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Interior

Pais de estudante morta por servidor sem CNH acusam prefeitura de negligência

Prefeito classificou caso como “fatalidade”, mas disse que houve irresponsabilidade e abriu sindicância

Por Gabi Cenciarelli e Sidney Assis, de Coxim | 13/11/2025 18:39


RESUMO

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Família de estudante atropelada em Coxim acusa a Prefeitura de negligência após motorista escolar sem CNH causar acidente fatal. Letícia Camargo, de 25 anos, foi atingida quando caminhava para a universidade. O condutor, Cleyton Matos Campos, dirigia em alta velocidade, na contramão e confessou que usava o celular no momento da colisão. Os pais da vítima denunciam a falta de contato da administração municipal e cobram justiça. Letícia estava prestes a se formar na UFMS e já tinha ensaio de formatura e TCC aprovado. O motorista, que tinha CNH vencida há mais de um ano e histórico criminal, foi preso em flagrante por homicídio doloso.

A despedida de Letícia Camargo, de 25 anos, começou cedo e terminou com a casa da avó, em Pedro Gomes, cidade a 306 km de Campo Grande, tomada pela dor da família. Entre fotos espalhadas sobre a mesa, parentes chorando e chuva forte batendo no telhado, a mãe e o pai da jovem abriram o coração ao Campo Grande News e relataram, em detalhes, as primeiras horas após a tragédia. Eles dizem que não receberam nenhum contato da Prefeitura de Coxim e repetem, exaustos, que só querem justiça.

"Meu coração está em pedaços. A metade de mim foi embora", disse a mãe, Neliane da Silva Camargo, de 41 anos, sentada no sofá onde passou a madrugada em claro. "A Letícia era o meu motivo para tentar viver mais um mês, um ano, o tempo que Deus desse. Ele levou isso de mim ontem. Tirou o meu motivo."

A mãe contou que o hospital tentou ligar, mas ela não ouviu a primeira chamada. Quando retornou, foi informada apenas que a filha tinha sofrido um acidente e precisava da presença dela. "Eu não sabia que ela tinha morrido. Na estrada, começaram a chegar mensagens dizendo 'meus sentimentos'. Ali eu percebi. Vi que Deus tinha levado a minha filha", relatou, chorando.

Pais de estudante morta por servidor sem CNH acusam prefeitura de negligência
Letícia em registro recente com a mãe (Foto: Divulgação)

O pai, Manuel Rodrigues da Silva, de 54 anos, estava na fazenda quando recebeu a notícia. Ele tentou falar, mas precisou parar várias vezes para respirar. "Eu achei que ela só tinha se machucado. Quando cheguei a Coxim e me disseram que ela havia falecido, meu mundo caiu. A gente luta tanto para ver um filho crescer na vida. Ela lutava. E agora acabou."

Manuel reforça que ninguém da Prefeitura se manifestou até agora. "Estamos com dois celulares na mão desde ontem. Não recebemos uma ligação. Nem um sinto muito. Nada. Pedro Gomes nos amparou. A faculdade nos amparou. Coxim, não. É mentira dizer que deram apoio."

A indignação sobre o motorista — Entre uma pausa e outra para enxugar as lágrimas, o pai desabafou sobre a contratação do motorista Cleyton Matos Campos, que dirigia com CNH vencida há mais de um ano e assumiu que estava mexendo no celular no momento da colisão.

"É inconcebível colocar um motorista com CNH vencida há um ano e meio para dirigir ônibus escolar. O prefeito diz que não tem culpa, mas quem contrata é a Prefeitura. Como que colocam um cara desses para trabalhar? Do jeito que tirou a vida da minha filha, pode tirar de qualquer um", afirmou.

A mãe, ao lado, completou: "Nós desviamos de cachorro na rua. Por que ele não desviou da minha filha? Ele tirou metade de mim. Levou a minha vida junto."

O sonho interrompido — A casa da família ainda guarda lembranças recentes da alegria da estudante. O ensaio de fotos da formatura estava pronto; o TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) havia sido aprovado e publicado na terça-feira e havia planos para a colação de grau em 11 de dezembro.

"Ela estava radiante. Tinha publicado uma foto com o jaleco dois dias antes. A gente vivia em contagem regressiva", contou a mãe. "Meu Deus, como ela estava feliz. E tiraram isso dela."

Pais de estudante morta por servidor sem CNH acusam prefeitura de negligência
Colegas reunídos em despedida (Foto: Arquivo Pessoal)

Letícia seguia para a UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) a pé na manhã do atropelamento porque a bicicleta estava com o pneu furado. "Ela me mandou mensagem dizendo que o pneu tinha estourado. Foi andando. E esse homem não fez questão nenhuma de parar."

O velório foi, segundo o pai, "um mar de gente". Um ônibus da universidade saiu de Coxim com colegas e professores. "Eles foram uma família para nós", disse Manuel, abraçando uma foto da filha.

A mãe voltou a negar que alguém da administração municipal tenha tentado fazer contato. "Nem a secretária, nem o transporte escolar, nem o prefeito. Ninguém me disse 'meus sentimentos'. Eu perdi minha filha. E perdi por responsabilidade deles."

No fim da entrevista, com a voz embargada, a mãe resumiu o que espera agora. "O Brasil inteiro se comoveu com a Letícia. Só eu sei o que perdi. Eu só quero justiça." O pai repetiu o mesmo pedido. "Esse homem não pode ficar solto. Tirou a minha filha e destruiu a nossa família. E a Prefeitura precisa ser responsabilizada."

Pais de estudante morta por servidor sem CNH acusam prefeitura de negligência
Motorista preso em ocasiaão diferenete, anos antes do crime em Coxim (Foto: Arquivo)

O que diz o prefeito — Pela manhã, o prefeito de Coxim, Edilson Magro (PP), comentou o caso em um programa de rádio e classificou o acidente como fatal e resultado de “irresponsabilidade”. Ele anunciou a abertura de sindicância para apurar responsabilidades dentro da administração municipal e afirmou que qualquer pessoa envolvida poderá responder a processo administrativo. Disse ainda que a frota passa por vistoria do Detran a cada seis meses.

Depois das falas da família, o Campo Grande News voltou a procurá-lo. O prefeito afirmou que não foi ao velório para evitar situações de revolta, mas que enviou um representante da prefeitura para fazer contato com os familiares e que, após o enterro, pretende ver de que forma o município poderá auxiliar. "Estou procurando por eles. Vamos fazer tudo ao nosso alcance."

A versão é contestada pelos pais, que afirmam que nenhum representante apareceu e que não receberam mensagem, ligação ou manifestação oficial.

Pais de estudante morta por servidor sem CNH acusam prefeitura de negligência
Letícia tinha apenas 25 anos, e se formaria em menos de um mês (Foto: Redes sociais)

O caso – O atropelamento aconteceu por volta das 7 horas de quarta-feira (12), na Avenida Mato Grosso do Sul, uma das principais vias de Coxim. Testemunhas relataram que o motorista Cleyton Matos Campos, servidor efetivo da Secretaria Municipal de Educação, dirigia em alta velocidade e na contramão. Ele perdeu o controle, subiu na calçada e atingiu Letícia, que caminhava para a universidade depois que a bicicleta apresentou problema no pneu.

Uma passageira relatou que o motorista demonstrava sono e irritação e chegou a pedir que ela comprasse balas para ajudá-lo a se manter acordado. Após a colisão, ele gritou que tinha matado a jovem.

Cleyton foi preso em flagrante por homicídio doloso. Ele confessou que estava mexendo no celular no momento do acidente, que estava com a CNH vencida há mais de um ano, que se recusou a fazer o teste do bafômetro e que possui passagens anteriores por tráfico de drogas e porte ilegal de arma de fogo.

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