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Comportamento

Cação se foi, mas Laurinda segue firme à frente de bar pioneiro do Indubrasil

Família chegou quando fundador dividia uma fazenda em lotes; terreno foi comprado em 1973 por 10 Cruzeiros

Danielle Valentim | 24/01/2020 06:12
Laurinda não para. Atrás do balcão o dia  todo, a comerciante se prepara para uma cirurgia. (Foto: Henrique Kawaminami)
Laurinda não para. Atrás do balcão o dia todo, a comerciante se prepara para uma cirurgia. (Foto: Henrique Kawaminami)

Do time de moradores que amam o próprio bairro, o Lado B encontrou dona Laurinda da Silva Curto Cação, de 71 anos. A portuguesa de sorriso solto à frente de um dos primeiros bares do Indubrasil, tece elogios à região e fala com orgulho da história construída ao lado do marido, o português Hermes Andrade Cação, que faleceu há 18 anos. 

Apesar da fazenda do fundador Antônio Nogueira da Fonseca ter sido dividida em lotes, em 1942, Laurinda lembra de áreas que ainda eram doadas, em 1973. Anos depois, em 1977, o Núcleo Industrial foi implantado pela Prefeitura de Campo Grande, sendo posteriormente transferido ao Estado.

Foto tirada no ângulo sentido Campo Grande. (Foto: Arquivo Pessoal)
Foto tirada no ângulo sentido Campo Grande. (Foto: Arquivo Pessoal)
Registro atual sentido a Terenos. (Foto: Henrique Kawaminami)
Registro atual sentido a Terenos. (Foto: Henrique Kawaminami)

“Quando chegamos aqui cada lote valia 10 cruzeiros. Ele (fundador) doou um terreno para a escola que hoje leva seu nome. Dois dos lotes foram doados para uma igreja evangélica, que não lembro se foi construída, e para a igreja católica. O campo de futebol do bairro já foi palco de muitas competições e a área também foi uma doação do fundador. Hoje onde é o hotel, era para ser uma praça. Aqui também existia a escola 7 de setembro, onde minha filha estudou”, lembra.

Laurinda chegou ao Brasil aos 3 anos e seu marido aos 4 anos. As famílias se conheciam de Portugal. Aqui em Campo Grande, os pais de Laurinda tiveram mais três filhos. O nome Laurinda, foi escolhido em homenagem a uma de suas tias, o mesmo aconteceu com todas as suas irmãs. “Cheguei ao Brasil de navio pelo Porto de Santos e junto aos meus pais e dois irmãos seguimos viagem até Campo Grande de trem”, conta.

Laura como é chamada pela família e amigos, cresceu no Bairro Amambaí e chegou ao Indubrasil, quando a filha mais velha estava com 1 ano e 7 meses, em 1973. “Eu me casei em 1970, morei dois anos com meu pai e, em 1973, chegamos ao Indubrasil. Meu sogro já morava aqui, e logo meu marido construiu. Não tinha luz, nem nada. Tinha umas 10 casas ao todo. Foi bem difícil na época, mas logo abrimos um comércio, tipo mercearia. Fizemos uma compra grande e começamos. Um lampião a gás iluminava”, lembra.

Laurinda atrás do balcão há mais de 40 anos. (Foto: Arquivo Pessoal)
Laurinda atrás do balcão há mais de 40 anos. (Foto: Arquivo Pessoal)
Dona Laurinda e seu famoso cafezinho. (Foto: Henrique Kawaminami)
Dona Laurinda e seu famoso cafezinho. (Foto: Henrique Kawaminami)

Ela se recorda que na época, apenas José Barbosa Rodrigues, dono do Correio do Estado e, seu filho Paulo eram quem tinha luz e telefone, na região. “Uma época maravilhosa, tempo que a bicicleta pousava ao lado de fora. Hoje não dá mais, mas o bairro continua bom. Muita gente marcou história por aqui, tinha seu João Benzedor. Vinha gente de todo o Estado, uma época de fluxo no bairro. Os perigos da avenida também acabaram depois da duplicação. A única parte ruim do bairro é o mau cheiro das firmas”, frisa.

Seu Hermes Cação foi presidente do bairro, levou muitas melhorias e garantiu muita diversão. Festas no Barracão do Cação ficaram famosas e até hoje são lembradas. Muito querido, um conjunto habitacional com 32 casas e uma rua do bairro ganharam o nome. “Michel Teló chegou a tocar no Barracão quando ele era do grupo Santo Chão”, frisa.

Mas nem tudo foi um mar de rosas. Laurinda lembra que o comércio da família cresceu e chegou a ser um dos maiores da região. No entanto, erros financeiros resultaram em falência, o ápice do medo de qualquer comerciante. “Nós trabalhávamos muito. No início até dia e noite. Meu marido era muito bom com as outras pessoas. Não sabia dizer não. Qualquer pessoa que chegava e pedia uma coisa ou dinheiro ele dava. Teve uma época que nós quebramos e tivemos que arrendar o ponto”, explica.

Comércio ao fundo e o carro da família. (Foto: Arquivo Pessoal)
Comércio ao fundo e o carro da família. (Foto: Arquivo Pessoal)
Mesmo ângulo do bar atualmente. (Foto: Henrique Kawaminami)
Mesmo ângulo do bar atualmente. (Foto: Henrique Kawaminami)
Cação faleceu há 18 anos e Laurinda ainda se emociona ao falar da partida do marido. (Foto: Henrique Kawaminami)
Cação faleceu há 18 anos e Laurinda ainda se emociona ao falar da partida do marido. (Foto: Henrique Kawaminami)

Pouco depois o casal voltou à frente do negócio, já que tudo ali era essência da família Cação. 

Cação faleceu há 18 anos e Laurinda ainda se emociona ao falar da partida do marido. Firme e forte à frente do bar, agora ganha a ajuda do filho nos atendimentos. “Infelizmente ele nos deixou, mas estamos aqui. Eu tive câncer no intestino em 2012, operei, fiz quimio e fui curada. Agora vou operar de uma hérnia na barriga que me incomoda. Mas não penso em parar de atender aqui. É a tradição de nossa família”, garante.

Além da paixão pela região, Laurinda carrega um orgulho “gigante” dos netos e fez questão de apontar o que cada um tem feito nos últimos anos.

“Meu filho caçula tem dois filhos, um deles está no Texas. Muito estudioso, o Rafael saiu do Colégio Militar foi para Fortaleza estudar no Farias de Brito. Ele queria passar no Ita ou Ime. Daqui ficamos na luta para mantê-lo um ano lá. Aí foi estudar no Rio de Janeiro. Morava na Urca, perto do Roberto Carlos, pela primeira vez andei de avião para visitá-lo. Atualmente ele está no Texas, ganhou uma bolsa há dois anos. O irmão caçula dele acaba de se formar em Ciências da Computação e também vai para lá em junho. Minha neta, filha da minha mais velha, estuda Arquitetura de manhã na UCDB, Administração à noite na UFMS e ainda estagia na Governadoria. Minha filha deu um carro, logo no primeiro ano para dar conta da correria. E toda essa vitória saiu daqui do Indubrasil”, diz Laurinda, toda orgulhosa.

Entre tantas histórias e aos 71 anos, Laurinda só tem um desejo. “Eu queria voltar a ter meus 20 anos, mas com a experiência que eu tenho hoje. Eu trabalharia mais ainda. A gente do comércio trabalha bastante. É cansativo. Mas você faz muita amizade. Eu gosto de gente. De ficar no meio de gente. Sou muito feliz”, finaliza.

O bar do Cação abre à 6h para o tradicional cafezinho de R$ 0,50 e funciona de segunda a segunda. Aos domingos as atividades se encerram ao meio dia.

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"A gente do comércio trabalha bastante. É cansativo. Mas você faz muita amizade. Eu gosto de gente. De ficar no meio de gente. Sou muito feliz”, finaliza. (Foto: Henrique Kawaminami)
"A gente do comércio trabalha bastante. É cansativo. Mas você faz muita amizade. Eu gosto de gente. De ficar no meio de gente. Sou muito feliz”, finaliza. (Foto: Henrique Kawaminami)
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