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A busca deliberada por um diagnóstico, ajuda ou complica?

Por Lia Rodrigues Alcaraz (*) | 19/08/2025 08:50
A busca deliberada por um diagnóstico, ajuda ou complica?
(Foto: Reprodução/Freepik)

Nos últimos anos, houve um crescimento expressivo tanto no número de diagnósticos quanto no interesse de se investigar neurodivergências como TDAH, autismo, dislexia, entre outros, esse interesse era dado geralmente em crianças, porém, é observado principalmente nos consultórios uma crescente busca e solicitações de avaliações em pessoas já adultas. Esse fenômeno não representa, necessariamente, um aumento real na prevalência dessas condições, mas sim um avanço na compreensão científica, na ampliação do acesso a informações e na diminuição parcial do estigma em torno da saúde mental e do funcionamento neurológico. No mundo onde tudo tem que ter um nome, ou uma justificativa, categorizar ou buscar estar dentro de uma categoria acaba sendo uma subterfúgio no meio do caos, no entanto temos que tomar cuidado, pois nem todo sintoma é um transtorno.

Em contrapartida, o diagnóstico tardio, embora possa gerar sentimentos iniciais de surpresa ou até mesmo luto pelo tempo vivido sem a compreensão adequada de si, frequentemente traz consigo a possibilidade de ressignificação da própria trajetória.

Para muitos adultos, compreender que determinadas dificuldades, padrões de comportamento ou formas de processar informações não são fruto de “falta de esforço”, “defeito pessoal” ou “inadequação”, mas sim de um funcionamento cerebral distinto, é a oportunidade de dar um passo essencial para o bem-estar emocional. Esse conhecimento permite que a pessoa desenvolva estratégias mais eficazes para lidar com desafios cotidianos, identifique suas potencialidades e estabeleça limites de forma mais assertiva. Além disso, abre espaço para que ela se liberte de narrativas de autocrítica que, por anos, alimentaram a baixa autoestima e a insegurança.

No entanto, é preciso reconhecer que a obtenção de um diagnóstico tardio também apresenta desafios, muitos adultos precisam reorganizar suas expectativas sobre si mesmos, aprender a comunicar suas necessidades e lidar com a sobrecarga emocional de revisitar experiências passadas à luz dessa nova compreensão, bem como, entender que se passou uma vida sem o diagnóstico e que muita coisa foi moldada através de uma falta, e isso nem sempre traz aspectos apenas negativos, por exemplo, uma pessoa que percebe desde cedo uma falta, pode sim se esforçar mais e se dedicar mais a suprir essa falta, muitas vezes conseguindo, se superando.

 O impacto positivo no bem-estar dependerá, em grande medida, do acesso a tratamentos, terapias e redes de apoio que validem a experiência do indivíduo, em vez de reforçar estereótipos ou rotulações limitantes.

O boom de diagnósticos na vida adulta pode ser entendido como um movimento de ampliação do autoconhecimento e de fortalecimento da saúde mental, porém, mais do que um rótulo, ele oferece uma chave interpretativa para a própria história, permitindo que cada pessoa construa uma vida mais alinhada com seu funcionamento e, consequentemente, mais saudável e autêntica. O desafio que permanece é garantir que esse processo seja acompanhado de acolhimento e suporte adequados, para que o diagnóstico seja não um peso, mas um ponto de partida para novas possibilidades de existir.

(*) Lia Rodrigues Alcaraz é psicóloga formada pela UCDB (2011), especialista em orientação analítica (2015) e neuropsicóloga em formação (2024). Trabalha como psicóloga clínica na Cassems e em consultório.

 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.