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Empregos

Lista suja do trabalho escravo tem “patrões” do gado e exportador para Europa

A condição análoga à escravidão acontece diante de precária situação de trabalho, moradia e saúde

Por Aline dos Santos | 18/06/2025 15:42
Lista suja do trabalho escravo tem “patrões” do gado e exportador para Europa
Reunião do MPT com trabalhadores resgatados em situação análoga a escravidão, em Aparecida do Taboado (Foto: Divulgação/MPT)

A “lista suja” do trabalho escravo em Mato Grosso do Sul, divulgada a cada seis meses pelo MTE (Ministério do Trabalho e Emprego), tem empregadores representativos das várias atividades econômicas de Mato Grosso do Sul. Mas o destaque são os “patrões” do gado, além de exportador de fruta para o mercado europeu.

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Em Mato Grosso do Sul, doze fazendas foram incluídas na "lista suja" do trabalho escravo, divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. No total, 99 trabalhadores foram resgatados em operações que flagraram condições degradantes, como alojamentos precários, falta de equipamentos de segurança e até mesmo trabalho infantil. Entre os empregadores listados, destacam-se pecuaristas e um exportador de frutas para a Europa. As fazendas incluídas no cadastro enfrentam restrições de crédito em bancos estatais. Um dos casos mais emblemáticos envolve a Fazenda Pedra Negra, exportadora de limões, onde 20 trabalhadores, incluindo um adolescente, foram resgatados. Outro caso, na Fazenda Marreta, em Dourados, sete pessoas, dentre elas uma criança de 11 anos, foram encontradas em situação análoga à escravidão durante a colheita de milho. A lista também inclui a Fazenda Invernada do Piri, onde um trabalhador vivia em uma choupana e consumia água barrenta de um açude.

O "cadastro de empregadores que submeteram trabalhadores a condições análogas à escravidão" mostra patrões como Valdinei Aparecido Roque, da Fazenda Pedra Negra, em Aparecida do Taboado. Foram 20 trabalhadores resgatados da propriedade rural exportadora de limões, inclusive um adolescente de 16 anos.

A empresa onde Valdinei é sócio administrador tem capital social de R$ 100 mil e fica localizada em Itajobi, no interior de São Paulo e conhecida como “Capital Mundial do Limão”, com destaque para o taiti. A exportadora envia o fruto para Rússia e Europa.

A situação análoga à escravidão foi verificada por fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego, em parceria com o MPT-MS (Ministério Público do Trabalho de Mato Grosso do Sul). O flagrante aconteceu em 15 de fevereiro de 2024.

O cenário era de alojamentos inadequados, falta de EPIs (Equipamentos de Segurança Individual) e recorrentes acidentes de trabalho. A empresa exportadora de frutas se comprometeu a cumprir as medidas estabelecidas nos acordos, sob pena de multa diária e reversão dos valores para campanhas educativas ou em prol da coletividade.

Em número total de trabalhadores resgatados, a Fazenda São Joaquim, no município de Angélica, lidera: foram 31 pessoas encontradas em situação similar à escravidão. Neste caso, o empregador é Kelis Bezerra da Silva Ltda. Aberta em 19 de janeiro de 2022, a empresa fica em Taquarussu e tem capital social de R$ 80 mil.

O cadastro do Ministério do Trabalho e Emprego também traz o nome do fazendeiro Virgilio Mettifogo. O flagrante foi em dezembro de 2023, quando o empregador era réu no episódio chamado de “Massacre de Caarapó”, ataque que causou morte de um indígena e deixou outros seis feridos em 2016.

No ano passado, a Justiça Federal rejeitou denúncia do MPF (Ministério Público Federal) para que Virgilio e outros 13 produtores rurais fossem a júri popular. No processo, o fazendeiro foi representado por banca com seis advogados. O caso está em fase de recurso no TRF3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região). O processo segue pronto para julgamento desde 24 de março.

Lista suja do trabalho escravo tem “patrões” do gado e exportador para Europa
Galpão pequeno e sem janelas era o alojamento improvisado na Fazenda Marreta. (Foto: Divulgação/MPT)

O trabalho análogo à escravidão foi registrado na Fazenda Marreta, em Dourados com resgate de sete pessoas. No grupo, estava uma criança de apenas 11 anos e um adolescente de 17 anos. Todos faziam a colheita manual de milho, inclusive, sem equipamento de proteção individual.

Durante a fiscalização, foi encontrado um galpão pequeno que servia de alojamento dos indígenas. O local sem janelas era utilizado para o grupo dormir e cozinhar. Não havia cama, nem colchão. As vítimas improvisavam local para deitar com tábuas, papelão e palha. Eles não tinham banheiro e por isso, precisavam fazer suas necessidades fisiológicas no mato.

O fazendeiro reside em bairro valorizado de Dourados e descende de um patriarca que, conforme processo de inventário, começou a comprar terras em 1976, com propriedades no interior de São Paulo e 12 áreas rurais no município de MS.

Na “lista suja” em Mato Grosso do Sul, também figura a LLB Prestadora de Serviços Ltda, empresa que atua com “atividades de apoio à pecuária”, fica localizada em Guia Lopes da Laguna e foi aberta em 2022. O capital social é de R$ 50 mil, sendo o sócio administrador Lúcio Ferreira Baldonado.

O flagrante desse empregador foi na Fazenda Campo Alegre, em Corumbá, região do Pantanal. Oito trabalhadores foram resgatados.

Lista suja do trabalho escravo tem “patrões” do gado e exportador para Europa

Choupana e água barrenta - Destinada a criação de boi, a Fazenda Invernada do Piri, em Porto Murtinho, teve resgate de um trabalhador de 79 anos em 2024. O empregador é Nilson Pereira Bento.

O caseiro não dispunha de água potável. Ele bebia água trazida em garrafas pet, que estavam enroladas com pedaços de pano para manter a temperatura da água mais fresca.

 O líquido não recebia nenhum tipo de tratamento de purificação ou filtragem para seu consumo, com coloração turva. Quando a água trazida pelo empregador acabava o trabalhador bebia água barrenta de um açude. O alojamento era uma choupana.

Lista suja do trabalho escravo tem “patrões” do gado e exportador para Europa
Choupana que abrigava trabalhador em Porto Murtinho. (Foto: Reprodução)

Condições degradantes de trabalho podem ser compreendidas como todas as formas de desrespeito à dignidade humana pelo descumprimento aos direitos fundamentais do trabalhador, notadamente em matéria de segurança e saúde. O trabalhador não é visto como pessoa, mas como uma coisa.

A condição análoga à escravidão acontece diante de precária situação de trabalho, vida, moradia, saúde e segurança.

O trabalhador resgatado não soube informar a data de nascimento, só sabia que o ano era 1945.  Ele ainda relatou que frequentou escola somente por duas semanas em toda a vida, portanto, não sabia ler ou escrever.

Mato Grosso do Sul tem 12 fazendas no cadastro divulgado pelo Ministério do Trabalho, sendo metade relacionada à pecuária. O total de resgatados é de 99 trabalhadores.  O empregador que entra no cadastro sofre restrição a crédito em bancos estatais.

A reportagem tentou contato com os citados por meio de advogados e telefones de pessoa jurídica informados à Receita Federal. Mas, não obteve retorno até a publicação da matéria.

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Trabalhador resgatado em Porto Murtinho não sabia nem a data em que nasceu. (Foto: Reprodução)

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