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Interior

Denúncia revela falso testemunho para incriminar ex-secretário preso

Documentos obtidos pelo Campo Grande News mostram empresário douradense combinando depoimento contra Renato Vidigal

Helio de Freitas, de Dourados | 10/12/2019 13:33
O ex-diretor da Funsaud Américo Salgado Junior (à direita) e Marcos Gabiatti, alvos de denúncia ao MP (Foto: Reprodução/Facebook)
O ex-diretor da Funsaud Américo Salgado Junior (à direita) e Marcos Gabiatti, alvos de denúncia ao MP (Foto: Reprodução/Facebook)

O Ministério Público de Mato Grosso do Sul investiga denúncia de falsos testemunhos para prejudicar o ex-secretário de Saúde de Dourados, Renato Oliveira Garcez Vidigal, recolhido desde o início do mês passado na PED (Penitenciária Estadual de Dourados). O médico foi preso no dia 6 de novembro deste ano na segunda fase da Operação Purificação, da Polícia Federal, que investiga esquema de desvio de dinheiro na prefeitura da segunda maior cidade de Mato Grosso do Sul.

Documentos obtidos hoje em primeira mão pelo Campo Grande News revelam que a trama para prejudicar Vidigal envolve o ex-diretor da Funsaud (Fundação de Serviços de Saúde de Dourados) Américo Monteiro Salgado Junior e o empresário douradense Marcos Gabbiatti. Os dois foram ouvidos como testemunhas na investigação que levou à prisão de Renato Vidigal.

A Funsaud é uma autarquia da administração municipal criada em 2015 para gerenciar a UPA (Unidade de Pronto Atendimento) e o Hospital da Vida.

Renato Vidigal foi secretário de Saúde de janeiro de 2017 a janeiro deste ano. Ele está preso acusado de desvio de pelo menos R$ 530 mil de verba da saúde através da empresa Marmiquente, que fornecia alimentação para a Funsaud. Também está preso o ex-diretor financeiro da secretaria, Raphael Henrique Torraca Augusto, o “Pardal”, apontado como sócio de Vidigal na empresa de fachada.

Dinheiro para campanha – Conforme a denúncia feita à ouvidoria do MP estadual, Marcos Gabiatti e Américo Salgado Junior teriam planejado fazer falsas revelações para acobertar supostos desvios feitos pelo ex-diretor na Fundação de Saúde. A Procuradoria-Geral de Justiça de Mato Grosso do Sul determinou a instauração “com urgência” de inquérito para investigar a denúncia feita hoje. Américo presidiu a Funsaud de agosto de 2017 a fevereiro de 2018.

Segundo a denúncia, Américo teria contratado empresa de software, sem conhecimento do Conselho Curador (diferente do que ele disse ao MP) e sem conhecimento da prefeitura. A empresa de software teria contratado um advogado da cidade, identificado na denúncia apenas como Paulo.

“Paulo recebia R$ 30 mil e repassava R$ 20 mil para Américo e Marcos”, afirma o autor da denúncia, mantido em sigilo. Ainda segundo a revelação feita ao MP, Marcos e Américo pretendem usar o dinheiro para financiar campanha para vereador na eleição do ano que vem em Dourados.

Print da conversa em que empresário combina depoimentos (Foto: Reprodução)
Print da conversa em que empresário combina depoimentos (Foto: Reprodução)

“Alinhar depoimentos” – A reportagem teve acesso ao print de conversa através do aplicativo WhatsApp entre Marcos Gabbiatti e outra pessoa não identificada, na qual o empresário fala da trama para prejudicar Renato Vidigal.

“Já combinei com o Américo e o Acassio. Vamos alinhar os depoimentos para f... o Vidigal”, diz Gabbiatti na conversa. Ele continua: “O problema é que o Acassio falou mais que devia. Falou do posto do Neno. Ele tava com raiva na época! Vamos focar no Vidigal, f... ele”.

A pessoa com quem o empresário conversa pede para ser deixada fora da trama: “Cara, me deixa fora disso, por favor”. Mas o Gabbiati insiste: “Manão, você tá junto até o fim. Avante! Vou novamente na Federal, vou falar que me ameaçaram de morte, choro, faço o que precisar”.

Ainda não há informações sobre os outros nomes citados na conversa, mas todos serão investigados pelo MP. O Campo Grande News apurou que denúncia semelhante foi feita ao MPF (Ministério Público Federal).

Purificação – A Polícia Federal também já tem conhecimento e está investigando o caso. A reportagem apurou que as investigações sobre o esquema de desvio de dinheiro da saúde continuam e que Américo Salgado Filho deve ser indiciado nos próximos dias por receber dinheiro para fazer vistas aos desvios através de licitações fraudulentas.

No depoimento à Polícia Federal e o MPF após assinar acordo de delação premiada, Ronaldo Gonzales Menezes, que seria “testa de ferro” de Vidigal e Pardal na empresa Marmiquente, disse que Américo Salgado Junior, quando presidia a Funsaud, recebeu duas propinas de R$ 2 mil cada uma para garantir o pagamento em dia à empresa de marmita.

Intimado pela PF para esclarecer o suposto recebimento de propina, Américo Salgado Junior disse que Renato Vidigal tinha influência sobre a Funsaud – que em tese deveria ser autônoma – e que a Marmiquente era a única empresa paga integralmente em dia a pedido do então secretário de Saúde. Negou, no entanto, ter recebido propina para fazer os pagamentos em dia.

Ameaça e choro – A denúncia contra Vidigal, Pardal e outras três pessoas implicadas na Operação Purificação também cita depoimento do empresário Marcos Gabbiatti, outro envolvido na denúncia que chegou nesta terça-feira ao MP.

Servidor nomeado na Secretaria de Saúde por 11 meses, segundo ele, por indicação de um dos filhos da prefeita Délia Razuk (sem partido), Marcos é dono de um dos postos de combustíveis da família Gabbiatti em Dourados.

No depoimento à PF, ele disse ter conhecimento do esquema de licitações montado por Renato Vidigal, que teria inclusive chamado um cunhado dele para participar das fraudes.

Marcos também afirmou que certo dia foi chamado à sala de Renato Vidigal, onde estariam Raphael Pardal e um segurança, e questionado pelo então secretário sobre “que história é essa de falar que estou com marmitaria?”.

Gabbiatti disse à PF que Vidigal e Pardal teriam sido “extremamente agressivos” com ele, por isso decidiu pedir exoneração. Disse que após sair da sala, entrou no carro e chorou “pela situação constrangedora”.

Apesar de não ter pedido exoneração, Gabbiatti disse no depoimento ter ouvido de outra pessoa que Renato Vidigal estaria fazendo ameaças de morte contra ele e contra Américo Salgado Junior. A declaração coincide com a denúncia feita hoje ao MP.

Américo Salgado Junior e Marcos Gabbiatti são amigos. No dia 7 de outubro deste ano, os dois foram juntos a gabinetes de deputados e senadores de Mato Grosso do Sul em Brasília. “Conversas muito produtivas avante 2020 tmj”, escreveu Gabbiatti em sua página no Facebook.

O Campo Grande News não conseguiu falar com os dois citados na denúncia. Assim que houver resposta, a versão deles será amplamente divulgada.

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