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Capital

Vira-latas são abandonadas e morador de rua adota animais que “ninguém quis”

Nas ruas há um ano, Roberto diz que duas cachorrinhas o escolheram; fêmeas o acompanham há três semanas

Por Natália Olliver | 16/04/2024 15:29
Roberto, morador de rua, debaixo de varanda com duas cachorras caramelo e o fiel companheiro de cor preta, na Avenida Bom Pastor (Foto: Natália Olliver)
Roberto, morador de rua, debaixo de varanda com duas cachorras caramelo e o fiel companheiro de cor preta, na Avenida Bom Pastor (Foto: Natália Olliver)

Duas vira-latas caramelo, com "um quê" de golden retriever, chamaram atenção de moradores e comerciantes da Avenida Bom Pastor. Os animais estavam andando sozinhas pelo bairro há, pelo menos, três semanas, quando passaram a fazer companhia ao morador de rua, que se identifica como Roberto, de 40 anos.

O homem, que prefere dizer somente o primeiro nome, diz que encontrou as duas andando pelo bairro e que elas seguem um outro cachorro que ele já cuidava. Abrigados debaixo da varanda de uma pizzaria na avenida, Roberto conta que é de Ivinhema, a 280 quilômetros de Campo Grande, e que ganhou o cachorro macho de um fazendeiro.

“É um ser vivo. Dizem que a gente não escolhe os bichos, mas eles que escolhem a gente. As fêmeas estão prenhas, por isso estão seguindo ele [o macho]”, afirma.

Roberto explica que se vira pedindo comida e junta a pouca esmola que ganha para comprar ração para o trio.

Há um ano, ele vive nas ruas da Capital. Antes de chegar à cidade, trabalhava de serviços gerais em fazendas de eucalipto pelo Estado. Quando questionado sobre o motivo que o levou as ruas, Roberto diz não saber e garante que não tem vícios.

Cachorros estavam abrigados debaixo de pizzaria em avenida gastronômica da Capital (Foto: Natália Olliver)
Cachorros estavam abrigados debaixo de pizzaria em avenida gastronômica da Capital (Foto: Natália Olliver)

De acordo com o funcionário da lanchonete próxima, Gabriel Cabral, os animais estavam nutridos e saudáveis quando apareceram no local. Ele não soube dizer se eles foram abandonados ou se perderam dos donos. “Estão há umas três semanas aqui mesmo. Eles estavam bem bonitos antes. O moradores de rua adotaram, são dois moradores que alimentam eles”.

Ricardo Maia mora há 8 anos no bairro e comenta que viu os cachorros junto com Roberto há menos de uma semana. “Final de semana eu vi. Ele estava com os três cachorros, não sei quanto tempo ele está andando por aqui. Eu não vejo tantos animais aqui porque é movimentado, mas isso me chamou atenção, porque o rapaz estava com três cães”.

Fêmeas flagradas na Avenida Eduardo Elias Zahran (Foto: Natália Olliver)
Fêmeas flagradas na Avenida Eduardo Elias Zahran (Foto: Natália Olliver)

Superlotação - Com a superlotação dos abrigos, protetores de animais que viram as duas cadelas antes de elas serem “acolhidas” por Roberto passaram a divulgar em grupos fotos das duas para que fossem resgatadas. O registro dos animais chegou ao parceiro da causa animal Ivan Pereira Lima.

Ele conta que outros protetores pediram para que ele conseguisse um lar para as cachorras. “Eu sou apaixonado por cachorros. Eu fico doente de ver os bichinhos soltos, comendo lixo. Nós precisamos de hospital em Campo Grande para eles. Moro no final do Vilas Boas, tem terreno vazio e tem uns 20 gatos. Eu sou parceiro de ONGs [Organizações Não Governamentais], ajudo com ração, dinheiro”.

Ele ressalta que os abrigos e lares temporários para animais estão sempre lotados e que o custo em manter os locais é alto. “Eles estão superlotados. Abandonar animais é crime, as pessoas precisam se conscientizar”, apela.

Apesar de amar os animais, Ivan comenta que não consegue abrigar mais as duas cachorras, por já ter outros cães. Ele não conseguiria manter mais animais. “A gente tem que ter responsabilidade”.

Macho está com Roberto há quase um ano e fêmeas há três semanas (Foto: Natália Olliver)
Macho está com Roberto há quase um ano e fêmeas há três semanas (Foto: Natália Olliver)

Problema crônico - Em Campo Grande, os protetores de animais vivem o desespero da superlotação e incapacidade de receber novos animais há anos.

A protetora Tereza Rodrigues Bandeira sofre por não conseguir resgatar mais animais. Ela já cuida de 110 no abrigo que mantém. “Pra mim é muito difícil ver um animal e não conseguir recolher. Mas enquanto não tiver um espaço para colocar eles, de maneira que eles fiquem bem, é complicado. Tenho dois filhos que fazem faculdade e não aceitam muito a ideia do projeto. Tô passando por momentos bem difíceis em relação aos animais”.

O cenário não é exclusivo, diversos protetores relatam o mesmo problema.

Justiça - Devido à situação, em 2023 a Justiça de Mato Grosso do Sul determinou que a Prefeitura de Campo Grande pagasse pelo serviços prestados por ONGs (Organizações Não Governamentais) e protetores independentes que resgatem cães, gatos e outros bichos das ruas da Capital voluntariamente.

Desembargadores da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça entenderam que a administração municipal é omissa em relação aos animais vítimas de abandono e maus-tratos na cidade.

A Comissão de Defesa dos Direitos Animais da OAB/MS (Ordem dos Advogados de Mato Grosso do Sul) estima que na Capital milhares de animais vivem em abrigos independentes. Levantamento, feito entre abril e agosto do ano de 2022, encontrou 2,8 mil bichos nessa situação.

Segundo a protetora de animais Laura Cristina, da ONG Fiel Amigo, são cerca de 5 mil animais abandonados em Campo Grande. "É uma quantidade absurda. A Ordem dos Advogados do Brasil fez uma pesquisa e são mais de 350 protetores que calculam muito mais de 5 mil animais precisando de socorro", lamentou.

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