"Tem muito cimento na cidade", diz biólogo sobre queda de árvores na Capital
Falta de espaço, drenagem ineficiente e podas para preservar fios de energia são outros fatores
Primeiro o som do vento e depois o barulho de galhos retorcendo, para quatro árvores aparentemente sadias irem abaixo.
RESUMO
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Quatro árvores aparentemente saudáveis caíram na tarde desta segunda-feira (17) no Bairro Bela Vista, em Campo Grande, durante ventos que atingiram 48,6 km/h. No mesmo dia, no Bairro Santa Fé, uma árvore derrubou a rede elétrica de uma clínica médica, forçando o cancelamento de consultas. Segundo o Corpo de Bombeiros, foram registradas oito quedas de árvores na capital. O biólogo Arnildo Pott, doutor em Ecologia Vegetal, explica que o principal problema é a urbanização acelerada: o excesso de cimento nas calçadas "enforca" as árvores, limitando o espaço para as raízes e causando lesões que facilitam a entrada de fungos. Outros fatores como podas inadequadas, sistemas de drenagem ineficientes e períodos de seca também contribuem para o enfraquecimento das árvores urbanas.
Assim descreve o aposentado Alex Leite de Melo sobre o que aconteceu por volta das 16h desta segunda-feira (17) na Rua Domingos Marquês, do tranquilo Bairro Bela Vista de Campo Grande.
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Dos seus 77 anos, 23 foram vividos na mesma casa onde ele estava naquele momento. “Eu nunca vi isso aqui. Nem o vizinho que mora há 40 anos viu”, falou.
Em outro ponto da cidade, no Bairro Santa Fé, pacientes tiveram consulta desmarcada após árvore de médio porte cair e derrubar a eletricidade em clínica médica. "Simplesmente caiu em cima dos fios. Ficamos sem luz até 18h58", contou o recepcionista.
O vento na área urbana da Capital chegou a 48,6 km/h no dia, segundo dados do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia). Nessa velocidade, ele é “vento fresco ou meio forte” de acordo com a classificação da Escala Modificada de Beaufort, uma das referências da meteorologia. Esse nível pode sacudir os galhos maiores das árvores. Se ultrapassasse os 52 km/h, poderia movimentar o tronco delas, também segundo a escala.
Por que tantas quedas? - Somente na segunda-feira, oito árvores caíram em Campo Grande, pelas contas do Corpo de Bombeiros. As quedas têm virado rotina diante dos efeitos das mudanças climáticas.

Biológo e doutor em Ecologia Vegetal, Arnildo Pott explica qual a principal causa que, somada às condições atmosféricas, faz as árvores caírem antes de completarem seu ciclo natural. "Tem muito cimento na cidade", resume.
A árvore fica fragilizada por falta de espaço para as raízes e principalmente por lesões na base do caule, em consequência de cimento da calçada e meio-fio que a 'enforca'. Ela pode parecer sadia, mas está com fungos que entram por essas lesões na casca e pela poda", detalha.
Isso vale para Campo Grande e outros centros urbanos que cresceram de forma acelerada. Arnildo, que é autoridade em botânica na Capital e já viajou o mundo estudando o assunto, diz que a urbanização acaba roubando a liberdade que as raízes de algumas espécies precisam para se expandir, buscar água e nutrientes no solo.
A maior parte das árvores que caíram estavam "enforcadas, estressadas e inflamadas" pela permeabilização, suspeita o biólogo. Há muitas outras nessa mesma situação ainda em pé.
Ele dá o exemplo de um jatobá antigo que acompanhou: foi plantado quando não havia cidade grande ao redor, depois, virou mais uma vítima de um temporal.
Já as árvores plantadas em praças e parques acabam ficando mais protegidas. "Não fiquei sabendo de nenhuma árvore caída no Parque das Nações Indígenas, por exemplo", compara.
As podas para galhos não enroscarem nos fios de energia e telefonia também prejudicam árvores. O ideal seria que os fios fossem enterrados, como foi feito na Rua 14 de Julho durante as obras de revitalização, diz Arnildo.
Elas perdem seu equilíbrio. É pelo corte que podem entrar fungos e cupins. Fica uma lesão que a árvore não consegue cicatrizar totalmente. Ela pode até rebrotar, mas são galhos sempre mais fracos que os anteriores, que podem quebrar", continua.

Sistemas de drenagem ineficientes também colaboram com a queda. Se há alagamentos ou se o solo não absorve satisfatoriamente a água da chuva, as árvores também são afetadas, adoecendo. O mesmo vale para períodos prolongados de seca. "Tanto o excesso ou a falta de água interferem na saúde da árvore", acrescenta o biólogo.
Até cortar a grama ou deixar de retirar uma estaca que protegeu mudas por certo período, pode ser nocivo para as árvores. Um porque fere a casca com a lâmina de cortar e deixa a árvore mais vulnerável ao adoecimento. O outro porque o ferro, madeira ou qualquer outro suporte pode acabar entrando no caule durante o crescimento.
Monitoramento - A reportagem questionou a Prefeitura de Campo Grande se possui um levantamento de quantas árvores caíram ou foram desgalhadas durante os temporais de 2024 e deste ano. A resposta foi que não há esses dados.
Outra pergunta foi se é feita avaliação de risco das árvores em períodos chuvosos. A nota abaixo foi enviada como retorno.
"A Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Gestão Urbana e Desenvolvimento Econômico, Turístico e Sustentável informa que realiza o monitoramento periódico das árvores da cidade e atua preventivamente sempre que é identificado um risco acima do aceitável. Caso o munícipe perceba sinais de alteração em uma árvore, como partes secas, inclinação repentina ou danos no solo ao redor, é recomendável abrir uma solicitação para avaliação.
Durante eventos climáticos extremos, como chuvas intensas e ventos fortes, a previsão do comportamento das árvores torna-se mais complexa. A Semades alerta que, nessas situações, até mesmo árvores aparentemente sadias podem cair, enquanto outras em condições menos favoráveis podem permanecer intactas. Fatores como a velocidade do vento, podas anteriores, estabilidade do solo e a presença de edificações próximas podem influenciar esses eventos. A participação da população no acompanhamento da condição das árvores em seu entorno é fundamental para a segurança e a preservação da arborização urbana", encerra a nota.
Matéria editada às 7h10 de 19 de março para acrescentar nota da prefeitura.
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