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Capital

No mundo “paralelo” da rua, há quem fuja mais das regras do que da chuva

Na Capital dois abrigos possuem capacidade para acolher 50 moradores cada, porém vagas são pouco utilizadas mesmo diante das chuvas

Guilherme Henri | 21/02/2018 11:21
Antônio Alves dos Santos, 43 anos na Praça Ary Coelho (Foto: André Bittar)
Antônio Alves dos Santos, 43 anos na Praça Ary Coelho (Foto: André Bittar)

A madrugada foi de mais chuva e para quem mora nas ruas de Campo Grande a cobertura do comércio fechado ou a árvore mais próxima se transformam em abrigos. O que não evita que eles se molhem.

No dia seguinte, se houver trégua do clima, o que resta é torcer a camiseta usada para forrar o chão, estender o único jeans surrado na grade da praça esperando secar. E seguir em adiante.

Afinal, para quem faz da rua morada, um dia chuvoso é só mais um dia em um mundo paralelo, onde o tempo parou. E o melhor é enfrentar este tempo à maneira deles do que as regras impostas nos abrigos públicos.

Em Campo Grande, não é difícil encontrar personagens para esse relato, na maioria homens com idades que vão de 20 anos até a velhice.

O difícil mesmo é saber de onde eles vêm. Em uma mesma conversa, é possível ouvir passagens em vários estados como São Paulo, Paraná e até Rio de Janeiro. Mas, a memória falha quando o lugar é de onde são. E diante de tudo, o fato é que eles levam esta vida há muito tempo.

“É uma vida 'cabulosa'. Um dia de chuva é só mais um dia. Eu nem sei que dia é hoje. Tô há três noites 'virado' e vamos aí levando a vida. Agora parou de chover, vou cuidar de uns carros e catar latinha pra fazer um dinheiro, porque sou drogado mas, ladrão não”, conta o morador de rua Eduardo Aparecido Garibalde, 28 anos.

Valdomiro José dos Santos, 53 anos (Foto: André Bittar)
Valdomiro José dos Santos, 53 anos (Foto: André Bittar)
Eduardo Aparecido Garibalde, 28 anos, e colega (Foto: André Bittar)
Eduardo Aparecido Garibalde, 28 anos, e colega (Foto: André Bittar)

Ele diz ser de São Paulo e está nas ruas há 10 anos. “Prefiro essa correria do que ficar em abrigo quando chove ou faz frio. Lá a gente é maltratado”, alega o rapaz, que enquanto era entrevistado manuseava canos de antena para consumir entorpecentes.

Ao lado dele, um colega estava estirado embaixo de uma varanda de um comércio desativado no centro. Nenhum deles tinha cobertores, ou sacolas. A “estratégia”, segundo Eduardo, é estender a própria camiseta e “apagar”. No outro dia torcê-la e continuar.

Poucos metros a diante, Antônio Alves dos Santos, 43 anos, estendia o único jeans molhado da chuva que caiu na madrugada na grade da praça Ary Coelho, no centro. No lugar ele cobria as partes íntimas com uma blusa de moletom.

Antônio encontrou dificuldade para responder de onde veio, mas ao ser perguntado da chuva o dado foi certeiro “choveu das 3h até agora pouco”. E além desta resposta clara outra veio de maneira direta “não durmo em abrigo porque lá é lugar de viciado”, diz seguindo caminho sem se despedir.

Já Valdomiro José dos Santos, 53 anos, que descia a rua 13 de Maio sem destino certo, usou Jesus como referência sobre a vida nas ruas ao dizer “ele [Jesus] não andou na terra sozinho?” e também afirmou saber quando vai chover em Campo Grande. “Sou paranaemse meu amigo não sinto frio fácil não. Mas, se vai chover eu fico debaixo de qualquer lugar coberto, até árvore”.

Morador de rua em abrigado embaixo de cobertura de comércio fechado no centro (Foto: André Bittar)
Morador de rua em abrigado embaixo de cobertura de comércio fechado no centro (Foto: André Bittar)

Posando para foto com o cobertor usado nas noites ao relento, Valdomiro compartilha da mesma opinião da dos outros entrevistados: “não aguento alguém falar pra mim sobre drogas por isso não durmo em abrigo nenhum. Já basta o tabaco e a cachaça”, embraveja.

Abrigos – Campo Grande tem dois abrigos públicos. Um deles é o Cetremi (Centro de Triagem e Encaminhamento do Migrante), no Jardim Veraneio, e o outro é o Centro POP, que fica na rua Maracaju.

Segundo a Secretaria de Assistência Social, mesmo com as chuvas, no Cetremi, ontem (20) estava um imigrante e 37 migrantes abrigados. Nesta quarta-feira (21), o número se manteve. No Centro POP, houve a diminuição nos atendimentos de 78 ontem para 63 hoje. Os dois abrigos possuem capacidade para atender 50 pessoas.

Os acolhimentos são feitos por meio do SEAS (Serviço Especializado em Abordagem Social) por meio de denúncia ou busca ativa, de forma ininterrupta. Caso haja aceite do morador, as pessoas são encaminhadas ao Centro Pop onde acontece uma triagem de cunho pessoal na tentativa de localizar os familiares.

O Centro Pop fornece comida, banho,roupas, abrigo e encaminha para pernoite no Centro Pop. Caso seja necessário, é realizado encaminhamento para segunda via de documentação e mercado de trabalho.

Serviço - O SEAS pode ser acionado pelos telefones (67) 98405-9528 ou (67) 99290-8174.

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