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Comportamento

Diagnóstico precoce, perseverança e fé: receita de quem venceu o câncer

Histórias de superação de quem caminhou na corda bamba do medo, perda do seio e tratamento extenuante

Aline dos Santos | 08/04/2013 07:41
Na casa Jocimara, Nossa Senhora de Fátima tem lugar especial.  (Foto: Marcos Ermínio)
Na casa Jocimara, Nossa Senhora de Fátima tem lugar especial. (Foto: Marcos Ermínio)

Jocimara e Carmem dividem a mesma gratidão no olhar, o entusiasmo juvenil pela vida e história de superação na luta contra o câncer. Ao se depararem com a doença, que muitos ainda preferem nem dizer o nome, decidiram que o melhor não seria se apequenar ou procurar culpados. A opção foi apostar na esperança, que como equilibrista caminhou na corda bamba do medo, da extração da mama e do tratamento que leva corpo e mente ao limite.

Quem entra na casa de Jocimara Dias, de 38 anos, logo avista a imagem de Nossa Senhora de Fátima. A homenagem à santa deveria estar no nome, caso o pai, a caminho do cartório, após nascimento da menina, não resolvesse encurtar o nome da filha. Mas mesmo sem ter Fátima no registro, ela logo se tornou devota. E foi em 2008 que a dona de casa descobriu o quanto a fé seria fundamental em sua história.

“Foi tudo muito rápido. Em junho de 2008 fiz ultrassom nas mamas e estava tudo bem. Em outubro, no autoexame, descobri um nódulo no seio direito”, conta. Rapidamente, decidiu procurar o médico. “Pensei, pode dar dois resultados. Ou vai ser um nódulo ou câncer. Tinha ciência que não poderia esperar seis meses para decidir”, diz.

Ela conta que desde o início a estratégia foi manter a visão realista, porém, esperançosa, evitando que o psicológico sofresse abalo ainda maior do que as dificuldades que o corpo enfrentaria. Com os exames feitos e analisados por três médicos, a notícia não foi das melhores. O câncer era agressivo, avançava rápido e exigia retirada total do seio direito. O tratamento ainda exigiria quimioterapia e briga na Justiça para obter medicação que custava R$ 12 mil por ampola, além de poder resultar em infertilidade.

Neste cenário, valeram o apoio da família e uma declaração de amor. “Liguei para o meu marido, que estava viajando, e expliquei a situação. Ele respondeu que me amava, independente de ter filhos ou não. Disse que podíamos adotar e ter os filhos do coração”, relata, ainda com expressão emocionada.

Então, teve que aprender a dizer adeus a um pedaço do corpo, aos longos cabelos encaracolados e driblar a sensação de que o destino de todos, a morte, estava mais próximo dela do que das outras pessoas. O desafio foi superado com fé, paciência e perseverança. Ela lembra que nesse processo contra o desânimo é fundamental ter médicos que apoiem o paciente. “Acho que ele tem que dizer é difícil, você tem 10% de chance, mas esses 10% podem se transformar em 100%”, afirma.

De toda a experiência, ela conta que tirou a lição do quanto a vida vale pena. “Até o azul do céu é diferente”. O ano de 2013 é especial, será o quinto após o câncer e pode ser encerrado com status de cura. Destemida, Jocimara segue com fé inabalável, sorriso aberto e entusiasmo contagiante.

Hoje curada do câncer, Carmem passou de voluntária a paciente. (Foto: Marcos Emíno)
Hoje curada do câncer, Carmem passou de voluntária a paciente. (Foto: Marcos Emíno)

A esperança veste rosa – O câncer apareceu na vida de Carmem Reis Facioni, de 61 anos, não no corpo, mas na vontade de fazer o bem. “Ia muito a bingos, via as meninas de rosa e me interessei em saber qual era o trabalho delas”, conta. As meninas eram voluntárias da Rede Feminina de Combate ao Câncer.

Em 1996, a pastora e vendedora vestiu a camiseta cor de rosa e passou a acompanhar a rotina dos pacientes no Hospital do Câncer Alfredo Abrão, em Campo Grande. A tarefa era ajudar na distribuição do café da manhã e no trabalho social.

No dia a dia, aprendeu a conviver com a esperança dos que têm chance de cura e com a delicada situação dos pacientes terminais. Três anos depois, durante exame de rotina, o aparecimento de um tumor no seio esquerdo lhe levou a descobrir que as palavras de apoio, que distribuía pelos corredores do hospital, valeriam para ela também.

“Não é fácil para ninguém. É câncer, você pensa que vai morrer”, desabafa. Casada há 37 anos, com dois filhos e três netos, ela conta que chorou muito, mas encontrou na fé e na família forças para prosseguir. Carmem passou por cirurgia para retirada de parte da mama e 25 sessões de radioterapia. Curada, usa a própria experiência no árduo trabalho de impedir que o paciente fraqueje e desista de se submeter ao tratamento.

Por esses dias, se deparou com uma mulher desesperada diante da notícia de perder um seio. “Ela era casada, tinha filhos. Perguntei o que é mais importante, o teu seio ou a tua família. Vai ficar diferente, mas o que tem maior valor é a vida”, conta. Ainda na fase de tratamento, que perdura por cinco anos, a mulher tem opção de usar prótese. Depois, há cirurgia de reconstrução da mama.

Enfrentar uma doença tão grave, traz mudanças nos valores. “Você fica mais humilde. Não se estressa por tão pouca coisa”, afirma. Durante o tratamento, foram vários os sobressaltos. Ela perdeu o pai, teve a casa roubada e o marido perdeu o emprego. “O ladrão foi só um susto e meu marido conseguiu um emprego ainda melhor”. Para quem recebe diagnóstico de câncer, Carmem aconselha: “Tenha confiança no seu médico e fé em Deus”.

A culpa é de quem – Tanto Jocimara quanto Carmem apontam que além da doença o paciente se vê obrigado a conviver com as especulações sobre a origem do câncer. Os palpites dão conta que a pessoas colaboraram para o desenvolvimento da doença porque alimentaram mágoa, raiva, ressentimento, estresse.

“Se fosse assim, as crianças não teriam câncer”, afirma Jocimara. Ela conta que não perdeu tempo pensando porque a doença apareceu na sua vida, partindo logo para o tratamento. Os números mostram que não há os “escolhidos” e que o câncer, infelizmente, atinge boa parcela da população.

Conforme o Inca (Instituto Nacional de Câncer), em 2012, a estimativa era de que 52.680 casos novos de câncer da mama surgissem no Brasil. Com risco estimado de 52 casos a cada 100 mil mulheres. Na região Centro-Oeste, onde se insere Mato Grosso do Sul, o risco estimado é de 48 casos para 100 mil mulheres.

No país, as taxas de mortalidade por câncer de mama continuam elevadas porque o diagnóstico vem em estágio avançado. O Inca alerta que o exame feito pela própria mulher não substitui o exame médico.

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