Filha consegue ordem judicial para se despedir do pai no leito de morte
Única filha, Ana Paula se desesperou e entrou com pedido para vê-lo antes de morrer
O desejo de dar o último adeus ao pai vítima de covid-19 enquanto ele ainda respirava, fez a auxiliar jurídico, Ana Paula Canini tomar uma atitude de desespero: acionar a Justiça para que esse direito lhe fosse garantido. E foi. No entanto, antes da medida ser cumprida, ele faleceu.
À reportagem, ela lamentou muito o fato de não ter havido tempo da decisão judicial ser cumprida. Paulo Roberto Canini, de 59 anos, morreu às 10h45 da manhã de ontem, mas a sentença saiu apenas às 15h30 do mesmo dia.
“Eles me negaram vê-lo em três instâncias: na assistência social, na chefia da assistência social e no comitê médico que avaliou meu pedido”, contou, relatando a luta que teve junto ao hospital para que fosse liberada para visitá-lo antes de morrer.
Ela disse ainda que na sexta-feira passada, dia 23, chegou o primeiro boletim que sinalizava piora e possibilidade de óbito e foi quando ela pediu pela primeira vez para ver o pai, “assumindo todos os riscos”, disse.
Na terça, 27, quando a indicação era de falecimento nas próximas horas, foi então que o desespero bateu forte e ela teve certeza que tinha que fazer alguma coisa para vê-lo antes que parasse definitivamente de respirar.
Fica uma lacuna muito grande porque mesmo ele intubado, ele ainda estava vivo, o coração ainda estava batendo. Mas hoje, no velório, o corpo dele já estava mudado, inchado, com o preparo do formol para o traslado. É uma imagem bem diferente, distorcida”, lamenta a filha.
Paulo Roberto será enterrado em Ribeirão Preto (SP), onde nasceu e cresceu. Ele era representante comercial em Campo Grande e Ana Paula é sua única filha.
Ação - o advogado e amigo de Ana, LeandroJust José Torres Soares contou um pouco da história e lembra que no fim da tarde de terça-feira foi que ele recebeu a ligação de Ana Paula.
“Ela estava desesperada, porque o boletim médico trouxe que o pai dela tinha poucas horas de vida e ele precisava fazer alguma coisa, porque o hospital não deixava ela entrar para vê-lo”, disse.
No pedido, o clamor era por visita presencial ao leito do pai ou ao menos, por videoconferência, alegando que na Santa Casa, onde estava internado, isso não era permitido.
Como justificativa, a defesa enfatizou que além do ato ser considerado desumano, “o hospital demandado possui os equipamentos e demais protocolos para assegurar uma visita segura da filha ao seu pai ou, ao menos, possibilitar uma visita por videoconferência”.
Também foi alegado que o tempo do novo coronavírus ativo em Paulo já havia passado, o que asseguraria a não transmissão da doença.
Pelo entendimento do juiz da 3ª Vara Cível Residual, Juliano Rodrigues Valentim, o fato do “pai da requerente é "paciente gravíssimo com altas chances de óbito nas próximas horas", torna cristalina a necessidade de imediata concessão da tutela excepcional, pena de perecimento do direito provável”
No entanto, ponderou que a Justiça não poderia obrigar a Santa Casa a cumprir autorização de visita já que detém “autonomia para definir as normas de combate à pandemia, de acordo com as diretrizes do Ministério da Saúde”.
Por isso, sentença foi delineada no sentido do “preferencialmente e se possível” garantir a visita presencial, mas não sendo possível, realiza-la através de recurso tecnológico.
Mesmo assim, caso o hospital não cumprisse nenhuma nem outra forma de visita, deveria ser penalizada com pagamento de multa no valor de R$ 2mil.
Matéria editada às 19h08 de 1 de maio para alteração de imagem.