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Diversão

Na oficina de radiadores, matamos saudades do que um dia foi o Farol e o Stones

Naiane Mesquita | 19/08/2015 06:12
Na oficina de radiadores, matamos saudades do que um dia foi o Farol e o Stones

O palco já foi tomado por rock stars, porém, há mais de dez anos, quem comanda o som são os motores de carros e radiadores. Seguindo a trilha dos bares que desapareceram do mapa, mas permanecem vivos na lembrança dos campo-grandenses, nossa segunda parada é o número 2114, da avenida Ceará.

Olhando de longe, os tijolinhos à vista dificilmente indicam que aquele lugar quase inóspito foi a segunda casa de uma juventude inquieta. O palco agora é o escritório da Radicar Radiadores e os pneus empilhados ocupam os lugares das mesas, cadeiras e do público, que deixava o preconceito de lado e pulava fácil o bom e velho rock’n’roll. Para quem ainda não adivinhou, o Lado B conta: estamos no Farol e Stones. Sim, os dois, porque ambos funcionaram no mesmo local.

Eloy olha para o local onde antes ficava o palco do Stones; Hoje o espaço é um escritório (Foto: Vanessa Tamires)
Eloy olha para o local onde antes ficava o palco do Stones; Hoje o espaço é um escritório (Foto: Vanessa Tamires)
A vista de cima do palco do Stones (Foto: Arquivo/Eloy Paulucci)
A vista de cima do palco do Stones (Foto: Arquivo/Eloy Paulucci)

Dono de um som profissional que fez a festa de muitos bares e shows na cidade, o músico Eloy Paulucci, 43 anos, relembra que a primeira vez que pisou no endereço ele ainda era chamado de Farol. “Era um barzinho, começou a ter Blues Band no domingo. O Farol deve ter funcionado até 1995, eu não lembro direito quando que eu comecei a locar o som para o Stones. Mas, eu acho que era em 1996, então o Farol é mais antigo. No Farol eu vinha para curtir, não para trabalhar”, brinca.

No Farol, onde o blues corria solto, surgiu o primeiro embrião de O Bando do Velho Jack e Bêbados Habilidosos. “A Blues Band sempre tocava no Farol. Na época, o Fabinho Brum, o Batata e o Bosco, que não era baterista da Blues Band, montaram o Jack Daniels. Depois que a Blues Band tocava eles anunciavam que agora ia ter a canja do Jack Daniels. Aí saia do palco o Renatão finado, o Edinei baterista e ai entrava o Batata, no vocal e o Bosco na bateria. O Renatão não gostou que os companheiros dele tocassem rock e acabou rolando essa dissidência, da onde surgiu o Bêbados e O Bando”, relembra.

A divisão abençoada que acabou dando origem às duas maiores bandas do blues e rock de Campo Grande surgiu nesse barzinho histórico. “Era legal, mas acabava meia noite. Sentava todo mundo no meio fio, indignado, porque a gente não queria dormir, não queria ir para casa”, explica. Os dias de maior sucesso eram aos domingos, quando a Blues Band tocava. “Não lembro o nome do dono do Farol, sei que era um gaúcho”, puxa na memória.

Mas, ao contrário, a dona do Stones é difícil de esquecer. Proprietária de vários points da Capital, Maria de Fátima Menas, 43 anos, comandou o bar, além dos antigos Usina e Café Moinho. Ela lembra que o Stones abriu em 1996 e fechou em 2004. “Depois eu abri o Usina de 2004 a 2007, em frente ao Shopping Campo Grande e depois o Café Moinho até 2009. Paralelamente, eu tocava o Barfly desde 2008”, pontua.

Na época em que não as máquinas digitais não eram muito populares, não tinha como adivinhar o jeito que a foto saia (Foto: Arquivo pessoal/ Eloy  Paulucci)
Na época em que não as máquinas digitais não eram muito populares, não tinha como adivinhar o jeito que a foto saia (Foto: Arquivo pessoal/ Eloy Paulucci)

No Stones, Eloy lembra que todas as tribos se encontravam. “Não vinha só o pessoal do rock. Era modinha, tem gente que nem está curtindo muita banda mas vem, que nem alguns que vão ao Blues Bar atualmente. No domingo, enchia de playboyzada e o pessoal do Grass sempre foi muito boca aberta. Eles resolveram falar mal dos playboys no microfone e levaram uma surra depois. Teve um integrante da banda que quebrou a clavícula e outro que até resolveu aprender artes marciais depois da briga”, ri Eloy.

Quem defendia o Stones na época era o segurança da casa, que Eloy lembra só pelo primeiro nome, Ricardo. Como na esquina era um ponto de venda de droga era comum que os traficantes ficassem pela redondeza.

“Tinha vários traficantes na rua, eles tem um esquema que sempre estão limpos quando a polícia chega, enfim, você nunca pegava os caras. Tinha um traficante que chamava Lauriano, ele era famosinho. A gente saia ficava para o lado de fora, para conversar, a galera na calçada e esse Lauriano encostou do lado do Ricardo. Ficou falando e esse kung fu, provocando, e resolveu tirar um revólver da roupa. Na hora todo mundo afastou, mas nesse milésimo de segundo, ele conseguiu desarmar o traficante”, relembra.

O segurança que segundo Eloy “treinou no Iraque” tinha fama de ser o melhor. “Só sei que ele pegou o revólver e devolveu para o traficante, dando uma dura, dizendo que ele iria acabar machucando alguém. O Lauriano saiu de boa, dizendo que ele ‘não sabia brincar’”.

Do banheiro que não era muito limpo e organizado até a cachaça Gabriela, que deu nome até para filha de fã do bar, o Stones se consagrou como o lugar onde todo mundo virava a noite durante a semana e em pleno domingo. “Aquele vazio que o Farol deixava de meia noite acabar, com o Stones foi diferente. Eu ficava pensando como esse povo consegue ficar aqui até de madrugada, 4h, 5h da manhã se tinha que trabalhar no outro dia. Eu tinha o som, minha vida era noturna mesmo, mas e esse povo trabalhava com o que?”, questiona até hoje Eloy.

De show histórico, ele cita Led Zeppelin Cover, Rush e até o início dos Muchileiros, que na época eram os Clandestinos. “As pessoas se vestiam do jeito que quisessem. Tinha gente que vinha de roupa de formatura, saia da festa e aparecia no bar, já outros usavam chinelo. Não tinha muita frescura”, acredita.

Para finalizar, quem tinha fome depois de horas de show era só atravessar a rua e comer um lanche do Ary. "Era aquele esquema toscão. Hot dog e X-salada". 

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