provas fartas”

Carrinho de compras recheado com 10 mil folhas de processo é "personagem" em plenário nesta manhã

Por Anahi Zurutuza e Dayene Paz | 18/09/2024 12:01
Promotor Moisés Casarotto, do Gaeco, lê relatório para jurados e é observado por Jamil Name Filho, que acompanha julgamento por videoconferência (Foto: Henrique Kawaminami)
Promotor Moisés Casarotto, do Gaeco, lê relatório para jurados e é observado por Jamil Name Filho, que acompanha julgamento por videoconferência (Foto: Henrique Kawaminami)

Primeiro a apresentar tese da acusação para os jurados, o promotor Moisés Casarotto, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado), dedicou as primeiras duas horas do júri popular para desmentir réus por assassinato e mostrar parte das provas “fartas e robustas”, como classificou, de que Marcel Hernandes Colombo, o “Playboy da Mansão”, foi executado a mando de Jamil Name Filho, em 2018.

Nesta quarta-feira (18), o terceiro dia do segundo julgamento da Operação Omertà, também novo “personagem” surgiu em plenário: um carrinho de compras recheado com as 10.648 páginas que compõem a ação penal contra Jamilzinho e outros três acusados de envolvimento na morte. Embora não tenha sido citado, o objeto contendo os cadernos e folhas empilhados, estrategicamente posicionado em frente à bancada dos acusadores, reforça o argumento da promotoria de que sobram provas contra os réus.

Promotor mostra quantidade de cadernos e folhas que compõem conjunto probatório contra réus (Foto: Henrique Kawaminami)
Promotor mostra quantidade de cadernos e folhas que compõem conjunto probatório contra réus (Foto: Henrique Kawaminami)

Casarotto iniciou a argumentação tranquilizando os jurados, que estão diante de organização criminosa violenta, de acordo com a acusação. “O voto de vocês é totalmente sigiloso. Jurados estão protegidos sob o manto do sigilo”.

O promotor disparou: “provas temos um monte”. Em seguida, voltou a dirigir-se aos “juízes” do povo para acalmá-los, dizendo que a missão do grupo hoje é decidir com tranquilidade se réus são culpados ou inocentes para que possam “botar a cabeça no travesseiro” com a sensação de dever cumprido e mostrar que a sociedade “não aceita pistolagem, decidindo quem vai viver ou morrer”.

Para impactar “de cara”, Casarotto exibiu em telão vídeo de câmera de segurança que mostra a execução de Marcel Colombo. O empresário de Campo Grande estava em cachaçaria com amigos, sentado em deck próximo à calçada da Avenida Fernando Corrêa da Costa, quando atirador desceu de moto e se aproximou. Seis tiros atingiram a vítima, um deles de raspão e outros cinco pelas costas, que morreu sentada no estabelecimento. Veja abaixo:

Jamil Name Filho é acusado de decretar a morte de Colombo, enquanto Marcelo Rios, ex-guarda civil metropolitano e “homem de confiança” de Jamilzinho, seria o arquiteto do plano de assassinato com o suporte do policial federal Everaldo Monteiro de Assis, que elaborou dossiê sobre o alvo, e do também ex-guarda Rafael Antunes, todos no banco dos réus desde a segunda-feira (16).

Relatórios e interceptações – Após a exibição do vídeo, o acusador passa a dissecar os relatórios produzidos pela Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubos a Bancos, Assaltos e Sequestros) e Gaeco (Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado), que formaram a força-tarefa que culminou na Operação Omertà. Primeiro, ele demonstra o que se angariou de provas sobre arsenal apreendido em maio de 2019 – o estopim das investigações que chegaram a várias execuções ocorridas na Capital.

Em seguida, o promotor diz que vai desvendar com os jurados “a maior mentira de Mato Grosso do Sul”, fazendo referência à frase atribuída a Jamilzinho em conversa de WhatsApp interceptada pela investigação e que se tornou notória. Ele lembra que no diálogo do dia 18 de abril de 2018 – meses antes da morte de Colombo –, Name admite ser chefe de grupo de extermínio, “a matilha é minha”, e revela à interlocutora que havia sido iniciada ali “a maior matança da história do MS” porque morreriam “de picolezeiro a governador”.

O promotor recorda que nesta terça-feira (18), Jamilzinho afirmou aos jurados que as frases ditas por ele à ex-mulher foram “uma infelicidade”, justificada porque à época ele tomava medicação controlada para síndrome do pânico e depressão, mas misturava os remédios com cerveja. Casarotto, contudo, relê todo a troca de mensagens, incluindo os pontos em que Name Filho manda a interlocutora apagar a conversa e diz que trocará o chip do celular dela para sentenciar: “Jamil estava lúcido, muito lúcido quando falou sobre o começo da ‘maior matança de MS’”.

Marcel Hernandes Colombo morto aos 31 anos com cinco tiros pelas costas (Foto: Reprodução das redes sociais)
Marcel Hernandes Colombo morto aos 31 anos com cinco tiros pelas costas (Foto: Reprodução das redes sociais)

A tortura – Para o promotor, “a segunda maior mentira do MS” foi levada ao plenário por Marcelo Rios e pela esposa, Eliane Benites Batalha dos Santos, ouvida na condição de informante – que, por ter laços afetivos com o acusado, não tem o compromisso legal com a verdade. Ambos alegam que foram torturados na Garras para contar o que sabiam sobre a milícia, em maio de 2019.

Casarotto, então, lê diálogos de Rios e Rafael Antunes em que o primeiro demonstra medo. Uma das frases do ex-guarda que chefiava a “matilha” de Jamilzinho é: “Esse ‘Véio’ vai me empurrar”, referindo ao pai de Name Filho. “Sabe o que é empurrar na linguagem de bandido? É matar”, explica o promotor para o júri.

Registros da quantidade de visitas feitas a Rios, que na ocasião estava preso após ter sido pego com o arsenal, também são mostrados aos jurados. Durante o tempo que passou em cela da Garras, o ex-guarda teve vários encontros com advogado enviado pelos patrões e também com defensor público. Para Casarotto, prova de que o réu estivesse sob tortura, algo teria sido notado.

O ápice desse momento da argumentação é a exibição de vídeo em que Eliane, no dia 7 de agosto de 2019, quando o marido já estava em presídio, diz que precisa de proteção. Ela havia acabado de visitar Rios, também conforme registros mostrados ao júri.

“Vim de livre e espontânea vontade aqui, a pedido do meu marido, que está no presídio federal. Ele quer fazer uma colaboração [premiada], só que o advogado dele não concorda e é o advogado da organização criminosa. A gente precisa que seja tudo sigiloso, porque a gente não sabe o que pode acontecer”, afirma a mulher em vídeo gravado pelo Gaeco.

Questionada por promotora à época, ela diz ainda que precisa entrar em programa de proteção a testemunhas e que o marido quer ser representado por defensor público. “A gente quer mudar de nome”.

“Diz que foi torturada em maio, vai visitar Rios e volta ao Gaeco para pedir socorro”, constata Casarotto, apontando contradição.

Acusação exibe vídeo em que Eliane Batalha diz temer organização criminosa (Foto: Henrique Kawaminami)
Acusação exibe vídeo em que Eliane Batalha diz temer organização criminosa (Foto: Henrique Kawaminami)

O promotor também detalha pagamentos feitos à Eliane entre maio e agosto. “Mensalinho para calar a boca” porque “o silêncio” do casal “é mais barato”, dispara.

O acusador registra então que ali foi “provada a mentira” de Rios e Eliane, além de “lavada a alma dos policiais honestos que fizeram parte deste processo”.

Conclusão - Casarotto então parte para um terceiro momento: mostrar que Juanil Miranda, pistoleiro contratado por Marcelo Rios para executar Marcel Colombo, hoje considerado foragido, e o próprio ex-guarda monitoravam a vítima à distância. A maior prova, de acordo com o promotor, é que Rios passou a madrugada do dia 18 de outubro de 2018 em busca de notícias sobre o assassinato do “Playboy”, embora “ninguém” soubesse do ocorrido. Assista:


Naquela quinta-feira, o Campo Grande News noticiou o assassinato às 6h30. Veja:

Print da matéria publicada pelo Campo Grande News no dia 18 de outubro de 2018 (Foto: Reprodução)
Print da matéria publicada pelo Campo Grande News no dia 18 de outubro de 2018 (Foto: Reprodução)

O promotor foi interrompido uma vez nesta manhã pelo advogado de Rios, Márcio Widal. Ele exigia que a acusação informasse em qual das 10 mil páginas havia registro de que os dados telemáticos dos réus haviam sido enviados pelo Google à força-tarefa. Houve pequena discussão, o advogado foi acusado de suscitar questão de ordem para atrapalhar a argumentação, mas Casarotto logo voltou ao microfone e concluiu  a linha de raciocínio.

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