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Comportamento

João e Maria, da fábula ao asilo e o pedido: Quando estiver triste, venha me ver

Alberto Dias | 21/12/2015 14:00
Alberto com João, em um dia de descobertas sobre a velhice.
Alberto com João, em um dia de descobertas sobre a velhice.

Quando perguntei seu nome, ele disse que era difícil e iria soletrar. Pedi, então, para falar alto e devagar. Ele o fez: - "Meu no-me é Jo-ão!" E com a primeira gargalhada iniciei um longo papo com aquele senhor bem humorado, de 75 anos, com cara de 63.

Logo ele revelou que o placar em 2015 era de 3 a 1. E os homens estavam ganhando! Apenas um morrera, contra três mulheres eliminadas daquele asilo na gincana da vida. Ah seu João! Ao final, pediu que quando eu estivesse triste fosse visitá-lo! Pensei no contrassenso daquela frase e percebi que o jovem ali talvez não fosse bem eu.

Minutos antes, enquanto ouvia uma moda de viola, avistei aquela senhorinha, digo, aquela moça bonita, sozinha, e lá me acheguei. Ainda vaidosa, usava tiara e pulseira de pérolas. Ah, e um par de brincos que ganhou de um visitante que nunca mais voltou, mas que ela ainda aguarda.

Essa delicadeza combina com seu lindo nome. Maria do Rosário. Filha de espanhóis, fez que não entendeu quando perguntei sua idade. Mas logo ressaltou uma peculiaridade espantosa: ela nunca se casara!

Maria do Rosário não teve marido, filhos... nada disso. Por isso estava ali, no asilo, havia cinco anos. O engraçado é que João confirmou minhas suspeitas. Maria era lindíssima quando jovem! Depois ela contou que havia vários rapazes querendo levá-la ao altar. “Mas botei todos pra correr!”, disse, sem explicar o porquê.

Pensei apenas: “Vai entender!”. E agora pergunto: “Entender o quê?”, se essa é a beleza da vida, emoldurada na diversidade, onde cada um é único, nada é por acaso, e cada história é uma história.

João e Maria eram quase vizinhos, aqui mesmo em Três Lagoas, região em que nasceram. Poderiam ter se casado, tido filhos, netos, e não estarem ali hoje. Mas não foi assim que o destino desenhou e nem vamos questioná-lo.

O fato, é que houve uma triste unanimidade em todos os diálogos. Ninguém ali gostava de estar no asilo. O lugar era bonito, verde e aparentemente bem cuidado. O que ninguém gosta mesmo é de sentir-se abandonado, esquecido. Talvez por isso a segunda unanimidade tenha sido a alegria em receber visitas.

Dona Maria não teve filhos, enquanto seu João teve três! Isso prova que a solidão na velhice não cumpre regras ou modelos. Seu João, desde que perdeu a esposa se viu sozinho. “Minha filha disse que vem me pegar no Natal, mas não sei”, desabafou.

Donas Marias, solitárias, existem tantas quantas por aí? Então, que tal dedicar um tempinho para contar histórias, ouvir “causos”, plantar um sorriso e receber amor? Se doar de verdade, perceber outras realidades, mais duras que a sua. E fazer a diferença, por algumas horas, para alguém que já atravessou o mar da vida. Aplaudindo e aprendendo, enquanto eles se aproximam da linha de chegada.

* Alberto Dias é jornalista, assessor de imprensa da Petrobras e por isso hoje vive em Três Lagoas.

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