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Padre Lebret, a economia e o humanismo

Por Marcus Eduardo de Oliveira (*) | 20/06/2011 06:02

Louis-Joseph Lebret (1897-1966), ou simplesmente, padre Lebret, como era conhecido esse dominicano, foi daquelas poucas pessoas que “desembarcaram” nesse mundo com uma missão ímpar: promover a aproximação entre o pensamento cristão vinculado à ação econômica voltada, exclusivamente, para a promoção de uma sociedade mais fraterna e menos injusta.

Poucos como ele tiveram - ou ainda tem nos dias de hoje - de forma apurada, uma visão humanista da economia. Humanista no sentido de visualizar a economia pela abrangência social que essa disciplina e tipo de atividade pode alcançar, e não somente pelas lentes mercadológicas que, por reiteradas vezes, marca esse tipo de ciência.

Nascido a 26 de junho de 1897, em Minihic-sur-Rance, na Bretanha, Lebret conseguiu ao longo do tempo em que viveu - 69 anos - criar e consolidar um pensamento social cristão ressaltando a importância da construção de uma civilização mais solidária; nunca esquecendo que as bases principais dessa premissa estavam em respeitar em primeiro lugar o ser humano, vendo-o como um ser capaz de agir em prol do estabelecimento de um mundo mais justo, e não somente “encarnado” na pele de consumidor, tão ao gosto capitalista de um tipo de economia que valoriza a posse material, e não a pessoa.

Desse modo, a vida de Lebret, enquanto teólogo de ação e pensador social, esteve diretamente entrelaçada em dois movimentos criados e estruturados para dinamizar uma cultura mais fraternal. Cultura essa que, infelizmente, nos dias de hoje, tem regredido na escala dos valores, afastando-se assim daquilo que se convenciona chamar de prática do bom-senso. Os movimentos em questão são: i) a revista “Économie et Humanisme”; e ii) o “Movimento dos Economistas Cristãos”.

Ambos os movimentos, a partir do início dos anos 1940, fizeram com que Lebret concebesse uma economia (ciência e atividade) em função do ser humano, orientando-a para a satisfação das necessidades e das aspirações de cada um comprometidos com um sistema econômico capaz de priorizar as pessoas, e não o mercado e suas mercadorias. Com esses “movimentos”, pautados no método “ver, julgar e agir”, Lebret viabilizou projetos de desenvolvimento e valorização das relações humanas sob as bases da tradição cristã.

É interessante pontuar, a esse respeito, que esses dois “movimentos” marcaram, sistematicamente, o posicionamento religioso e econômico de uma pessoa que devotou parte considerável de sua vida para desmitificar o deus-mercado e valorizar o (a) cidadão (a) desprovido (a) de recursos, mas desejoso (a) de obter uma vida melhor. Como bem aponta Manuela Silva num brilhante texto em homenagem a Lebret (...) “Esses dois projetos estão interligados por um denominador comum – o conceito de economia humana, uma economia posta ao serviço das pessoas e dos povos, de todas as pessoas e de todos os povos. É um conceito de inspiração cristã que tem atravessado os documentos do magistério da Igreja e tem a sua consagração na Carta encíclica Populorum Progessio”.

Padre Lebret, indiscutivelmente, sempre foi um homem de ação, uma espécie de pensador incomodado com as injustiças sócio-econômicas que sempre fizeram com que a exclusão de muitos fosse algo inaceitável num mundo que caminhava a passos largos para a conquista tecnológica, mas que era, ao mesmo tempo, por forças mercantis, incapaz de acabar com o problema da fome e da miséria humanas.

Em 1958, chamado a contribuir para o esclarecimento das causas do subdesenvolvimento em algumas partes do mundo, Lebret, junto a um grupo de intelectuais, funda o IRFED (Institut de Recherche et Formation em vue du Développement), transformado depois em Centre Développment et Civilisations – Lebret-IRFED, com a missão de oferecer assistência técnica no desenvolvimento dos países considerados atrasados, formando, para tanto, quadros cristãos empenhados na ação humana.

Assim, em rápidas palavras, os conceitos, as ações, o modo de ser, agir e pensar e, acima de tudo, o exemplo de vida de Padre Lebret deveriam, para o bem de uma disciplina que pretende também ser vista como espécie de “auxiliadora” para a promoção social, ser ensinados em todos os cursos superiores de ciências econômicas. De modo geral, não é exagerado afirmar que os futuros economistas necessitam “respirar” os ideais de Padre Lebret. A Economia Humana saberá agradecer essa prática.

(*) Marcus Eduardo de Oliveira é economista e especialista em política internacional.

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