Moradores enfrentam frio e fila desde a madrugada por serviços gratuitos

A manhã de sábado (19) começou gelada em Campo Grande, mas a temperatura não impediu que dezenas de pessoas formassem uma fila na entrada do Parque Jacques da Luz, no Bairro Moreninhas, onde acontece a Ação Cidadania Todos Por Elas, promovida pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Antes mesmo das 8h, horário marcado para a abertura dos portões, já havia gente esperando havia horas. O primeiro da fila chegou às 4h50 da manhã, com termômetros marcando menos de 10 graus.

Edicarlo Rodrigues, 49 anos, é eletricista e saiu do Campo Nobre ainda no escuro. “Perdi meus documentos e vim fazer a segunda via da minha identidade. Quero também baixar minha carteira digital. Tem 15 dias que perdi tudo. Já consegui tirar habilitação, CPF, título... agora falta a identidade. Vi na TV e vim. Tem um custo, e essa ação ajuda porque aqui é de graça. Dia de semana, a gente trabalha, então aproveitei o sábado.”

A ação vai até as 17h e todos serão atendidos. São mais de 90 instituições públicas e privadas reunidas para oferecer serviços gratuitos de saúde, emissão de documentos, assistência jurídica e social, cultura, lazer e rodas de conversa. Um mutirão popular, com alma de urgência.

Tem ainda vacinação contra influenza, testes rápidos de hepatite B, C, sífilis e HIV, atendimento odontológico e oftalmológico, medição de glicemia e pressão arterial, autoexame bucal, além de plantão psicológico, oficinas sobre ISTs na adolescência, autoconhecimento, robótica, uso de celular para idosos, conscientização sobre violência doméstica, arboviroses e saúde única, entre outros temas. Ao longo do dia, mudas de árvores também estão sendo distribuídas.

A iniciativa faz parte da campanha #TodosPorElas, pelo Fim do Feminicídio, e tem como idealizadora a desembargadora Jaceguara Dantas da Silva, do TJMS. A proposta é clara: prevenção como proteção, oferecendo dignidade a quem mais precisa, especialmente mulheres em situação de vulnerabilidade.

Na fila, há quem veio por causa da identidade perdida, quem tenta reaver o benefício do INSS cortado, quem quer apenas cuidar da própria saúde, coisa que deveria ser simples, mas não é.

Eva Rodrigues, 82 anos, mora sozinha nas Moreninhas, é cadeirante, nunca se casou e vive com autonomia limitada desde que sofreu um derrame em 2012. “Acordo todo dia às 5h. Hoje aproveitei para vir fazer exame de vista e papanicolau. Só tem eu pra cuidar da minha saúde. Já cuidei muito dos outros, hoje espero por ações assim.”

Dirlei Rodrigues, 51, veio do Portal da Lagoa. Acordou às 4h e o irmão a trouxe. Ela tenta resolver a suspensão do benefício do LOAS, que recebia há sete anos por questões psiquiátricas. “No mês passado, cortaram e eu não sei por quê. Quero falar com a Defensoria e entender como voltar.”

A ação também mobilizou quem cuida de quem não pode mais sair de casa. Felícia Martins, 60 anos, cozinheira, trouxe a esperança de regularizar uma procuração. “Moro nas Moreninhas 3. Tô acordada desde as 3h, mas foi meu sobrinho que veio segurar o lugar pra mim. Minha mãe é acamada e eu vim fazer uma procuração pra poder pegar fralda e outras coisas por ela. Achei ótima essa ação.”

Durante toda a manhã e tarde, os portões seguirão abertos, com a promessa de atender a todos. Uma equipe mobilizada para garantir exames, orientações jurídicas, atualização de documentos, vacinas, atividades para crianças, corte de cabelo, cultura e informação. Tudo concentrado em um único lugar, gratuito. Quem quiser, dá tempo de chegar.

E mais importante: mulheres que estiverem em situação de violência podem registrar boletim de ocorrência diretamente no local, com apoio da equipe da Delegacia Especializada. Embora até o momento nenhum caso tenha sido registrado, o serviço está disponível durante todo o evento, garantindo acolhimento e suporte imediato para quem precisar.

O Parque Jaques da Luz fica na R. Barreiras, s/n - Moreninha III.

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