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Comportamento

Após perder tudo para o ex, Maria casou de novo porque "nem todo homem é igual"

Ela teve de deixar família, amigos e casa para trás, viveu 6 meses em um abrigo e vive um recomeço

Alana Portela | 11/06/2019 09:00
Maria hoje tem 27 anos, está em outra fase da vida, porém não pode ser identificada por questão de segurança  (Foto: Henrique Kawaminami)
Maria hoje tem 27 anos, está em outra fase da vida, porém não pode ser identificada por questão de segurança (Foto: Henrique Kawaminami)

“A gente acha que nunca mais vai gostar de ninguém, mas nem todo homem é igual”, diz Maria,  27 anos, que após ser agredida e ameaçada de morte pelo ex-marido, resolveu se casar novamente. Ela morava no interior do Estado, onde viveu com João por 11 anos, contudo, a paixão se transformou em pesadelo quando o então esposo passou a usar drogas. Temendo pela vida, fugiu da cidade e veio parar em um abrigo de mulheres em Campo Grande, onde fez tratamento psicológico, decidiu “abrir” seu coração e reencontrar a felicidade.

“Fiquei seis meses no abrigo, e quando cheguei lá, vi casos horríveis. Fiz acompanhamento e a psicóloga dizia que existem pessoas boas e ruins. Depois que saí do local, morei sozinha com meu filho até conhecer outra pessoa e casar de novo”, conta Maria sobre superar a decepção do primeiro relacionamento e tentar recomeçar sua nova vida.

Maria passou por uma experiência traumática, ficou casada por 11 anos e foi no sexto ano de casamento que começou a violência. Foi um período difícil, e ela veio para em um abrigo de mulheres em Campo Grande. Para entender essa história é preciso retornar ao passado, em 2005.

Maria é uma adolescente simples e estava com cerca de 14 anos quando conheceu João. Naquele tempo, sabia que ele não seria uma pessoa fácil de lidar, era machista, porém estava apaixonada e decidiu arriscar. Como é de praxe, no começo foi tudo às mil maravilhas, até que as coisas mudaram, e o pesadelo estava apenas no início.

Eles tiveram um filho logo no começo do relacionamento, que hoje está entrando na fase pré-adolescente. No sexto ano de casamento, o comportamento de João mudou. “Ficou violento, fazia ameaças, delirava falando que tinha me visto em vários lugares. Passou a sentir mais ciúme, pegava a faca. Fiquei com medo dele”, contou Maria.

A situação foi de mal a pior e, além do medo, teve que dar um jeito para não faltar comida dentro de casa. João, cada dia que passava perdia mais a razão e se afundava nas drogas. "Ele trabalhava como mecânico, mas vendeu tudo de dentro de casa para se drogar. Quando fazia serviços, gastava todo o dinheiro fumando. Não passamos fome porque alguns parentes ajudavam e eu recebia benefício, porém vivia apertada“, lembrou.

Apesar de ver a situação de João, Maria pensava que as coisas poderiam melhorar ou voltar a ser como antes, e continuou casada. Contudo, não demorou muito para que as ameaças fossem além das palavras. “Tava doido, me dava socos e chutes, ofendia e dizia muito palavrão. Tive a certeza de que se continuasse, me mataria porque já ameaça de morte”.

Depois de um tempo, Maria não aguentou mais viver sob ameaças e violência, até que pegou o filho e foi para a casa de seu irmão, que morava na mesma cidade. No entanto, por ser um local com poucos habitantes, João descobriu onde ela estava. “Me separei e fui para lá, mas ele ligou doidão para minha cunhada falando que tinha me visto. Nesse dia, havia ido buscar meu filho no ponto de ônibus, porque a escola era longe. Quando voltei, ela me contou da ligação e logo depois meu ex-marido foi para lá”, recorda.

Ela relata a experiência traumática que viveu ao lado do ex-marido e fala da nova vida (Foto: Henrique Kawaminami)
Ela relata a experiência traumática que viveu ao lado do ex-marido e fala da nova vida (Foto: Henrique Kawaminami)

Ao ver João na porta da casa de sua cunhada, drogado e nervoso, ela se assustou. “Tava bem agitado, às vezes, pensava que tinha gente atrás dele. Eu estava com meu filho, minha cunhada e duas sobrinhas, ele entrou e foi me batendo. Tentou me dar um soco no rosto, mas virei e acertou o meu ombro, chutou minha perna. Meu filho puxava pela camisa dele e pedia para parar”.

“Depois fui para a delegacia, mas o policial disse que papel não iria resolver e nem me salvar. Pediu para eu retornar para a casa e esperar meu ex-marido aparecer por lá, e se isso acontecesse era para sair da frente dele e ligar para polícia”, recorda Maria do momento em que foi pedir ajuda aos oficiais.

Temendo pela vida, ela passou alguns dias na casa da irmã de sua cunhada até conseguir mudar de cidade. “Fiquei uma semana separada, ele continuou me procurando. Mas uma vereadora de lá me ajudou aí que consegui registrar o boletim de ocorrência, e fiz. Entraram em contato com o abrigo daqui e conseguiu uma vaga. Vim só com os documentos, dois pares de roupas e meu filho também, mas falaram que poderia ficar só três meses”, recordou.

Quando chegou no abrigo, a regra de segurança era entregar o celular. “Tínhamos direito a ligação através do telefone fixo da casa, toda semana poderia ligar para alguém. Eles matricularam meu filho na escola que ele continua estudando. Ficamos seis meses lá até sair, mas decidi ficar por aqui mesmo”, afirmou.

Ali permaneceu de outubro de 2016 a março de 2017 e nesse tempo, aproveitou para guardar o dinheiro do benefício que recebe para se reconstruir. Quando saiu do local, decidiu que não retornaria para a cidade natal e conseguiu alugar uma casa em Campo Grande.

As coisas foram se “ajeitando” lentamente. Matriculou o filho em uma escola e recomeçou longe de tudo e todos, sem mesmo ter um familiar por perto para auxiliar. Contudo, a chegada até aqui não foi fácil.

Maria resolveu acreditar no amor novamente e até deu uma corrente de presente ao atual marido (Foto: Henrique Kawaminami)
Maria resolveu acreditar no amor novamente e até deu uma corrente de presente ao atual marido (Foto: Henrique Kawaminami)

Felicidade - Quando estava saindo do abrigo, contou com a ajuda das plantonistas da casa para ter noção de como se transportar por Campo Grande. “Marcaram em um papel qual ônibus devia pegar e depois fui aprendendo sozinha. Sentindo o “gosto” da liberdade depois de tanto tempo, ela fez novas amizades e depois de oito meses, conheceu outro homem e decidiu namorar.

“Nesse dia tinha saído com umas amigas, e encontrei ele em um bar no centro. Começamos a conversar, e em outubro de 2017 decidimos namorar. Mas foi em fevereiro de 2018 que decidimos morar juntos. Sempre conversei muito com meu filho, e meu atual marido sabe do meu passado. Diz que vai me proteger”, destaca.

Segundo ela, o atual marido é diferente do seu ex. “Não sinto medo dele mudar e se tornar agressivo, porque a personalidade dele é outra. Voltei a estudar, quero terminar o ensino médio e fazer um curso. Ele me incentiva”.

Além dela dar continuidade aos estudos, seu esposo também deseja “crescer” ao lado. “Quer entrar na faculdade no ano que vem”, disse. A casa onde moram é pequena, e enquanto o marido trabalho e o filho está no colégio, Maria aproveita para fazer os serviços domésticos e conta com a companhia da sua cachorra “Neguinha”.

A sua vaidade foi recuperada e como forma de agradecimento e prova de amor, ela comprou uma corrente de presente o atual marido, que guarda com muito carinho. Com mais de um ano de casamento, Maria voltou a sorrir e está feliz ao lado do novo companheiro.

Apesar de já ter se passado alguns anos, ela ainda sente medo (Foto: Henrique Kawaminami)
Apesar de já ter se passado alguns anos, ela ainda sente medo (Foto: Henrique Kawaminami)

Medo - Mesmo depois de alguns anos, João ainda pergunta para o irmão de Maria sobre seu paradeiro. No entanto, para evitar que seja encontrada, poucos podem saber onde ela está. Por telefone, ela conversa com o irmão e acredita que não será perturbada pelo ex. “Fiquei sabendo que ele está ‘corrido’ da cidade porque comprou drogas e não pagou. O dinheiro dele é só para isso, se estivesse em outro estado, sem o uso da droga, ficaria com mais medo pois poderia vir aqui. Mas nesse estado acho que não vem”, diz Maria aliviada.

A violência existiu e o medo continua, porém, ela decidiu dar a volta por cima. Confiar novamente não foi uma tarefa fácil, mas é a opção para tentar esquecer o passado e seguir em frente.

Maria e João são nomes fictícios para preservar a identidade da vítima.

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