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Comportamento

Francisco, o primeiro camelô de Campo Grande, ainda está na ativa

Ângela Kempfer | 11/04/2012 11:12
Chiquinho e o chá emagrecedor à venda. (Fotos: João Garrigó)
Chiquinho e o chá emagrecedor à venda. (Fotos: João Garrigó)

Ele não tem dúvidas, reivindica para si o título de primeiro camelô das ruas de Campo Grande. Há 50 anos, Francisco Honorato já vendia “muamba” na rua 14 de Julho. Junto com meias e outras peças de roupa, ele começou vendendo, inclusive, frutas e alho pelo Centro da cidade.

Depois, com a “modernidade”, passou a oferecer óculos, pilhas... de tudo um pouco. “Fui o primeiro nas ruas e não conheço mais ninguém daqueles tempos que continua como camelô assim, ao ar livre”, garante. "Até quando chove eu fico aqui".

Há 14 anos, quando o Camelódromo foi inaugurado em Campo Grande, ele diz nem ter cogitado a possibilidade de “ficar confinado”. Preferiu mudar de endereço, ficar mais “escondidinho” e mudou da 14 para os arredores da Santa Casa.

Aos 74 anos, Francisco lembra do tempo que se foi e das dificuldades de quem optou por continuar na rotina de leva e busca o carrinho montado todos os dias, faça chuva ou faça sol, desde que tinha 24 anos.

“Trabalho não me dá medo não. O problema é que as coisas mudaram muito e isso aqui não dá mais dinheiro. As pessoas não têm mais dinheiro”, reclama.

Hoje, na esquina da avenida Mato Grosso com a Rui Barbosa, “Chiquinho” vende só ervas, não tem mais produtos como antigamente, mora em um quarto no Centro e o serviço parece mais um passatempo. “Quase não vendo mais nada”, conta. O sustento vem mesmo de um auxílio doença que conquistou depois de 9 anos tentando.

“Tenho essa perna (a esquerda) 20 centímetros menor do que a outra, parece que ninguém conseguia ver e só consegui o auxílio porque conheço gente importante. Mas é auxílio, posso perder a qualquer momento.”

Hoje a banca só vende ervas, perto da Santa Casa.
Hoje a banca só vende ervas, perto da Santa Casa.

Com 1,30 metro de altura aproximadamente (ele não sabe dizer ao certo), o senhor baixinho, quase sem dentes, começa a conversa com ar desconfiado, mas logo se solta e vai falando da vida.

Pergunto onde nasceu e ele tem de recorrer à Carteira de Identidade para lembrar. “Agora deu branco, espera aí”, diz ao retirar o documento do bolso. Nasceu em Assaré (CE) e veio ainda criança para Mato Grosso do Sul com os pais e os 5 irmãos. “A viagem durou 22 dias, acredita. Isso até Dourados”.

Na região Sul, trabalhou em fazendas com a família, depois todos se mudaram para Rochedo, até que resolveu tentar ganhar dinheiro em Campo Grande. “Quando a gente começou na roça, as fazendas tinham até 40 famílias trabalhando. Depois a coisa começou a miar e hoje tem uma só e olhe lá”, justifica.

Ele diz que já teve carro, casou duas vezes, mas nada restou. “Separei, não tive filho e meu carro fundiu o motor. Não tenho nada, só a minha banca”.

Das épocas de 14 de Julho, o que mais lembra é do “quebra-pau” nos anos 90, quando a prefeitura resolveu acabar com os ambulantes nas ruas do Centro e transferir todos para o Camelódromo.

“Cheguei a quebrar cabo de vassoura no lombo de fotógrafo que ia até lá só para falar mal da gente. Era complicado, mas eu colocava todo mundo para correr”, lembra.

Quando iniciou na lida ambulante, ele diz que a Barão do Rio Branco era o ponto preferido. “Era lotado de camelôs”.

Agora, com a banca pequena, sente falta do tempo em que acreditava que poderia melhorar a vida. “Comecei quando as pessoas ainda ficavam ricas trabalhando. Hoje isso é impossível. Sempre pensei que poderia viver melhor, mas me enganei. Hoje vivo assim porque não sei mais viver de outro jeito”, conclui.

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