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Comportamento

Há 37 anos, Vitor leva carreirão e reclama que é difícil viver do Jogo do Bicho

Aos trancos e barrancos na contravenção, o bicheiro não se incomoda de dar entrevista

Alana Portela | 12/06/2019 07:38
Sentado em sua banca e ouvindo música no rádio, o bicheiro espera pelos clientes (Foto: Henrique Kawaminami)
Sentado em sua banca e ouvindo música no rádio, o bicheiro espera pelos clientes (Foto: Henrique Kawaminami)

Se já é difícil para quem trabalha de forma legal, imagina para quem vende Jogo do Bicho. Nessa área, tem que ficar atento, com um olho na polícia e outro nas apostas. Apesar de a vista grossa tolerar o jogo de azar que virou tradição no Brasil, Vitor Almeida garante que há 37 anos é complicado trabalhar, mas não muda de ramo e hoje é um dos personagens do Centro de Campo Grande.

Ele está em uma banca pequena e discreta, uma das poucas hoje pela região. Tem clientela fiel e vive sossegado. Porém, quem o vê tranquilo nem imagina os “carreirões” que leva. “De vez em quando, o bicho pega e eles vêm no pé da gente. Já sofri muito. Já levei muito carreirão. Imagina você correr da polícia por estar trabalhando, é o fim do mundo, só no Brasil mesmo”, protesta Vitor.

Apesar dos pesares, o trabalhador do Bicho diz que poderia ser pior. “Sei que o jogo é uma contravenção, mas ainda bem que não tem formação de quadrilha, como em outros estados, onde ocorre briga por ponto”, complementa.

Ele tem 62 anos e conta que o Jogo do Bicho entrou em sua vida em 1982, quando montou uma lanchonete no Centro da Capital. Contudo, por conta de maus pagadores, resolveu fechar o estabelecimento depois de dez anos e investir apenas nas apostas. “Inventei de vender fiado, aí não me pagaram. Quebrei por conta de três mil reais e vendi o ponto. As contas chegam a cada 30 dias, e nesse tempo já mexia com o jogo lá dentro, e continuei.”

Após fechar a lanchonete, Vitor pegou um banquinho e sentou-se embaixo de uma sombra para vender as apostas, porém, sabia do risco de ser preso caso a polícia o pegasse e permanecia atento. “Ficava sentado, com o olho na polícia e outro no trabalho. Consegui uma banca e continuo aqui tranquilo. Meus fregueses vêm fazer o jogo”, comenta.

Vitor comenta que tem uma filha e que sempre pagou a sua pensão alimentícia graças as apostas. “Vivendo disso, paguei a pensão dela durante 14 anos, sem atrasar um dia. Era tão direito que nem recibo eu pegava, mas em 2011 acabou, e hoje vivo sossegado”, afirmou.

Após a compra, o vendedor imprime o comprovante da aposta (Foto: Henrique Kawaminami)
Após a compra, o vendedor imprime o comprovante da aposta (Foto: Henrique Kawaminami)

No Centro, o bicheiro trabalha de domingo a domingo, entra às 9h e sai às 18h, a rotina é um tanto cansativa, mas é Vitor quem faz seus horários. Mora a poucos metros do serviço e no local, além do Jogo do Bicho, também tem título de capitalização para vendas.

Com uma garrafa, onde guarda a água para passar o dia, ele sai da casa e vai para o trabalho. Chegando ao local, abre as janelas e sentado aguarda os clientes chegarem. Sobre uma pequena mesa dentro da barraca fica um tablet, maquininha de impressão de comprovantes e caderno para anotações. Enquanto espera, liga um radinho velho para ouvir música.

“Isso aqui é minha diversão. Chego e fico ouvindo meus flashbacks no rádio. As vendas variam muito, tem dia que ganha bem, outro nem tanto. Daqui não tenho o que reclamar. Alguns clientes ligam e fazem apostas por telefone, depois vem e pagam”, relata.

Se dar mal - O vendedor afirma que para trabalhar nessa área é preciso ser honesto, ou a pessoa pode se dar mal. “Não pode errar, tem que ser 101% honesto e não mexer no que é dos outros. São três caixinhas para ter vida longa, a do apostador, do banqueiro e a sua. Aqui aprende a ser homem de verdade e respeitar a hierarquia”, destaca.

Desde criança, ele aprendeu a se virar para conseguir alguma coisa na vida. “Quando tinha 8 anos comecei trabalhar, fui para açougue, virei doméstico, carreguei malas e até engraxei sapatos. Nunca pedi nada para os outros. Hoje vejo um mundo de ostentação, ninguém quer nada de dureza”.

Ilegal - As vendas das apostas do Jogo do Bicho são ilegais, e rendem de um a 4 anos de prisão, além de multa. Apesar de ser ilegal, ainda existem loterias clandestinas espalhadas pela Capital.

Para quem não conhece, o jogo associa 1 número para cada um dos 25 animais diferentes.  No ano passado, o jogo se modernizou e as apostas passaram agora podem ser feitas de forma online.

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O bicheiro trabalha de domingo a domingo no centro da Capital  (Foto: Henrique Kawaminami)
O bicheiro trabalha de domingo a domingo no centro da Capital (Foto: Henrique Kawaminami)
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