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Arquitetura

Chamado de louco, há 10 anos pedreiro constrói casa em formato de “barco”

Construção diferente desperta olhares no Vila Nasser e o pedreiro diz que muita gente acredita ser a “Arca de Noé”

Thailla Torres | 10/04/2019 07:42
Morador da Vila Nasser prova que criatividade não tem limite. (Foto: Henrique Kawaminami)
Morador da Vila Nasser prova que criatividade não tem limite. (Foto: Henrique Kawaminami)

Uma construção “maluca”, na Vila Nasser, prova que criatividade não tem limite. Quem passa na porta do lugar inacabado, vê um projeto que chama atenção pelo formato. Há quem diga que parece um barco ou a Arca de Noé.

Na sequência, um pequeno portão com saída para o outro lado da rua parece ser a única entrada para os quatro andares de casa, caminho executado com muitos restos de construção. Pelo chão há sacos de cimento, pisos, tijolos e uma betoneira de canto, aparentemente, usada no dia anterior tendo em vista o cimento ainda úmido.

Ninguém mora na construção, mas, basta perguntar aos vizinhos que todo mundo aponta para o sobrado ao lado. Depois de algumas campainhas o Lado B é recebido por Kelis Rodrigues da Silva, de 39 anos, um homem falante e muito simpático, embora deixe transparecer o olhar desconfiado com quem insiste em perguntar sobre os rumos da sua criação.

Casa, hoje com vários andares, é chamada de prédio. (Foto: Henrique Kawaminami)
Casa, hoje com vários andares, é chamada de prédio. (Foto: Henrique Kawaminami)

Kelis é pai de três filhos, pedreiro, eletricista, encanador e, não fosse a necessidade de anos de graduação e diploma, diríamos que também um engenheiro. “Aqui eu brinco que se o engenheiro aparecer ele fala, mas não autoriza tudo porque eu faço do meu jeito”, ri.

Justamente pela habilidade com obras, ele resolveu encarar o desafio de construir uma casa diferente no bairro, aproveitando o espaço que sobrava em um lote de esquina, triangular. “Não tinha como eu fazer uma casa quadrada ou retangular, aqui era um triângulo, por isso, ao olhar da esquina as pessoas acham que é um barco”.

Há quem diga que a construção vai ser uma igreja, diz Kelis. “Eles acham isso porque eu sou evangélico, mas não tem nada a ver, aqui estou fazendo cinco apartamentos que serão alugados para famílias ou alunos da universidade”, afirma.

A falta de recursos acabou libertando o pedreiro para criar. “Aqui eu não tenho mão de obra, exceto a minha. Eu quem faço tudo e levantei essa estrutura sozinha”, explica Kelis, dando crédito também ao filho, de 20 anos. “Ele quem me ajuda muito, manda a massa aqui pra cima”.

Um dos corredores da construção. (Foto: Henrique Kawaminami)
Um dos corredores da construção. (Foto: Henrique Kawaminami)
Mas muita coisa ainda está inacabada. (Foto: Henrique Kawaminami)
Mas muita coisa ainda está inacabada. (Foto: Henrique Kawaminami)
Escadas são estreitas, mas o pedreiro jura que são reforçadas. (Foto: Henrique Kawaminami)
Escadas são estreitas, mas o pedreiro jura que são reforçadas. (Foto: Henrique Kawaminami)

Com a família crescendo ao longo dos anos e a vontade de terminar o seu prédio, o primeiro passo tomado pelo pedreiro foi melhorar a renda. Para ter tempo de se dedicar a construção, ele ergueu outras cinco casas na região para alugar. “Tem muito tempo que eu só vivo do aluguel e durante o dia trabalho aqui”.

O lugar ganhou cinco apartamentos, alguns chegam a 56 m², mas com tamanhos de quartos, salas e cozinhas bem diferentes. “Minha cabeça não é muito fraca não, eu quem fui desenhando tudo, com a minha experiência”, diz.

As escadas são estreitas e, ainda sem revestimento e corrimão, Kelis garante que são bem-feitas. “Aqui é tudo reforçado, com material de primeira. Cair? Essa casa não cai”, responde ao ser questionado sobre a estrutura.

Quando chegamos até o quarto andar, espaço menor e o topo do “barco”, o ponto alto está na paisagem. “De dia é lindo, mas bonito mesmo é à noite, você tem vista da cidade inteira”.

O custo de investimento e elaboração do projeto ele diz que não sabe. “Faço tudo com o que eu ganho dos meus alugueis. Tem gente que chega a dizer que é dinheiro de igreja e até droga, porque acham que um homem simples não pode construir seu império. Mas eu sou trabalhador, tenho dores nos meus braços porque faço isso sozinho”.

No terceiro andar, há sacada para todos os apartamentos. (Foto: Henrique Kawaminami)
No terceiro andar, há sacada para todos os apartamentos. (Foto: Henrique Kawaminami)
Espaço onde Kelis recebe a massa feita no térreo. (Foto: Henrique Kawaminami)
Espaço onde Kelis recebe a massa feita no térreo. (Foto: Henrique Kawaminami)

Kelis diz que nunca fez faculdade e nem revistas de engenharia ou arquitetura costuma ler. Tudo que faz é pela intuição. O único problema, é o tempo. “Não sei em quanto tempo vou terminar isso daqui, já estou um pouco cansado, mas acredito que ainda devo demorar uns oito anos”, diz lembrando que começou a obra em 2008.

Agora, apesar de uma construção diferente no bairro, o tempo faz ele pensar em deixar tudo para os filhos. “Quando eu tiver uns 60 anos isso não vai ter serventia pra mim, é muita escada pra subir. Então hoje eu vou terminar para deixar tudo para os meus filhos, quem sabe meu menino e minha menina possam usar aqui para criar um salãozinho de barba e cabelo”, torce o pedreiro.

Assim que o prédio ficar pronto, ele disse que vai chamar o Lado B para ver o resultado.

Lado B no Facebook e no Instagram.

Detalhe do prédio construído em lote de esquina, triangular. (Foto: Henrique Kawaminami)
Detalhe do prédio construído em lote de esquina, triangular. (Foto: Henrique Kawaminami)
Vista de Campo Grande do quarto andar do "barco" de Kelis. (Foto: Henrique Kawaminami)
Vista de Campo Grande do quarto andar do "barco" de Kelis. (Foto: Henrique Kawaminami)
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