ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, SÁBADO  27    CAMPO GRANDE 26º

Meio Ambiente

Área escolhida para aterro de lixo tem aquífero, córrego e gama de espécies

Principal preocupação é com contaminação do solo e da água

Jones Mário e Gabriel Neris | 06/12/2019 13:10
Fazenda Colorado fica na altura do km 30 da MS-040, em Campo Grande (Foto: Reprodução/Rima)
Fazenda Colorado fica na altura do km 30 da MS-040, em Campo Grande (Foto: Reprodução/Rima)

Localizada no km 30 da MS-040, que liga Campo Grande a Santa Rita do Pardo, a Fazenda Colorado hoje abriga centena de espécies da fauna e flora do Cerrado. Às margens do Córrego Pouso Triste e sobre o Aquífero Bauru, a área de 48 hectares foi escolhida para receber aterro sanitário e industrial, com capacidade para receber 320 toneladas de lixo por dia.

A instalação do aterro está em fase de estudos. O Rima (Relatório de Impacto Ambiental), um dos passos para a construção, foi apresentado pela Semadur (Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Gestão Urbana) em audiência pública, realizada na noite de quinta-feira (5).

De acordo com o relatório, maior parte da propriedade serve de pastagem para pecuária. Restaram, em uma ponta da fazenda, 3,4 hectares de cobertura vegetal original, correspondentes à reserva legal já existente.

No outro extremo da área passa o Pouso Triste, um dos córregos que dão origem ao Rio Anhanduizinho, afluente do Rio Anhanduí, principal curso d’água de Campo Grande.

Laudo geológico elaborado para o Rima aponta que, no local, as águas do Aquífero Bauru emergem e formam leitos fluviais.

Propriedade tem reserva legal de um lado e Córrego Pouso Triste do outro (Foto: Reprodução/Rima)
Propriedade tem reserva legal de um lado e Córrego Pouso Triste do outro (Foto: Reprodução/Rima)

O estudo apresentado em audiência pública considera os impactos negativos do empreendimento na zona rural de Campo Grande. A principal preocupação é com possível contaminação do solo e da água.

Conforme laudo geológico, as características do solo na fazenda tornam “o aquífero local de alta vulnerabilidade à contaminação”.

A análise expôs ainda que 5 hectares da propriedade têm suscetibilidade alta ou muito alta aos processos erosivos, principalmente onde o lençol freático fica a até menos de dois metros de profundidade da superfície.

Outros 31,6 hectares da fazenda foram classificados como de suscetibilidade moderada, com nível do lençol freático abaixo de quatro metros.

O laudo indica que as áreas de maior restrição são leito e margens do Pouso Triste, à oeste, e área de brejo, no centro-sul a sudoeste da propriedade.

Em profundidades menores que três metros, o estudo recomenda “medidas preservacionistas e conservativas, com a adoção de técnicas de bioengenharia”.

Fazenda tem regiões de brejo e pontos onde águas de aquífero emergem (Foto: Reprodução/Rima)
Fazenda tem regiões de brejo e pontos onde águas de aquífero emergem (Foto: Reprodução/Rima)

O laudo também defende adoção das mesmas ações nos entornos da estrada adjacente, para frear o escoamento superficial a velocidades que não causem erosão.

O Rima é assinado pelo engenheiro sanitarista Marcos Duarte, técnico responsável pela OCA Ambiental. A empresa douradense está à frente da instalação do aterro, que promete ser o primeiro apto a receber lixo industrial na região de Campo Grande.

No documento, a OCA explica a criação de sistema de tratamento dos resíduos para disposição dos rejeitos em trincheira com sistema de drenagem, onde o chorume será captado. Depois, o efluente produzido vai para conjunto de lagoas de estabilização, ligadas em série para operar sobre fluxo contínuo.

O produto será direcionado para recirculação na própria trincheira, com auxílio de moto bomba hidráulica. O mecanismo, segundo a empresa, impede a dispersão do efluente em corpos hídricos.
A princípio, a previsão é que o aterro gere 259,2 metros cúbicos de efluente por dia - dobro do volume de água represada hoje no Lago do Amor, por exemplo.

Fauna e flora - A empresa defende que o empreendimento em estudo não vai alterar a área de preservação permanente e, por isso, o impacto à flora e à fauna serão o mínimo possível.

Porém, o documento lista centena de árvores e bichos que fazem da Fazenda Colorado seu habitat. Do total, 40 espécies florestais ficam na área de pastagem.

Pelo menos 40 espécies de vegetação ficam na porção de pastagem (Foto: Reprodução/Rima)
Pelo menos 40 espécies de vegetação ficam na porção de pastagem (Foto: Reprodução/Rima)

Entre a vegetação local estão angicos-vermelho, araticuns, assapeixes, ararutas-do-campo, buritis, cascudinhos, abius, cássias, dedaleiros, guamirins-cascudos, guatambus-do-cerrado, lixeirinhas, paus-de-candeia, paus-angelim, paus-terra, patas-de-vaca, samambaias-anã, sucupiras e tarumaranas.

A população animal na propriedade é composta por aves, répteis, mamíferos e pequenos roedores, responsáveis pela dispersão de sementes, em especial de espécies frutíferas.

Foram identificados na fazenda asas-brancas, canários-da-terra, carcarás, coleirinhos, joãos-de-barro, jaçanãs, gaviões-carijó, rolinhas-roxas, sabiás-laranjeira, urubus-de-cabeça-preta; cutias, capivaras e preás; teiús-gigante, falsas-corais e até sucuris-verde.

Assentados - Além da fauna e flora, a possível instalação de aterro sanitário e industrial na MS-040 refletiria no cotidiano de 92 famílias assentadas na Fazenda Caroline, vizinha à Colorado. O assentamento, subdividido nas associações Abelhinha e Bosque dos Lírios I e II, fica entre os km 31 e 32 da rodovia.

No Rima, a OCA Ambiental prevê “geração de renda e emprego para as comunidades vizinhas, contribuindo para a movimentação da economia regional”.

Durante a fase de implantação, a empresa estima dez contratações diretas. Quando em operação, o aterro pretende gerar 30 empregos.

Impacto - O decreto que cria o Silam (Sistema Municipal de Licenciamento e Controle Ambiental) enquadra o aterro em estudo como de alto potencial poluidor.

A OCA Ambiental assegura que os níveis de emissões atmosféricas previstas ao empreendimento não caracterizam risco aos trabalhadores, população e meio ambiente, uma vez que são baixas e ocorrerão em ambiente aberto e bem arejado.

A interessada na construção do aterro projeta o cercamento da área com arame farpado e plantação de cortina vegetal ao entorno da área.

Área eleita para abrigar aterro fica às margens da MS-040 (Foto: Reprodução/Rima)
Área eleita para abrigar aterro fica às margens da MS-040 (Foto: Reprodução/Rima)

A cerca, segundo a OCA, terá a função de limitar a ação de catadores, animais e outros elementos estranhos que possam prejudicar a operação do aterro.

A cortina vegetal, composta pelas árvores nativas e plantio de bambus, será feita nas áreas de pastagem no perímetro da propriedade.

Ouvido após a audiência pública de quinta-feira, Marcos Duarte disse que a OCA Ambiental quer “atender a necessidade da indústria [de Campo Grande]”.

Sobre a área de reserva legal na propriedade, Duarte ressaltou que há uma distância segura. “Não haverá desmatamento. Não é lixão”, repeliu.

O engenheiro sanitarista também disse que é muito cedo para fazer previsão para início das atividades.

A reportagem procurou o titular da Semadur, Luís Eduardo Costa, que não atendeu ou retornou as ligações até a publicação deste texto.

Nos siga no Google Notícias