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Queda da taxa básica eleva riscos de fundos de pensão

Por José Menezes Gomes | 21/12/2012 16:35

A queda do juro básico, definido pela taxa Selic, que chegou a 7,25% ao ano, começou a repercutir sobre os fundos de pensão e com isso ficou explicito o conflito entre o pressuposto do governo militar, do General Geisel, para justificar a previdência complementar nos anos 70: garantir previdência privada aos trabalhadores e ao mesmo tempo criar as bases para o desenvolvimento econômico. Com os juros em 7,25% e a inflação projetada em 5,34%, a taxa real hoje é de 1,91%. Isto faz com que os recursos dos fundos aplicados nestes títulos tenham rendimentos menores. Este movimento de queda da taxa básica que hoje vivemos no brasil é parte tardia de um processo de queda desta taxa que ocorreu nos países centrais, desde 2003, quando a taxa básica do FED dos EUA chegou a 1% ao ano, na tentativa de combater os efeitos da crise. Este fenômeno da queda desta taxa se ampliou nos demais países industrializados. Desde 2008 esta taxa chegou a 0,25% ao ano nos EUA.

Atualmente temos em países que representam 80% do PIB mundial, seus bancos centrais praticando taxa abaixo de 1% ao ano. Desta forma, naqueles países a rentabilidade dos recursos dos fundos de pensão aplicados em títulos públicos destes países diminui bastante, levando a busca de investimentos de maior risco e por sua vez maior retorno. Tal fato levou a busca dos derivativos, bem como aplicações em ações e títulos públicos, também em países subdesenvolvidos. Em se tratando dos rendimentos vindos do mercado de ações estudos da Organização do Desenvolvimento Econômico (OCDE) constataram que as perdas dos fundos de pensão americanos ficaram entre 30% a 40% dos seus ativos, porque boa parte desse dinheiro estava aplicado em ações e derivativos1.

A primeira consequência deste fato no brasil é a alteração da meta atuarial que era de 6% para 5,5% ao ano. Segundo Jaime Mariz de Faria Júnior, secretário da SPPC - Secretaria de Políticas de Previdência Complementar, os grandes fundos de pensão já praticam os 5,5% ao ano. As entidades que ainda usam a meta de 6% representam menos de 20% dos R$ 620 bilhões de ativos do sistema de previdência complementar fechada no brasil. A segunda consequência é que esta queda tende a rebaixar o retorno das aplicações em renda fixa. No brasil os fundos de pensão amargaram perda superior a R$ 40 bilhões com a queda na Bolsa em 2008. Entretanto, mais da metade dos recursos dos fundos está aplicada em renda fixa. Ou seja, são dependentes dos títulos públicos e por sua vez dos cortes dos gastos sociais.

Esta perda de rentabilidade pode levar os gestores dos fundos de pensão a buscar investimentos de maior risco para tentar honrar as atuais e futuras aposentadorias complementares. Para Antônio Fernando Gazzoni, da Gama Consultoria a redução de meio ponto na taxa atuarial deverá elevar entre 4% e 6% o valor presente atribuído ao passivo atuarial daqueles que ainda não estão nos 5,5%. Elevando este passivo atuarial surge a necessidade de ajuste, via aumento de contribuições ou de redução da expectativa de benefício futuro2.

Visando formas de aplicações mais rentáveis a SPPC solicitou que o BNDES criasse um fundo de investimento em infraestrutura voltado para os fundos de pensão, especialmente os de pequeno e médio portes. Com isso o governo pretende estender aos fundos de pensão as chamada Parceria Público – Privada, onde o governo oferece garantia de rentabilidade, retirando qualquer risco do investimento em infraestrutura. Em linhas gerais, na busca de aplicações mais rentáveis temos sempre a procura por investimentos de maior riscos, que podem ameaçar a própria existência destes fundos, e por sua vez comprometer o pagamento da aposentadoria privada de milhares de aposentados e pensionistas.

Segundo o jornal correio brasiliense de 28.10.12 parte dos R$ 620 bilhões do patrimônio dos fundos de pensão está correndo risco por terem sido aplicado em papéis de bancos de pequeno e médios com a promessa de ganho fácil e rentabilidade superior à média do mercado3. A quebra de sete bancos nos últimos dois anos: Pan Americano, Schahin, Morada, Cruzeiro do Sul, Prosper, Matone e BVA levou os fundos de pensão ligados aos funcionários das empresas estatais a contabilizar prejuízos em torno de R$ 1 bilhão.

Todavia, o que tem chamado atenção dos fiscais do Banco Central, da Polícia Federal e do Ministério Público é o fato dos fundos de estatais serem os maiores perdedores. “A coincidência é impressionante. Em quase todos os bancos fechados por fraudes, há fundos de pensão de empresas estatais com dinheiro retido. Parece um movimento combinado, muito suspeito”, diz um técnico do Banco Central. Os indícios de irregularidades são grandes, segundo os policiais envolvidos nas investigações abertas a pedido do Ministério Público. Uma das suspeitas é que gestores deste fundos estariam recebendo comissões “por fora” destes bancos para fazerem aplicações de recursos com eles. “Os agrados feitos pelos bancos de menor porte incluiriam, além de comissões, viagens, carros e festas com muitas mulheres”, ressalta um policial4. Somente com a recente intervenção do Banco Central no BVA, R$ 110,4 milhões aplicados por sete entidades previdenciárias ficaram ameaçados. Estão na lista, as fundações Serpros, dos empregados do Serpro, e Infraprev, dos funcionários da Infraero.

A fase de expansão dos fundos de pensão nos EUA, ocorreu especialmente nos EUA com a criação da ERISA5 em 1974, impulsionada pela politica dos juros altos e pela gigantesca especulação ocorrida nas bolsas americanas, desde os anos 80. Por outro lado, a queda da taxa de juros nos EUA, desde 1986 não foi acompanhada por uma expansão proporcional da atividade industrial, mais sim da ocorrência de crise econômica em espaço de tempo cada vez menor. Tivemos crash nas bolsas estadunidense em 1987, em 2000 – 2001, em 2008. Evidentemente que a queda mais acentuada e sincronizada com a economia mundial foi a de 2008. Antes desta ocorrência no epicentro capitalista, tivemos a crise mexicana, em 1995, crise asiática em 1997, crise russa em 1998, crise argentina em 2001.

No Chile desde metade da década de 90 a redução dos juros reais foi acompanhada de mudanças na regulação dos investimentos do sistema chileno que provocou uma forte mudança nas carteiras dos fundos de pensão, inclusive com investimentos no exterior. Neste país, desde de 1992 já era permitido aos fundos fazerem aplicação em ativos estrangeiros. Atualmente, as cinco principais administradoras de fundos de pensão do país possuem carteiras de investimentos no exterior, com uma média 40% do patrimônio aplicado.

De fato a politica de juros baixos não foi suficiente para garantir a retomada da economia nos países industrializados. A valorização das ações não se deve a uma expansão proporcional dos investimentos e dos lucros, mas devido ao crescente volume de capital e lucros fictícios (CARCANHOLO, 2011)6. Desta forma para os fundos de pensão que dependem das aplicações em renda variável (ações) e de renda fixa (títulos públicos) não tiveram bons momentos nos últimos anos nos EUA e Europa. Sendo assim a queda taxa de juros não ajudou no desenvolvimento econômico mundial, já que persiste no cenário mundial a recessão e ao mesmo tempo reduziu o retorno dos títulos públicos. Assim, ameaçou as duas pernas que dão sustentação aos fundos de pensão. Da mesma forma que os fundos de pensão nos EUA já fazem há bastante tempo, os fundos de pensão no Brasil, tenderão a investir cada vez em aplicações mais complexas e de alto risco.

A intensidade da crise e sua persistência tem levado a estas perdas que por sua vez tem comprometido a capacidade dos fundos bancarem os benefícios aos associados. A consequência imediata disto é mudança de orientação dos fundos de pensão no mundo, especialmente no que trata da mudança do tipo de beneficio. Inicialmente quase todos os planos eram de beneficio definido. Atualmente a tendencia mundial e de generalização do tipo contribuição definida. Para dar consequência a esta busca por aplicações de maior risco o artigo 44 da Resolução 3792/2009 do Conselho Monetário Nacional permite que entidades fechadas de previdência complementar possam realizar operações com derivativos.

1http://www.valor.com.br/brasil/2621400/piora-da-crise-europeia-atrapalharia-crescimento-do-brasil-diz-fmi#ixzz2CTwup5e

2 http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/9/21/produto-do-bndes-foca-pequenas-fundacoes/

3 http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2012/10/28/internas_economia,330464/fundos-de-pensao-de-funcionarios-de-empresas-estatais-podem-virar-po.shtml

4 http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2012/10/28/internas_economia,330464/fundos-de-pensao-de-funcionarios-de-empresas-estatais-podem-virar-po.shtml

5 Employee Retirement Income Security Act of 1974 (ERISA)

6 http://www.observatoriodelacrisis.org/2011/02/capital-ficticio-e-lucros-ficticios/?lang=pt-br

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