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Comportamento

Casal teve de largar mão de preconceito para encarar aluguel caro na Europa

Bruna e Renato embarcaram em uma aventura bem longe de Campo Grande, mas garantem que a hora extra compensa qualidade de vida

Danielle Valentim | 13/08/2019 08:25
Bruna e Renato em Dublin.
Bruna e Renato em Dublin.

Numa cidade da Europa onde apenas a “bipolaridade” do clima se assemelha a Campo Grande, Bruna e Renato embarcaram em uma aventura da qual estão decididos a não sair. Há quase um ano, em Dublin, na Irlanda, é no “jeitinho brasileiro”, que o casal concilia estudo, trabalho e aproveita uma qualidade de vida que talvez nunca alcançassem por aqui.

O jeitinho brasileiro citado não se refere a forma pejorativa, mas ao ato de improvisar soluções, quando se enfrenta algum problema. Se desprender dos preconceitos com relação a subempregos, para enfrentar um dos alugueis mais caros da Europa faz a hora extra virar prioridade.

Em Campo Grande, Bruna Zeferino atuava como personal trainer e Renato Marques como corretor de imóveis. Em território dublinense, a jovem é garçonete e o marido auxiliar de cozinha. Estudando pela manhã e trabalhando à tarde, juntos somam uma renda de cerca de 2 mil euros.

A quantia é três vezes maior que a remuneração paga às mesmas funções por aqui, quando se leva em consideração que uma garçonete ganha em média um salário de R$ 1 mil e um auxiliar de cozinha ganha cerca de R$ 1.208,00.

Passeio em um dia de folga.
Passeio em um dia de folga.

É, claro, que as despesas são em euro, mas a diferença é que não precisa de muito para o sustento. Apesar de aparecer na listas de países com menor custo de vida, a Irlanda é um país caro em outros aspectos, por exemplo, quando o assunto é aluguel. Mesmo dividindo casa, alguns quartos chegam a custar mais da metade de um salário. A parte boa é a economia com mercado, com apenas 15 euros, é possível fazer uma compra para o mês.

Por lei, estudantes só podem trabalhar 20h. Mas para quem já estava acostumado com trabalho e faculdade juntos, estender o expediente com um extra é o de menos. A única diferença é que por se tratar de subempregos, as folgas são aleatórias e nunca caem aos fins de semana.

“As aulas começam as 9h e encerram ao meio dia. Às vezes encaro uma jornada das 13h às 22h. Varia muito do seu emprego. O certo são 20h, mas a gente sempre dá um jeito de trabalhar em dois empregos ou conseguir mais horas com o gerente”, conta Bruna.

O casal aproveita os “day off” para conhecer Dublin, cidades ao redor e embarcar em passeios turísticos. Para sair da Irlanda são necessários alguns dias de folga, mas nada que um pedido com antecedência não resolva.

“Agora se você quiser mais de uma semana eles te pagam parte das férias. A liberação desses dias também deve conciliar com a escola, porque você não pode ficar com presença abaixo de 85%. No caso das férias, o curso só autoriza no verão entre junho e setembro e em dezembro, quando entra em recesso”, frisa Bruna.

Compensa? Bruna e Renato garantem que, sim. Eles recebem pouco mais de um salário mínimo para trabalharem meio período, mas na ponta do lápis, para manter o mesmo padrão de vida em Campo Grande, teriam de ganhar de R$ 10 mil a R$ 11 mil.

Bruna no trabalho, no centro da foto.
Bruna no trabalho, no centro da foto.
Bruna e Renato na academia.
Bruna e Renato na academia.

“Com salário mínimo nós já conhecemos 4 países, Paris, Londres, Suíça, e Irlanda do Norte e para isso gastamos o valor referente a duas semanas de trabalho. Aí no Brasil, pagando aluguel e atuando nas mesmas funções, nunca, jamais faríamos tudo que nós fazemos. Aqui com 2 mil euros, somando os dois, pagamos aluguel, guardamos dinheiro para as renovações de documento, viajamos pela Europa, nos alimentamos com extrema qualidade, inclusive, me tornei efetivamente vegetariano aqui”, ressalta Renato.

Dublin se tornou muito turística e só de intercambistas, a cidade mantém cerca de 40 mil brasileiros. Nos condados (bairros) mais afastados do centro, a população dublinense é mais comunicativa e o passageiro não sai do ônibus sem conversar com alguém.

Mesmo vivendo em uma cidade onde funcionam mais de 600 pubs (barzinhos), o casal consegue manter o foco. “Somos mais caseiros. Às vezes conhecemos algumas pubs quando um brasileiro faz alguma despedida”, frisa Bruna.

“Mas a gente conhece gente que se perde nos estudos porque sai todos os dias. Aqui tem uma pub que se chama Dyces, que é uma balada de brasileiro, que terça, sexta e domingo, qualquer cerveja de 500 ml sai a dois euros, então você sai de lá bêbado gastando menos de 15 euros. Tem colegas que faltam de dois a três dias seguidos no curso. Nós já preferimos faltar no curso se for para viajar”, completa Renato. 

Em vista a Suiça.
Em vista a Suiça.
Casal no norte da Irlanda.
Casal no norte da Irlanda.

O casal vive em equilíbrio com o trabalho, estudo e vida social. Além dos passeios em parques, museus e cinema, Bruna mantém o hábito de se exercitar e com apenas 30 euros mensais frequenta uma academia considerada de alto padrão, com piscina e todos os equipamentos necessários. Mesmo com o tempo apertado entre estudo e trabalho, Bruna tenta nadar uma vez ao dia.

Mas e prazos? Como pretender ficar? Bruna e Renato explicam que o intercâmbio dura oito meses, no qual seis meses são exclusivos para estudo e trabalho. Os últimos dois meses são de férias ou autorização para iniciar jornadas de 40 horas.

O curso pode ser renovado por três vezes, num período de dois anos. Renato e Bruna já fizeram a primeira renovação. “Depois das três renovações você pode começar a aplicar sua formação do Brasil, a partir de um tabela de empregos chamada Critical Skills, ou seja, se você se enquadra em alguma função, a empresa te dá um visto para você se manter aqui e trabalhar para ela. A segunda opção depois que as renovações se esgotam é iniciar uma faculdade, que é um pouco mais caro”, explica Renato.

Com relação a Critical Skills, o empregado que se mantém na empresa por cinco anos já pode entrar com o pedido de cidadania.

“Pretendemos ficar o máximo que pudermos. Vamos estudar, fazer uma faculdade ou uma pós. Nós não queremos voltar por conta da qualidade de vida. Não precisamos de muito para viver bem. As experiências são inesquecíveis, porque tudo se torna fácil, por exemplo, uma ida a Paris é muito simples. Vivemos muito bem, com pouco e por isso não pretendemos voltar”, pontua Bruna.

“Os trabalhos são exaustivos, porque não estamos com o inglês fluente, mas depois será outra história. Por exemplo, nesta viagem a Paris ficamos seis dias e gastamos 650 euros, 110 euros e lá gastamos mais 500 euros, ou seja, se colocar no comparativo não dá para ir a Rochedo com R$ 650. Íamos a Bodoquena passar o fim de semana e gastávamos R$ 1 mil”, frisa Renato.

Saudade - Para o casal, a saudade da família e da cadelinha que ficou são as partes mais difíceis. “Dá muita saudade da família, é muito difícil ficar longe da cidade onde foi criada, nunca havia saído de Campo Grande. É complicado. Sentimos falta de tudo, da família, do clima, choro toda semana por nossa cachorrinha que ficou. Estou prestes a completar um ano aqui, mas em setembro visito minha família” diz Bruna.

A saudade pode até doer, mas o frio de Dublin machuca mais. Além das baixas temperaturas, o problema é que o clima muda constantemente. No intervalo de 1 hora é possível sentir calor, frio e sofrer com uma garoa fina e novamente retirar o casaco.

“A cultura é diferente, mas a gente acostuma. Agora o clima é o ponto crítico. A Irlanda é um dos lugares mais em conta para o intercâmbio, mas o brasileiro volta de saudade ou por não aguentar o frio. O frio é de rasgar, é insuportável”, reclama Renato. “A gente tenta acostumar, mas nem dentro de casa você consegue ficar de short e blusa. Tem de dormir com o aquecedor ligado. Lembra também o clima louco de Campo Grande, que você sai com sol, volta com chuva”, completa Bruna.

Curiosidades – Em Dublin, apesar da legalidade da maconha, é proibido fumar nas ruas. O uso de bebida alcoólica também só é permitido em casa ou em pubs.

Furar o sinal de bicicleta? Nem pensar. “Um dos fora que a gente deu foi tentar furar o sinal de bicicleta. A Garda nos chamou atenção e por pouco não fomos multados. O valor da multa chega a 50 euros. Eles são muito respeitosos com relação ao semáforo e multam até pedestres se não atravessarem na faixa”, diz Renato.

Entrar sem ticket no trem pode render prisão. “Às vezes não precisa apresentar o ticket e alguns espertinhos tentam embarcar sem o comprovante, mas se pegar o azar do fiscal pedir tem de pagar 50 euros ou vai preso pela Garda - a força policial civil da República da Irlanda”, completa. 

Bruna posa em frente à Torre Eiffel.
Bruna posa em frente à Torre Eiffel.
Renato e o Arco do Triunfo em Paris.
Renato e o Arco do Triunfo em Paris.

Onde tudo começou? A ideia de sair do Brasil partiu de Bruna, que carrega o desejo desde a infância. Irlanda não era o foco, mas a facilidade com documentações para estrangeiros a fez o país virar destino.

Ao contrário da esposa, Renato nunca quis sair do Brasil. Mas quando Bruna começou o planejamento para um intercâmbio de oito meses, não pensou duas vezes. “Foram cerca de quatro meses só de orçamentos. Isso só para ela. Do planejamento à partida foram cinco meses. Foi bem rápido. Eu vim dois meses depois”, conta.

Bruna se organizou financeiramente para o primeiro mês e aconselha que todos que desejam iniciar um intercâmbio façam o mesmo, já que os gastos em reais são triplicados.

“Eu sempre sonhei, mas nunca pensei na Irlanda. Às vezes paro e penso “estou na Europa!” e a cada dia você percebe que realmente está vivendo um sonho, principalmente quando você tira seu GNIB (permissão para residir), seu PPS (uma espécie de CPF), faz uma conta no banco você percebe que tudo está se realizando”, frisa.

Nada de moleza - O casal pontua que é preciso ter ciência sobre onde terá de trabalhar, quando não se fala a língua fluentemente. Dublin não é conto de fadas, mas quando se tem foco as coisas acontecem, garantem.

“Quando se decide sair do Brasil e não tem o inglês fluente, o emprego será na limpeza, como garçonete, auxiliar de chefe de cozinha e outros. Para nós não foi um problema, porque mesmo quem trabalha nesses empregos vive super bem. É que muitas pessoas vem com o pensamento de que vai encontrar um conto de fadas. E não é assim. As pessoas às vezes vêm sem falar inglês, vem com o básico do ensino médio, chega aqui não vai trabalhar como trabalhava no Brasil”, finaliza Renato.

Bruna e Renato postam todas as experiências no Instagram @msnaeuropa. Neste IG eles também explicam  como conseguir as documentações.

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