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Capital

Só permitido por juiz, casamento para menor de 16 pode disfarçar exploração

Aline dos Santos | 26/07/2015 14:30

O que se esconde por trás do sim de uma menina de 13 anos, que no começo da adolescência se dispõe a enveredar por um casamento e toda a responsabilidade de uma vida adulta? Para a defensora pública Débora Maria de Souza Paulino, a tentativa de matrimônio nesse estágio pode ser uma forma disfarçada de exploração sexual. A constatação veio após ver por uma década as jovens “noivas” caladas e entristecidas pelos cantos.

A estratégia de passar a filha adiante chamou a atenção da profissional, que por 11 anos trabalhando no interior viu pais baterem à porta da Defensoria Pública após descobrirem no cartório que os filhos menores de 16 anos precisavam de autorização judicial para o casamento. “Famílias que querem casar os filhos de 13 anos. Como se o filho fosse um produto, um cachorro para alguém cuidar”, disse durante audiência pública sobre o tema na Câmara Municipal de Campo Grande.

O tom incisivo foi para provocar reflexão sobre os direitos das adolescentes. “Apareciam vários casos de autorização de casamento para menores. Em sua grande maioria menina, com rapazes bem mais velhos. Me parece até um tipo de exploração sexual. Por que deixar uma filha tão jovem, uma criança a se submeter a um relacionamento de adulto?”, questiona.

Das famílias, que em um caso chegou a enviar até o convite do casamento para sensibilizar, a defensora ouvia de justificativa religiosa até econômica. No caso do convite, a noiva era uma moça de 15 anos. Os pais, que alegaram motivo religioso, foram orientados a esperar que a adolescente completasse os 16 anos, idade em que basta a autorização dos responsáveis para o matrimônio.

“Pressionaram muito, lideres religiosos tentando forçar. Como se eu estivesse impedindo a felicidade do casal”, recorda.

Mas a questão econômica predomina na hora de se livrar da responsabilidade, principalmente se o namoro já envolve relação sexual. “Não quero filha assim na minha casa. Já que ele quer ter relação com a minha filha, vai ter que assumir”, diz a defensora, ao citar as justificativas, de forte cunho machista.

Das meninas, ouvia o silêncio. “As meninas, muito jovens, ficavam la quietas, no canto delas. Dificilmente eu via menina mesmo empenhada. Ela queria explorar a sexualidade. Ter um namoro”, afirma.

Conforme a assessoria de imprensa do TJ/MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), foram 24 processos de autorização de casamento para menores de 16 anos em 2014. Neste ano, entre janeiro e junho, são 15 processos.

Especialista na área, o advogado e professor Delmiro Porto, afirma que a capacidade nupcial ocorre aos 16 anos. Antes disso, a união depende de autorização judicial e a previsão legal é quando ocorre gravidez. De acordo com ele, a exigência vale para ambos os sexos. Ou seja, a gestante já atingiu a idade núbil, mas o pai da criança vai precisar da autorização judicial se for menor de 16 anos.

Ele alerta que o casamento não livra o parceiro de responder pelo Código Penal. “O casamento não funciona como excludente de punibilidade na parte penal”, afirma. O advogado esclarece que o artigo 1.520 do Código Civil até prevê essa possibilidade. Contudo, ele atribui o texto a um “cochilo” dos legisladores.

Pois o Código Civil foi publicado quando essa excludente de punibilidade já havia sido retirada do Código Penal. “Embora seja uma lei bastante recente, o dispositivo saiu anacrônico. Casar para evitar imposição de pena não existe mais”.

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