ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, SEXTA  26    CAMPO GRANDE 31º

Em Pauta

O calor é o responsável pela nossa preguiça

Fraqueza moral e sensualidade?

Mário Sérgio Lorenzetto | 03/01/2020 06:22
O calor é o responsável pela nossa preguiça

Você já ouviu alguém dizer que o calor impede a civilização. Também ouviu que o clima tropical é responsável pelo relaxamento do organismo, preguiça, fraqueza moral e sensualidade exagerada. É que o Brasil estaria, em função disso, destinado ao eterno atraso e à incivilidade. Esse ponto de vista, ainda hoje defendido, alcançou grande destaque à partir de 1808, quando os fujões da família real portuguesa, alojaram-se no Brasil.

O calor é o responsável pela nossa preguiça

Os fugitivos em desacordo com a ciência europeia.

Não era pouco. Pela primeira vez a estrutura completa de um Estado europeu instalava-se em uma região tropical. Um desafio e tanto, movido pelo medo dos franceses. Estava em completo desacordo com as teorias cientificas em voga na Europa. Todas anunciavam a total impossibilidade de uma civilização florescer fora da zona temperada europeia.

O calor é o responsável pela nossa preguiça

Montesquieu, o precursor do ideário anti-tropical.

O exemplo mais clássico dessa visão está no livro de Montesquieu. "O Espírito das Leis". Publicado em 1748 defendia paralelamente às "leis políticas e civis", a existência de "leis naturais" diretamente relacionadas com o meio físico. O clima, desse modo, determinaria as características de um país. Para Montesquieu, a região temperada - parte da Europa - com sua "vocação" para a monarquia constitucional, seria a justa medida entre os climas glacial e tórrido. Nesse lugares, só haveria depravações humanas e políticas.

O calor é o responsável pela nossa preguiça

Um abade e o conde de Buffon corroboram o pensamento de Montesquieu.

As análises feitas pelo abade Cornelius de Pauw e pelo respeitado naturalista conde de Buffon acrescentavam, no mesmo caminho depreciativo de Montesquieu, interpretações que conduziam a uma avaliação muito negativa do Brasil. Uma suposta ação degenerativa nos trópicos afetaria animais, plantas e, principalmente, o homem. A região tropical criaria graves obstáculos à vida civilizada.

O calor é o responsável pela nossa preguiça

Os que defendiam os trópicos.

Mas nós não estávamos isolados nessa trincheira. Existiram pensadores a nós favoráveis. O bispo Azeredo Coutinho, o frei Manoel de Arruda Câmara e José Bonifácio tentaram nos defender. Criaram um longo e mal sucedido debate em jornais, panfletos, artigos e folhas volantes. Não foram muito longe, nossos defenestradores eram figuras gigantes no pensamento europeu.

O calor é o responsável pela nossa preguiça

A carta do cumpradre de Belém nos deu força.

No jornal português "Astro da Lusitânia" apareceu um interessante artigo intitulado "Carta do compadre de Belém". Nele, após um inusitado rasgo de elogios à nossa natureza, em especial ao nosso clima, avaliado como extremamente salutar, o autor (desconhecido) faz uma descrição geográfica comparativa de Portugal e do Brasil. Refere-se à nossa dimensão continental como fator de poder (o que se tornou indiscutível logo a seguir), à fertilidade como elemento vital para a prosperidade e ainda defendia um ambicioso projeto que nunca foi levado a cabo.

O calor é o responsável pela nossa preguiça

Quando o Rio não foi capital.

Propunha o autor dessa carta, que fosse criada uma poderosa federação monárquica, que aglutinaria todas as possessões portuguesas e teria como capital... o Rio de Janeiro. Essa carta provocou uma verdadeira guerra de ideias. Mas as fronteiras desse embate nunca saíram do Brasil e Portugal. Os demais países europeus continuaram seguindo o pensamento de Montesquieu.

Nos siga no Google Notícias