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Cidades

Especialista defende "fofoca do bem" pelo combate ao mosquito da dengue

Trocar informações com nossos vizinhos pode ser a chave para acabar de vez com o Aedes aegypti.

Anahi Gurgel | 28/10/2017 08:13
Larvas do mosquito Aedes aegypti encontradas em residência no início deste ano. (Foto: Marcos Ermínio)
Larvas do mosquito Aedes aegypti encontradas em residência no início deste ano. (Foto: Marcos Ermínio)

Em uma era de extremo individualismo, frenética rotina de trabalho e de um certo isolamento em relação à vizinhança, a criação um grupo de WhatsApp pode ser a arma perfeita para combater o mosquito transmissor da dengue no seu bairro.

Usar a tecnologia como ferramenta de apoio à saúde pública. É o que impulsionam à reflexão, as constatações do entomologista Antonio Pancracio de Souza, 47, professor da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), que se dedica aos estudos do Aedes aegypti há quase 10 anos.

Ele defende que quebrar o comportamento cada vez mais egocêntrico da sociedade é um desafio enorme, mas pode ser a chave para acabar com o Aedes aegypti.

“Vivemos um momento de egoísmo escancarado. O espírito de coletividade está muito enfraquecido, seja pela correria do dia a dia, seja pelo medo da criminalidade", analisa o pesquisador.

Antonio Pancracio, pesquisador ligado à UFMS, durante entrevista com o Campo Grande News. (Foto: André Bittar)
Antonio Pancracio, pesquisador ligado à UFMS, durante entrevista com o Campo Grande News. (Foto: André Bittar)

Se fechar na própria residência, evitar que as crianças saiam na rua para brincar é, em 2017, menos frequente; reflexos do mundo moderno.

"Alguns moradores se comunicam por meio de aplicativo, como WhatsApp, para tratar assuntos de condomínio, por exemplo. Por que não usar a tecnologia para estreitar laços? Informar se alguém ficou doente, se está com sintomas da dengue, se achou mosquito em casa?”, indaga.

É uma espécie de "fofoca do bem" mesmo, que pode fazer toda a diferença nessa batalha contra uma doença ameaçadora. De acordo com Pancracio, quando uma pessoa é contaminada, passa pelo chamado período de viremia.

“Dura cerca de 1 semana a partir dos primeiros sintomas. A pessoa doente vira um reservatório gigante do vírus. O mosquito que picá-la tem enorme capacidade de transmitir a doença”, pontua.

O inseto até consegue voar por cerca de 1 quilômetro, em média, entretanto, se encontra ambiente propício à sua sobrevivência, ele permanece ali, naquela lata de tinta abandonada. É um insetinho preguiçoso: 98% dos transmissores vivem dentro de nossas casas. Sim, bem ao estilo "dormindo com o inimigo".

"Não adianta eu cuidar do meu lixo se na casa ao lado não cuidam do deles. O mosquito pode atacar o vizinho e eu também. É esse o senso de responsabilidade que deve ser despertado em todos nós. Também é fundamental respeitar o trabalho do agente de saúde. Eles são muito desvalorizados, as pessoas hostilizam a presença deles", observa.

Agente de saúde durante fiscalização em residência de Campo Grande. "Precisam ser mais valorizados". (Foto: Fernando Antunes)
Agente de saúde durante fiscalização em residência de Campo Grande. "Precisam ser mais valorizados". (Foto: Fernando Antunes)

De onde esse "bicho" veio? O mosquito Aedes aegyti tem origem africana. Por lá, inclusive, é conhecido como “Mal do Egito”. O inseto sempre acompanhou o homem em suas viagens exploratórias mundo afora e, foi justamente pegando “carona” nos navios negreiros, que chegou até o Brasil.

Os primeiros relatos da dengue em terras tupiniquins datam de 1.845. Durante anos, foi tão intensa a mobilização do poder público junto à população, que a doença foi completamente erradicada em 1.955.

O mal voltou 30 anos depois, com força total e provocou a primeira grande epidemia do País em 1986. Desde então, o minúsculo mosquito tem vencido todas as batalhas, até esse nosso 2017.

Pela análise do especialista, os principais fatores que dificultam o combate ao mosquito são o aumento populacional, expansão demográfica desenfreada e crescimento de criadouros artificiais.

Embalagens vazias jogadas em terreno da Capital. Quantidade e sortimento estão cada vez maior, favorecendo a proliferação do mosquito. (Marcos Ermínio)
Embalagens vazias jogadas em terreno da Capital. Quantidade e sortimento estão cada vez maior, favorecendo a proliferação do mosquito. (Marcos Ermínio)

"Naquela época, éramos 50 milhões de habitantes. Hoje, somo 200 milhões. A incidência da doença aumentou 30 vezes nesse período. Somado a esse 'boom', temos a oferta cada vez maior e sortida de embalagens", destaca.

São latas, garrafas, caixas, plásticos e muitos outros produtos que não existiam há três décadas e que, hoje, são um verdadeiro “aconchego” para o inseto.

“Se não tomarmos o cuidado de eliminar os criadouros, se não assumirmos o compromisso com a nossa saúde e a saúde da nossa comunidade, vamos continuar perdendo a luta para o mosquito”, enfatiza, complementando que o inseto também transmite os vírus da zika e chikungunya.

Dados - Estatísticas da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) indicam que, de janeiro a outubro de 2017, foram registradas 1.932 notificações de dengue, 111 de zika e 66 de chikungunya. Houve queda expressiva em relação ao ano anterior, quando foram registradas absurdas 28.469 notificações dengue no ano todo, 4.594 de zika e 265 de chikungunya. Inclusive, Antonio chama atenção para um fato: as pessoas dão pouca importância à essas patologias, tendem a relaxar devido à queda de índices e sintomas mais brandos. Nos resta, portanto, extrair os ensinamentos: vigilância, sempre!

Antonio Pancracio desenvolveu um estudo com mitos e verdades sobre o mosquito Aedes aegypti. Vale a pena conferir. 

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