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Mudanças tecnológicas e as relações de trabalho

Por Marcelo Passini Mariano (*) | 24/04/2017 09:40

Não é novidade que as Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (NTICs) afetam a sociedade em sua totalidade e provocam fortes transformações no mundo do trabalho. Porém, a crescente conectividade e a digitalização dos processos sociais inicia uma fase de maior integração entre as diversas tecnologias existentes.

Com isso, são incorporadas inovações capazes de processar uma enorme quantidade de dados que, agora, se combina com ferramentas de inteligência artificial (IA) e aprendizado de máquinas que são desenvolvidas.
Essa maior integração de tecnologias digitais se viabilizou em virtude dos seguintes aspectos:

a) estágio atual de desenvolvimento e expansão da internet;

b) concentração de capital, informação e poder computacional em poucas corporações que armazenam e processam em tempo real a grande massa de dados produzida pela sociedade (Google, Facebook, Microsoft, Apple, Amazon, etc);

c) a evolução de sistemas de inteligência artificial e aprendizado de máquina que, entre tantas outras possibilidades, operam algoritmos que compreendem a linguagem natural humana, reconhecem padrões de comportamento, simulam diversos tipos de situações, recuperam e organizam dados de origens diversas e interagem com as pessoas;

d) o desenvolvimento da internet das coisas (IoT) que, apesar de estar em sua fase inicial, diz respeito à ampliação da conectividade entre objetos, não se restringindo a dispositivos específicos, como smartphones ou tablets, mas a qualquer coisa que possa ter algum mecanismo de comunicação eletrônica, seja eletrodoméstico, seja veículo, máquina e outros.

Uma primeira consequência dessa intensificação dos processos digitais sobre o trabalho é vista nas atividades focadas na coleta de dados e tratamento de informações, que vai da substituição das atividades do cobrador de pedágio até a colheitadeira moderna.

No caso da colheitadeira, ela realiza a colheita, mas já automatiza o levantamento de inúmeras informações, como a quantidade, localização, qualidade do produto colhido, entre outros aspectos. Esse processo diminui tanto o tempo de análise, como também a intervenção humana, podendo ter os dados processados à distância e em tempo real.

A segunda questão que merece atenção é o desenvolvimento de tecnologias voltadas para a automatização de rotinas que fazem parte do trabalho intelectual. Algumas atividades são mais vulneráveis que outras e, portanto, são baseadas em rotinas mais rígidas e passíveis de automatização mais intensa, como no caso do telemarketing, restando as atividades em que as rotinas exigem melhor formação profissional e capacidade de comunicação interpessoal.

Ressalta-se que, na atualidade, já é possível verificar, em grandes empresas, a automatização de parcela da rotina de profissões de alta qualificação, pela incorporação de sistemas de inteligência artificial e aprendizado de máquina. Exemplos são as plataformas de apoio à decisão para investimentos, classificação de riscos, rotinas de análise documental no campo do direito, gestão de marketing, comunicação corporativa, diagnósticos médicos, entre outros.

Além do processo de automatização de parte das atividades profissionais, há tarefas que são substituídas por sistemas e outras que são transferidas para o consumidor ou incorporadas à rotina de outras profissões. Um exemplo bem conhecido está na área do turismo, tanto de passeio quanto de negócios.

O que antes era feito por uma agência de turismo e seus operadores, agora, é substituído, em grande parte, por empresas de tecnologia da informação e comunicação, que apresentam amplas possibilidades de transporte, hospedagem e outros serviços. Como consequência, em virtude da facilidade no uso dos sistemas, o usuário final realiza a maioria das escolhas, que antes eram feitas por um profissional especializado. Assim, cada vez mais, as pessoas ganham atribuições para decidir a partir do trabalho executado por algoritmos.

Desse modo, observamos grandes organizações hipertrofiadas e o surgimento de novas empresas que ganham, cada vez, maior influência sobre as pessoas, afetando a forma como a sociedade se organiza e como o trabalho se processa. Portanto, a discussão sobre o trabalho necessita incorporar um conhecimento mais profundo sobre o momento atual da digitalização da sociedade.

Abre-se uma série de possibilidades animadoras, em uma primeira reflexão, mas também coloca muitas dúvidas quanto às consequências no mundo do trabalho. Como qualificar o trabalhador, garantir seus direitos e adaptar legislações em uma realidade em que a inteligência artificial e a internet das coisas (IoT) tendem a ganhar maior importância? Talvez seja um dos maiores desafios do mundo atual.

(*) Marcelo Passini Mariano é cocente do curso de Relações Internacionais da Unesp, câmpus Franca; coordenador do Laboratório de Novas Tecnologias de Pesquisa em Relações Internacionais (LANTRI)

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