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Comportamento

Na periferia, criançada que ganha só um brinquedo por ano aprende a se virar

Ângela Kempfer e Viviane Oliveira | 24/12/2012 07:53
Thaís e Luana brincam com flores de plástico. (Fotos: Luciano Muta)
Thaís e Luana brincam com flores de plástico. (Fotos: Luciano Muta)

Não tem dinheiro para comprar, então o jeito é esperar aquelas doações feitas por entidades no Natal. Nos bairros mais pobres de Campo Grande, é sempre assim para as crianças, que já sabem: brinquedo tem de durar um ano, pelo menos.

Alguns já criaram até regras para “economizar” o que ganharam com tanto sacrifício. “Acha que ficar naquelas filas de entrega de presente é fácil. Não é não. Ficamos mais de 4 horas em pé, para ganhar uma bonequinha”, conta a avó Tânia, de 52 anos.

Por isso as duas netas da diarista cresceram com a lição de o que é conquistado com sacrifício tem de ser bem cuidado. Por isso, a brincadeira mesmo é na base da imaginação.

A neta Thaís, de 8 anos, passa a manhã de uma sexta-feira no bairro Lajeado fazendo arranjos de flores com a amiga Luana, de 7. As duas, sentadas em uma mesinha de madeira, rodeadas por flores de plástico, criam uma cena linda na paisagem de terra de uma das regiões mais pobres da cidade.

As rosas de plástico foram dadas pela patroa de Tânia, que trocou os arranjos de casa, e viraram a diversão das meninas. Elas refazem cada uma delas, colocam no cabelo, transformam em buque e assim a brincadeira segue por horas sob uma grande árvore.

Neste ano, as duas foram exemplares na escola, uma já aprovada para o 4º ano e a outra pronta para o 3º. Mas os únicos presentes possíveis foram uma boneca para Thaís e um conjuntinho de panelas para Luana, ambos bem guardados em casa.

Os amigos Talison e Guilherme gostam mesmo de jogar bolas de gude para economizar os brinquedos.
Os amigos Talison e Guilherme gostam mesmo de jogar bolas de gude para economizar os brinquedos.

Nas ruas do mesmo bairro, a diversão da gurizada é jogar bolinha de gude. Guilherme Henrique, 8 anos, ganhou no Natal passado um carrinho de controle remoto, mas tem tanto ciúme do brinquedo que também o deixa em casa.

“Eu brinco com ele todos os dias, mas quando tô sozinho”, lembra. O menino prefere jogar bolita com os amigos da rua Seiko Yonamine a gastar o brinquedo. “De bolita brinca todo mundo da rua e é mais divertido”, argumenta.

O amigo, Talison Tiago, 9 anos, também só conseguiu dois carrinhos no período, porque no final do ano passado enfrentou a fila do sopão. Tem um de corrida e uma caçamba, ambos dentro de casa, longe da turminha da rua, muito bem conservados, parecendo novos ainda.

“Só brinco com ele no domingo ou quando estou sozinho em casa. É pouco brinquedo para muita gente”, diz se referindo aos colegas que se reúnem na rua e passam tardes animadas sempre no torneio das bolinhas de gude.

Os carros novinhos de Talison, presentes do ano passado.
Os carros novinhos de Talison, presentes do ano passado.
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