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Os dados são os seus, mas o candidato é o deles

Por Ronaldo Mota (*) | 02/04/2018 06:32

As eleições brasileiras de 2018 ocorrem em 7 de outubro, com segundo turno previsto para dia 28 do mesmo mês. O período de propaganda eleitoral nas ruas e na internet começa, oficialmente, em 16 de agosto e vai até 5 de outubro. Além disso, a partir de 5 de julho, daqui a pouco mais de dois meses, a propaganda já estará formalmente liberada dentro dos partidos, sendo permitido aos políticos se autopromoverem nesse contexto.

Um fenômeno, ainda que longe de ser novo, mas inédito em sua dimensão, se tornará cada vez mais evidente e preocupante: os usos intensivos de “Big Data” e dos elementos, por vezes ilegais e antiéticos, da analítica eleitoral. Quanto mais entendermos estes processos, mais democrático e representativo será o pleito. Consequentemente, melhor para o país.

Por meio da utilização inteligente de dados, abre-se a possibilidade legal e ética de utilizá-los para tomar decisões mais racionais, conhecer melhor os eleitores e suas prioridades, orientar o posicionamento de candidatos e monitorar mudanças de cenários. Porém, da mesma forma, dentro da complexidade do mundo atual, torna-se igualmente possível estimular a obtenção de dados de forma maliciosa e ilegal, bem como disseminar notícias falsas ou desleais, dirigidas a perfis específicos do eleitorado, favorecendo, de forma injusta e inescrupulosa, algum candidato.

Além do acesso indevido aos dados pessoais, a partir do uso da psicologia comportamental, corre-se o risco do programa do político ser, indevidamente, construído de modo inverso. Ao invés das ideias e propostas do candidato estarem sendo colocadas à aprovação dos eleitores, constrói-se, via analítica eleitoral, o conteúdo e a forma que sejam mais adequados, desde que com maiores chances de serem votados. O produto final pode ser a construção algorítmica artificial de uma candidatura essencialmente falsa, sem relação com o que pensa o candidato e sem nenhuma garantia de comportamento do eleito após as eleições.

Revelações internacionais deste mês são assustadoras e confirmam aquilo que muitos suspeitavam: o uso dessas estratégias eleitorais atingindo níveis sem precedentes e ferindo profundamente códigos triviais de conduta. Os casos da Cambridge Analytica e de seus associados no Plebiscito de saída do Reino Unido da União Europeia e na eleição de Donald Trump nos Estados Unidos são exemplares e ilustrativos.

O testemunho recente, em tom de confissão e de arrependimento, de um brilhante jovem especialista no tema, Christopher Wylie, evidencia de forma categórica aquilo que muitos temiam. Ele descreve, em detalhes, como o uso abusivo de informações privadas e pessoais permitiu criar perfis psicológicos e políticos de mais de 50 milhões de eleitores. O desafio executado foi muito além da persuasão, elemento comum da política, tratando, no caso, de mudar mentes selecionadas, via bombardeamento personalizado de informações previamente desenhadas e customizadas. Para obter indevidamente os dados pessoais, um aplicativo de teste de personalidade na rede social Facebook, denominado “thisismydigitallife”, foi utilizado. De forma ilegal e sem conhecimento dos usuários, os perfis dos usuários e de seus amigos foram coletados e de forma abusiva utilizados.

Esta é a realidade contemporânea e, provavelmente, seja quase impossível evitar que casos similares venham a estar presentes na próxima campanha no Brasil. Porém, o antídoto imediato é uma justiça eleitoral preparada e ativa quanto a eventuais usos indevidos de nossos dados para eleger os candidatos deles. E o melhor remédio permanente é estarmos todos alertas e esclarecidos.

(*) Ronaldo Mota é chanceler da Estácio. 

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