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Comportamento

Filho volta para casa para consertar sapatos que pai deixou quando morreu

Filho mais novo é o único a seguir o ofício de sapateiro que está na família há gerações, pelos próximos 20 dias ele vai se dedicar a honrar últimos compromissos do pai com clientes

Kimberly Teodoro | 28/10/2018 08:54
Jones veio se despedir do pai e resolveu terminar os trabalhos inacabados para honrar os compromissos de Vicente (Foto: Rhobson Lima/ O Pantaneiro)
Jones veio se despedir do pai e resolveu terminar os trabalhos inacabados para honrar os compromissos de Vicente (Foto: Rhobson Lima/ O Pantaneiro)

"Comércio antigo no Centro de Aquidauana, um prédio bege, meio laranja com um pé de árvore na rua das casas pernambucanas em frente ao pátio da noroeste", é a indicação que por 40 anos levou clientes até a Sapataria Majestade, onde Vicente Montiel Fernandes, conhecido artista dos artigos de couro da cidade trabalhou por quase toda a vida.

Paraguaio naturalizado brasileiro, Vicente e a esposa Estela Espíndola Fernandes chegaram em Mato Grosso do Sul muito novos, prontos para recomeçar a vida em Aquiauana, há 141 quilômetros da capital, terra onde nasceram e foram criados os 6 filhos do casal. Estela foi a primeira a partir, aos 58 anos, enquanto Vicente ficou por aqui até os 73 anos, reinando na sapataria mais antiga da cidade.

Quem conta a história deles é o filho mais novo entre os homens, Jones Espíndola Fernandes, que mora em Cuiabá, Mato Grosso, mas acabou de voltar para casa para se despedir do pai e resolver as "pendências" na loja em que aprendeu o ofício e a arte de consertar sapatos, malas, cintos e tudo que fosse importante o suficiente para que as pessoas queiram preservar,  no lugar de simplesmente substituir, como é hábito comum hoje.

Primeira foto tirada da Sapataria Majestade, que esteve por 40 anos no mesmo endereço (Foto: Rhobson Lima/ O Pantaneiro)
Primeira foto tirada da Sapataria Majestade, que esteve por 40 anos no mesmo endereço (Foto: Rhobson Lima/ O Pantaneiro)

Profissão que na família Montiel Fernandes é antiga, tanto o pai quanto o avô de Jones dividiam o talento para a sapataria, do qual hoje ele é o único representante.  Para ele, cada item recuperado leva um pouco da técnica e da história do artesão depois de reformado, uma técnica que precisa de muita dedicação e prática até ser desenvolvida e ganhar qualidade. 

Mesmo depois da despedida de Vicente a sapataria ainda ficará de portas abertas pelos próximos 20 dias, tempo que Jones julga necessário para terminar os serviços começados pelo pai, que por ser um homem forte e bem disposto trabalhou até os últimos dias no comércio ao qual dedicou parte da vida, sem imaginar que a "morte viesse tão de repente".

"Vou ficar para a sapataria não fechar assim de pronto e definitivo, os clientes que conheciam e confiavam nele não podem ficar no prejuízo. É importância é para que as pessoas não sejam lesadas, essa é a conduta que meu pai meu ensinou e eu vim pra honrar esse último compromisso", explica Jones.

Vicente deixou ensinamentos, que para Jones valem muito mais que os equipamentos e o prédio bege-alaranjado do centro, "Ele sempre foi um homem tranquilo e nos criou com exemplos, para cada filho ele deixou a boa educação, a honestidade e moral. Para mim ele ensinou também o ofício, que vai continuar na família até eu passar adiante ou morrer".

Para Jones que ficou longe da cidade por algum tempo, cada canto lembra um pouco do pai, que deixou na memória dos filhos a imagem de "herói, criador, figura amorosa e protetora, capaz de vencer o mundo", mas que ali, na sapataria em que passava a maior parte do tempo, mesmo depois de aposentado é como se presença dele fosse ainda mais forte, ali as paredes de madeira, as máquinas pesadas de costurar couro e até as peças por terminar ainda se lembram Vicente. Assim como a rua, os vizinhos e os clientes, que ainda por muito tempo vão guargar com carinho a memória do artista.

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Profissão cada vez mais rara, Jones aprendeu o que sabe com o pai (Foto: Rhobson Lima/ O Pantaneiro)
Profissão cada vez mais rara, Jones aprendeu o que sabe com o pai (Foto: Rhobson Lima/ O Pantaneiro)
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