Orgasmo não depende de parceiro, e muita gente ainda não entendeu
Autoconhecimento e liberdade sexual sem tabus são caminhos para "chegar lá"

Nesta quinta-feira, 31 de julho, é celebrado o Dia Internacional do Orgasmo. Criada em 1999, a data surgiu como um convite à reflexão sobre sexualidade, prazer e, principalmente, liberdade. No entanto, apesar dos avanços, o tema ainda enfrenta tabus e silêncios, especialmente quando se trata do prazer feminino.
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Falar sobre o prazer sexual, para muita gente, ainda é um assunto delicado e evitado. Em pleno 2025, há quem nunca tenha experimentado o ápice do prazer ou sequer saiba reconhecê-lo. Pior de tudo é que muita gente ainda acredita que ter um orgasmo depende da presença de outra pessoa.
Apesar da realidade que ainda tem muito a melhorar, a psicóloga clínica Fernanda Savaris observa no consultório um movimento de libertação feminina.
“Hoje em dia, muito mais mulheres estão se masturbando, tendo isso como uma prática do cotidiano. Seja por saúde, alívio, fantasia ou desejo, isso tem feito parte do dia a dia delas”, explica.
Para ela, esse avanço está ligado ao entendimento mais amplo sobre a sexualidade e ao rompimento com o moralismo conservador. “Tiramos da relação com o próprio corpo aquela ideia de que sentir prazer era feio, errado. As mulheres estão se permitindo serem ativas sexualmente, sem retaliações. Antes, era esperado que fossem passivas, e isso bloqueava o prazer", avalia.
A estudante de jornalismo Maria Gabriela Arcanjo, de 24 anos, está desenvolvendo o Trabalho de Conclusão de Curso justamente sobre o tema “expressões da sexualidade feminina” e reforça. “A sexualidade não é só sobre sexo ou orientação. É saúde, comportamento, é sobre como a mulher se vê no mundo”, explica.
Para ela, ainda há muito conservadorismo, especialmente em estados mais interioranos como Mato Grosso do Sul. No entanto, ela nota mudanças significativas. "As mulheres estão mais inquietas, buscando formas de se expressar e inspirando outras mulheres no processo", detalha.
Essa inspiração, inclusive, pode vir de onde menos se espera. Jaqueline Silva* conta que só foi entender o próprio prazer depois de adulta, ao buscar ajuda ginecológica. “Cresci em um lar católico onde não se falava sobre sexo. Demorou muito até eu sentir meu primeiro orgasmo. Quando entendi como me estimular sozinha, foi libertador”, revela.
A mudança começou quando uma tia, após sair de um casamento, passou a falar abertamente sobre sexo nas reuniões familiares. “Hoje, ela vende produtos de sexshop e consegue tratar o tema com leveza e bom humor", relata.
As experiências revelam que, apesar dos avanços, ainda pesa sobre as mulheres uma carga maior de repressão. A psicóloga Fernanda explica. “Existe uma expectativa sobre os homens também, a de performar, durar, agir de certo modo. Mas o peso social, a repressão mesmo, é muito maior para as mulheres. Isso vem de séculos. E o prejuízo maior é não poder viver a potência do corpo na sua totalidade", avalia.
Aline Figueiredo*, por exemplo, não finge mais orgasmo. “Se eu não tive, eu falo. Antes, as mulheres fingiam e o homem saía se achando. Hoje eu deixo claro que ele não me deixou satisfeita. Quem sabe melhore na próxima, mesmo que a próxima não seja eu", destaca. Para ela, sexo é troca, e hoje em dia o sexyshop “tem deixado muito homem no chinelo”, finaliza.
Já Celma Benites*, observa uma mudança geracional na relação com o orgasmo entre duas pessoas. “Com parceiros mais novos, sinto que a relação é muito mais focada no meu prazer. Já com os mais velhos, o objetivo era o prazer deles. Era finalizado quando eles terminavam. “Graças a Deus dá pra 'chegar lá 'sozinha", pontua.
Durante a pandemia, Jaqueline aproveitou o tempo em casa para explorar e conhecer o próprio corpo. “Não era só abrir um site e me tocar. Era relaxar, comprar estimuladores, ler mais. Foi uma descoberta”, explica.
Apesar dos avanços, o desafio ainda é gigante e muita gente associa orgasmo à presença de um parceiro. “A masturbação muitas vezes é a única forma que alguém consegue sentir prazer real. Porque ali você se conhece, não precisa performar. É libertador”, ressalta a psicóloga Fernanda.
Na visão de Gabriela, o problema está na centralidade do prazer masculino. “Nas relações heteronormativas, o sexo só acaba quando o homem termina. Muitas mulheres nunca chegaram a um orgasmo e nem sabem reconhecer que tiveram. A indústria pornográfica também criou falsas expectativas sobre o que é um orgasmo. Isso tudo afasta as pessoas de se entenderem”, acredita.
Apesar disso, ela acredita que há motivos para celebrar o Dia do Orgasmo. “As mulheres estão mais livres. Sem aquele peso de se sentir errada por sentir prazer. É um avanço, sim e tem que ser reconhecido”, destaca.
Fernanda também é otimista. “Só de existir um Dia do Orgasmo e a gente poder falar abertamente sobre isso, já é uma vitória. A discussão inclui as mulheres, valoriza o prazer feminino, e celebra uma potência do corpo humano que durante séculos nos foi negada", finaliza.
*O nome é fictício para preservar a identidade da personagem.
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