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Comportamento

Como a canoagem tirou Flávio do fundo do poço e o fez vencer o álcool

Aos 44 anos, o bonitense Flávio Reverdito conta como venceu a dependência e a obesidade através do esporte

Thailla Torres | 07/01/2021 06:56
Flávio chegou aos 105 kg e com o esporte conseguiu recuperar seu peso ideal: 75 (Foto: Arquivo Pessoal)
Flávio chegou aos 105 kg e com o esporte conseguiu recuperar seu peso ideal: 75 (Foto: Arquivo Pessoal)

Remando contra o vício, remando por uma vida melhor. É dessa forma que o canoísta Flávio de Souza Reverdito, que hoje completa 44 anos, vive seus dias nos últimos três anos. O gerente do principal balneário de Bonito – sua cidade natal – encontrou na canoagem uma forma de se libertar da dependência em álcool e da obesidade. Hoje ele comemora medalhas, a transformação de uma vida e a felicidade ao lado da família.

A relação com a canoagem começou na adolescência, quando se tornou funcionário de uma das primeiras agências da cidade turística. Iniciou como remador em barco de passeio até que um amigo que pediu para aprender a remar barcos o ensinou a canoagem.

Flávio logo se apaixonou e passou a treinar nas horas vagas. Formou uma equipe sólida em Bonito e chegou ao primeiro lugar em campeonatos estaduais e nacionais de canoagem. Mas o sucesso só vingou de 1995 a 1999.

Assim como a canoagem, a relação com o álcool começou cedo, como acontece com milhares de jovens no Brasil. Na adolescência tomou os primeiros goles de bebida alcoólica para experimentar, em seguida veio a vontade de beber quase todos os dias. Depois disso começou a consumir álcool cada vez mais, até que a bebida o fez sofrer um grave acidente de moto no ano 2000.

“Perdi os movimentos e a sensibilidade dos braços e pernas. Permaneci 30 dias imobilizado até avaliação médica para fisioterapia. Foi longo e doloroso processo”, conta.

Flávio remando em rio de Bonito (Foto: Arquivo Pessoal)
Flávio remando em rio de Bonito (Foto: Arquivo Pessoal)

Após o acidente de moto, Flávio lembro que Bonito explodiu no cenário turístico. “Vi pessoas do Brasil inteiro entrando e saindo de Bonito, com isso muita novidade e, assim, vi alguns colegas bem próximos se envolverem com drogas, o que eu sempre tive medo”.

Além da realidade dos amigos e a distância do esporte, outro fator determinante para vício era a insatisfação após o acidente. “Bebíamos toda tarde após o trabalho e isso foi ficando mais frequente. Lembro que naqueles anos trabalhava de ressaca, não tinha o mesmo rendimento, o dia parecia longo, e ainda era remador e precisava fazer um esforço físico enorme”.

Depois de abandonar a canoagem e cansado de remar diante do vício, Flávio procurou uma nova ocupação e se casou. “Fui trabalhar como motorista de ônibus, em seguida montei um comércio, uma mercearia, onde bebia todos os dias. Só não bebia durante o trabalho porque não dava, mas nos finais de semana era o dia todo”, revela.

Flávio começou a ganhar peso quando ainda bebia todos os dias e não praticava mais atividade física. Viu seu corpo sair dos 75 quilos para os 105 quilos em questão de meses. A obesidade trouxe o cansaço e ele se viu cada vez mais distante da vontade de remar. Mas o que ele não imaginava era que na tentativa de “salvar” um amigo, ele é quem poderia ser salvo.

Flávio (à esquerda) competindo no Pantanal. (Foto: Arquivo Pessoal)
Flávio (à esquerda) competindo no Pantanal. (Foto: Arquivo Pessoal)

Transformação – “Um amigo de trabalho, também remador, sofreu um acidente e ficou paraplégico. Ele também era ex atleta de canoagem. Um dia ele me ligou e pediu para adaptarmos um caiaque para conseguir remar. Falei que o ajudaria, mas não queria mais saber de remar novamente. Só que aos poucos ele foi me levando para a água até o dia que me vi participando de uma prova em Corumbá, aos 105 quilos”, lembra.

Naquela competição, Flávio ficou em terceiro lugar, título crucial no desejo de remar contra o fundo do poço que ele tinha chegado. “Nessa época eu casei, constitui família, estava estruturado financeiramente, mas era um homem dependente de álcool e isso me fez fazer uma retrospectiva da minha vida. Olhei para traz e senti falta dos meus 75 quilos, da sobriedade, do esporte”.

Flávio celebra hoje as medalhas e o título de 1° lugar em campeonato brasileiro (Foto: Arquivo Pessoal)
Flávio celebra hoje as medalhas e o título de 1° lugar em campeonato brasileiro (Foto: Arquivo Pessoal)

Flávio participou de mais uma competição em 2018 e ficou bem colocado, foi quando decidiu que estava na hora de mudar de vida. “Decidi tomar uma atitude e parar de beber. Vencer o vício não é fácil. Vivi momentos muito difíceis. Várias vezes sonhei que estava tomando cerveja e precisava lutar contra essa vontade”.

O pai de dois filhos, que sonhava em aproveitar a vida com a família longe da dependência do álcool, voltou a pedalar, treinar judô e remar para competir. Flávio passou a treinar de segunda a sábado, intercalando com outros esportes, longe da bebida alcoólica.

Em 2019, ganhou todas as provas que competiu nos campeonatos estaduais e brasileiro e diz que chegou a ser convocado para compor a delegação brasileira na Carolina do Norte, nos Estados Unidos.

“Corri atrás de patrocínio junto aos amigos e o comércio local, tirei toda documentação, mas, nas vésperas de embarcar, veio a covid-19 e travou tudo”, diz. Mas Flávio não se lamenta. “O que me deixa feliz é saber que o esporte transforma. Fui ajudar um amigo e eu fui ajudado".

Flávio faz questão de atribuir sua trajetória de superação ao grande amigo, Roberto Pellim, paratleta de canoagem e campeão brasileiro. “Um homem guerreiro, sempre pontuando e com alto nível e índice em provas de canoagem. Quando olho para trás só consigo acreditar que foi Deus que colocou ele e outras pessoas importantes no meu caminho para superar tudo isso. Me sinto feliz”.

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