Cartório do interior emitiu registro de nascimento com data de 31 de abril
Essa é uma das irregularidades praticadas durante gestão de tabeliã condenada pela Justiça
Os anos de irregularidades deixaram cicratizes no cartório de Coronel Sapucaia, município na fonteira com o Paraguai e a 400 quilômetros da Capital. No “atacadão”, tal como adjetiva o atual titular, Ricardo Correia de Melo, tudo era possível, até mesmo emissão de registro de nascimento com data de 31 de abril – esse mês tem 30 dias. As marcas, quase indeléveis, das práticas ilegais, causaram resistência de quem estava acostumado a conseguir documentos fáceis, dando-se “jeitinho”.
“Foi muito difícil, principalmente no começo. As pessoas estavam acostumadas com o jetinho pra tudo, com o 'atacadão do pagou levou'. O impacto foi grande, houve muita resistência”, contou o tabelião, que assumiu concurso como titular do cartório em novembro de 2015, no lugar de Mafalda Donaria Viana Bonete, recentemente condenada por lavrar 851 registros de nascimento de maneira irregular.
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Ricardo nota que o rigor para aceitação de documentos emitidos pelo cartório é maior, devido à má fama, resultante de anos de irregularidades. “A fama é de que aqui 'pode tudo'”, disse, acrescentando que, certa vez, recebeu ofício de um juiz solicitando autenticidade de uma certidão. No entanto, conforme o tabelião, essa imagem está, aos poucos, sendo descontruída.
O problema é decorrente das práticas ilegais ocorridas no período em que Mafalda permaneceu interinamente como tabeliã – não sendo concursada, ela tinha cargo interino, mas ficou na função por mais de 20 anos.
Entre os exemplos mencionados por Ricardo está o da emissão de certidão de nascimento com data de 31 de abril. Ele não se recorda, com exatidão, o ano, mas acredita ter sido em 2004 ou 2005. Também foram lavrados registros com erro na informação do sexo, entre outros problemas.
Ainda hoje, embora com menos frequência, pessoas buscam o cartório, ou por desconhecimento ou por má-fé, para emissão de documentos sem comprovações necessárias ou outros critérios exigidos.
Recentemente, conforme exemplifica Ricardo, uma mulher procurou o cartório para registrar como brasileiria uma filha de seis anos nascida no Paraguai. “Eu explico como deve ser feito, indico outras soluções dentro da legalidade”, afirmou o tabelião.
Sentença – As irregularidades, que comprometeram a imagem do cartório, resultaram em condenção da antiga tabeliã Mafalda Donaria Viana Bonete. Por decisão unânime do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), ela perdeu a função pública de oficial de registro e não pode exercer direitos por quatro anos.
As demais penas aplicadas contra Mafalda foram: multa civil, correspondente a 15 vezes o valor da renda mensal da cartorária; e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais pelo prazo de três anos.