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Consumo

Com vira-lata Lino Corintiano na porta, salão é prova de persistência há 23 anos

Thailla Torres | 03/11/2016 07:05
Gilson é profissional desde 1993 e já conquistou clientes de vários lugares da cidade. (Foto: Fernando Antunes)
Gilson é profissional desde 1993 e já conquistou clientes de vários lugares da cidade. (Foto: Fernando Antunes)

Quem passa pela portinha na Rua Presidente Delfim Moreira, no Santo Amaro, encontra Gilson, pronto para fazer mais um corte de cabelo. No lugar ainda sem fachada, funciona um salão, que diferente de alguns estabelecimentos na cidade, não tem folga na segunda-feira.

É assim há 23 anos, a rotina do cabeleireiro que subiu na vida ao lado família, sempre buscando agradar os clientes pela simpatia cobrando R$ 20,00 pelo serviço. O lugar acabou virando um ponto certo entre homens e mulheres que vão em busca do corte de cabelo, barba e sobrancelha. 

Aos 45 anos, Gilson Marques Viana tem cara de menino e agilidade de sobra na hora do corte. Mas difícil mesmo é não se impressionar com a simpatia e o sorriso de quem está sempre disposto a trabalhar.

Se tornou cabeleireiro graças ao olhar da esposa. (Foto: Fernando Antunes)
Se tornou cabeleireiro graças ao olhar da esposa. (Foto: Fernando Antunes)

Há 10 anos está em um salão construído por ele na frente de casa. Por 13 anos, esteve em outro ponto na Coophatrabalho, mas o dinheiro que entrava no caixa só dava para alimentar a família e pagar aluguel. Quando finalmente conquistou a casa própria, seguiu trabalhando para investir o dinheiro em tijolos suficientes para erguer o próprio espaço. 

“Quando eu comprei minha casa, um dia eu estava aqui debaixo da árvore e pensei que em vez de juntar dinheiro para fazer o muro, eu podia comprar tijolos para fazer o salão. Daí eu não tirei isso da cabeça, trabalhava domingo e feriado, juntando dinheiro até eu comprar os materiais e construir. Daí eu nunca mais sai daqui”, conta.

O salão é simples, tem só 20m². Sem nenhuma informação na fachada, a propaganda é feita de boca em boca e ao longo dos anos, bastaram os clientes fiéis para garantir o sucesso. “Meu marketing é o trabalho. Não tenho luxo, então é minha mão de obra que conta. Eu atendo gerações, comecei atendendo pais, que traziam os filhos, hoje estou atendendo neto pequeno. Por aí vai”.

O espaço é simples, mas virou sucesso pelo preço e simpatia de Gilson. (Foto: Fernando Antunes)
O espaço é simples, mas virou sucesso pelo preço e simpatia de Gilson. (Foto: Fernando Antunes)

Gilson tem uma disposição admirável, mesmo com tantos anos na profissão, ele acredita que ainda está só na metade do caminho. “Eu ainda quero chegar aos 40 anos de trabalho”, acredita. 

Em 1993, trabalhava como vendedor e não tinha feito nenhuma faculdade após o Ensino Médio. Foi no carinho com o cabelo da esposa, que veio a luz para seguir uma profissão diferente. “Eu estava aqui um dia mexendo no cabelo da minha mulher e ela virou pra mim dizendo que eu tinha a mão boa pra isso. Que eu deveria tentar fazer um curso e me especializar. Eu resolvi escutar ela e fui atrás”, lembra.

O apoio da mulher fez com que Gilson encontrasse uma escola e se matriculasse na mesma semana. “Andei, até que achei um lugar chamado Escola de Cabeleireiro Horizontina, ali na Rui Barbosa. Nem sei se ainda existe, mas foi lá que eu comecei. Fiz um ano e três meses. E quando eu comecei já ensinava lá e ficava até no lugar da professora”.

Enquanto fazia o curso, ele trabalhava como vendedor para conseguir comprar os materiais. “Comprei lavatório, cadeira e deixei tudo guardado”. Sem ter condições de montar um salão, a primeira oportunidade de atuar como profissional veio graças a um amigo que tinha salão no bairro Guanandi. “Ele me ofereceu para trabalhar com ele, tinha uma cadeira parada lá. Comecei aos domingos e no primeiro dia eu fiz 15 cortes de cabelos. Depois de 6 meses decidi abrir meu salão alugado”.

Com o passar dos anos, Gilson foi conseguindo deixar o local mais arrumado para deixar os clientes a vontade.

Lino Corinthiano fica na porta até a saída do último cliente. (Foto: Fernando Antunes)
Lino Corinthiano fica na porta até a saída do último cliente. (Foto: Fernando Antunes)

Até o ano passado, as paredes ainda estavam descascadas e um sofá velho fazia parte da mobília. O verde da parede e um assento feito de alvenaria trouxeram mais vida ao lugar.

Tem gente que até questiona sobre a necessidade de uma decoração elaborada, como das barbearias que vem lotando a cidade. De um jeito brincalhão, afirma que não faz questão, já que se garante na qualidade do trabalho. “Algumas pessoas falam que eu podia abrir algo maior, mas não é assim. Do que adianta fazer um ambiente bonito, cheio de atrativo, se o que conta é a qualidade? Aqui eu preciso é do meu cliente. Trato ele bem, faço um bom serviço e conforme o tempo eu vou arrumando uma coisinha e outra”.

Bem iluminado, o salão tem um espelho enorme e uma televisão antiga que sempre fica ligada no noticiário. Na prateleira ao lado do lavatório, não tem shampoo de marca internacional e nem o hidratante mais caro do mundo, mas os produtos são bons, garante. “Não é produto caro, mas eu compro marca boa, que com duas lavagens o cabelo fica bem limpo”, diz.

Gilson é casado há 25 anos e pai de 3 filhos. Ele a família moram na casa dos fundos. Depois que abre o salão, o mascote vira-lata chamado Lino Corintiano é quem o acompanha até a última hora de trabalho. A escolha do nome tem sentido nas cores preto e branco do cãozinho, que também faz homenagem ao Corinthians, time de coração do cabeleireiro. “Ganhei ele de um cliente no primeiro ano do salão aqui. Era pequenininho, dormia em uma caixinha aqui dentro. Nesses anos todos, ele fica aí na frente, cuidando a porta enquanto eu estou atendendo”.

Lugar ainda não tem fachada. (Foto: Fernando Antunes)
Lugar ainda não tem fachada. (Foto: Fernando Antunes)

O salão abre de segunda a sábado para atendimento. Já aos domingos, no lugar da folga, ele atende as pessoas em casa. “Tenho clientes que são deficientes ou acamados. Por isso eu vou até a casa deles fazer o cabelo e a barba. Já na segunda, diferente de alguns lugares, eu não posso fechar, porque tenho muito cliente que não consigo atender no sábado", justifica.

Gilson abriu mão da química e da escova por conta da saúde. "Comecei a ter problema no braço, para continuar trabalhando tive que deixar de lado a escova, forçava muito", explica. 

O serviço oferecido é somente corte de cabelo, barba e sobrancelha na navalha, que por sinal, é impecável.

“Essa cadeira aqui é como um divã. Tenho muitos clientes que chegam aqui cansados, desabafam, contam os problemas com a família ou com o trabalho. Mas tudo que eles descarregam, eu varro junto com os cabelos e vão para o lixo. É um momento deles e a única coisa que eu posso fazer é ouvir”, diz.

E quando pergunto o motivo de toda alegria, mesmo em meio a crise, que segundo ele também chegou ali,  a resposta vem após um riso tímido. 

“Olha, eu só peço saúde para continuar trabalhando. Isso daqui é minha vida e da minha família. Fim do ano a gente vai sempre pro rancho ficar com a família, mas ano que vem a gente vai é pra praia”, diz orgulhoso.

O salão do Gilson abre de segunda a sábado, das 8h às 11h30 e de 13h30 às 19h. Fica na rua Presidente Delfim Moreira, 1187, Santo Amaro. 

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"Isso daqui é minha vida e da minha família", diz o cabeleireiro todo orgulhoso da profissão. (Foto: Fernando Antunes)
"Isso daqui é minha vida e da minha família", diz o cabeleireiro todo orgulhoso da profissão. (Foto: Fernando Antunes)
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