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A ética suprapartidária e a privataria tucana!

Raimundo Edmário Guimarães Galvão* | 03/01/2012 10:28

Existe ética suprapartidária? Por quê? Porque, parece que tudo existe, tudo se move dentro da hegemonia partidária e todos os seus derivados, estabelecidos, o que os lexicógrafos chamam de ideologia. Os jornais, os sindicatos, o judiciário , as instituições públicas, a religião, a ciência, tudo, tudo está aparentemente eivado disso e que os alemães traduzem de Zeitgeist.

Mas o sistema é isso, diz o educador Eronildo Barbosa, o modo de produção determina as várias relações que se estabelecem no interior do Estado. Então eu fico triste por não poder interferir com mais energia para ajudar a mudar essa realidade. Na prática sou instado a assistir alienadamente, a carruagem e os cães latindo, passarem impunemente, como num filme, sem eu poder interagir, passivo, perdido dentro de uma metáfora desconcertante de Manoel de Barros e Blanc.

O que me deixa agoniado é essa pré-condenação sumária de não poder pensar livremente. Aliás, essa é a agonia dos que querem pensar além da ideologia do seu tempo, mas, por outro lado, posso estar enganado, eu até desejo isso, por isso a pergunta introdutória, refaço-a para os Diógenes retentores de botecos de plantão: existe vida fora da política?

Nesse final de 2011 eu me senti mexido por essa indagação inicial, depois que li o polêmico livro do jornalista Amaury Ribeiro Júnior, “A Privataria Tucana” e a participar de alguns debates nas redes sociais. O livro aponta o modus operandi de um suposto esquema de corrupção montado no governo de Fernando Henrique Cardoso por ocasião das privatizações. A obra é uma reportagem investigativa de 200 páginas de texto, apoiada em mais de 140 páginas de facsimile de documentos comprobatórios, todos oficiais, solicitados por ele em juntas comerciais, cartórios, no Ministério Público e na Justiça, autenticados e com firma reconhecida.

O autor do livro descreve, passo a passo, a trajetória que o dinheiro ilícito faz, das empresas offshores a empresas de fachadas no Brasil e comprova, apresentando documentos, que foram praticados negócios financeiros vultosos envolvendo grandes corporações financeiras, durante o processo das privatizações. O jornalista autor do livro acusa o envolvimento e a conivência de parte dos meios de comunicação, crimes de corrupção ativa e passiva, favorecimento ilegal, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, enriquecimento ilícito, invasão de privacidade, vazamento de dados tributários, tudo associado ao desvio de dezenas de bilhões de dólares dos cofres públicos. A trajetória do dinheiro ilícito ao voltar ao Brasil, segundo os documentos apresentados no livro, é inserido nas fortunas pessoais do grupo ligado a Serra.

Os embates na internet são violentos, furiosos, raivosos, de morte, mas uma discussão simplesmente maniqueísta: quem defende o livro é do PT e ao contrário é do PSDB. Situando todo essa peleja nesse gargalo de direção única. “Petralhas” versus “tucanalhas” é a gíria do momento, o mote e fim! Fora desse vicioso círculo, arrastam-se uns alheios como eu.

Por mais que a publicação seja farta de documentação “inconteste”, a conta não bate porque a matemática está ideologizada como tudo nesse modo de produção . E ao final dessas linhas alguém com certeza vai afirmar que eu estou de um lado, às vezes, pela mera grifação do inconteste, porque nessa lógica nada é inconteste, permeando na orla dialética. E assim não é fácil escapar ao patrulhamento e sair ileso.

Em razão de tudo não se imagina que conseqüências o livro ainda vai ter, mas vai haver muito barulho, penso. Agora, achar que nada aconteceu é muita ingenuidade. Porém o que eu mais gostei, e que o livro cumpriu sua missão atirando no que viu a acertando no que não viu, foi, daquelas que “eu quero é ver o circo pegar fogo”, o descaramento, ou melhor, o desmascaramento da grande imprense que boicotou o livro. Foi lindo! O silêncio da grande mídia foi tão barulhento que me fez ecoar perguntas!

(*) Raimundo Edmário Guimarães Galvão é músico e jornalista

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