MPF investiga suspeita de sequestro e abuso de jovem indígena na Fazenda Ipuitã
Relato em inquérito aponta seguranças armados como autores e teria desencadeado invasão e incêndio na sede
O Ministério Público Federal em Dourados abriu inquérito para apurar a denúncia de que adolescente Guarani e Kaiowá, de 17 anos, teria sido sequestrada e submetida a abusos por seguranças da Fazenda Ipuitã, área sobreposta à Terra Indígena Guyraroká, em Caarapó (MS).
RESUMO
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O Ministério Público Federal em Dourados investiga denúncia de sequestro e abuso de uma adolescente Guarani e Kaiowá, de 17 anos, por seguranças da Fazenda Ipuitã, em Caarapó (MS). O caso foi classificado como grave pelo procurador Marco Antônio Delfino e teria motivado a invasão da sede da fazenda por indígenas. O incidente ocorreu durante uma caçada de javalis, quando a jovem foi abordada por homens armados e mascarados. Após confronto entre indígenas e seguranças, a sede da fazenda foi incendiada. A propriedade, de 4.300 hectares, pertence a Luísa Oliveira, residente em São Paulo, e está sob investigação do MPF.
O caso, classificado como “grave” pelo procurador da República Marco Antônio Delfino, teria sido o estopim para a invasão da sede da fazenda por indígenas e o incêndio de casas e estruturas do local no último sábado (25).
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“Estamos falando em perícia, sim. A menina já foi ouvida, mas a escuta inicial não foi feita da forma adequada. Agora o caso seguirá para escuta especializada, com acompanhamento técnico, porque é preciso garantir a forma correta de oitiva”, disse Delfino ao Campo Grande News.
O procurador descreveu o relato da vítima como “crível”, apontando para “cárcere privado de curta duração” e “atos libidinosos” praticados pelos supostos autores, identificados como seguranças da fazenda.
“Até onde sabemos, a fazenda é arrendada. Recebemos essa informação do próprio deputado (estadual) Zé Teixeira (PSDB). O proprietário seria família de Sorocaba, mas a área está arrendada, e ainda precisamos identificar o responsável direto pela contratação dos seguranças”, afirmou.
As suspeitas foram tema também do encontro no último fim de semana de autoridades locais com a comitiva interministerial coordenada pelo diretor do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Agrários do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Leador Machado, da qual o deputado Zé Teixeira, dono da Fazenda Santa Claudina, sobreposta a área que os Guarani-Kaiowá reivindicam, em Caarapó.
Em entrevista ao Campo Grande News, a advogada Luana Ruiz Silva, defensora dos proprietários da Fazenda Ipuitã, afirmou que a área, de 4.300 hectares, pertence a Luísa Oliveira, residente em São Paulo, e é representada por Daniel de Oliveira, da mesma família.
O MPF quer ouvir os donos apontados pelos documentos e, depois, os supostos arrendatários para então identificar os seguranças e esclarecer as suspeitas.
Segundo o MPF, o inquérito apura duas frentes: o sequestro e o abuso sexual da jovem, e os episódios de violência que se seguiram à invasão da fazenda. “Diferentemente de outros casos, o Ministério Público Federal instaurou o inquérito para apurar tanto o sequestro quanto o suposto estupro”, disse Delfino.
Caçada de javali e tiroteio
De acordo com relatório divulgado na assembleia realizada no fim de semana passado pelos indígenas, o sequestro ocorreu na madrugada de sábado (25), quando a jovem saiu com familiares para caçar javalis em uma área de brejo próxima à sede da fazenda Ipuitã. O grupo se separou para cercar o animal e, pouco depois, percebeu o desaparecimento da adolescente.
Familiares relataram ter ouvido o barulho de um motor e visto uma caminhonete branca, modelo Hilux, deixando o local em alta velocidade. Ao tentarem resgatar a jovem, os indígenas contaram ter enfrentado homens encapuzados, vestidos de preto e armados, que teriam disparado contra o grupo.
Um dos indígenas que teria seguiu a caminhonete encontrou a jovem chorando sob uma mangueira na sede da fazenda, momento em que, segundos os relatos, teria sido alvo de quatro disparos, sem ser atingido.
Outros indígenas chegaram logo depois e também teriam sido recebidos a tiros pelos seguranças. O fogo em um bambuzal próximo gerou explosões que simulavam disparos, levando os homens não indígenas a fugirem em uma caminhonete — um deles atirando da carroceria com uma arma calibre 22.
Suspeitas de abuso
A adolescente relatou a familiares que foi abordada por um homem mascarado e armado, que perguntou quem era a liderança da comunidade. Ele a teria apalpado e forçado a entrar na caminhonete branca, onde havia outros quatro homens vestidos de preto. Segundo o relato, suas mãos foram amarradas e, envergonhada, a jovem ainda não conseguiu descrever em detalhes o que sofreu.
Dentro da fazenda, ela foi deixada desamarrada sob uma árvore. “ A escuta especializada vai ser essencial para confirmar o que aconteceu e identificar os agressores”, disse o procurador Delfino.
O Cimi afirma que a violência contra a adolescente e a omissão das autoridades foram os fatores determinantes para a invasão da fazenda. “Na tentativa de recuperar a jovem, os Guarani e Kaiowá enfrentaram homens armados e permaneceram na sede para impedir a volta do bando até a chegada da Força Nacional de Segurança Pública”, informou a entidade.
Incêndios e fuga dos seguranças
Após o confronto, os indígenas tentaram conter o incêndio que se espalhou pela sede, usando paus, terra e água de uma caixa d’água, mas sem sucesso. O fogo, segundo o relatório, teria começado no bambuzal, propagado pelo vento. Os Guarani e Kaiowá afirmam que não pretendiam destruir a fazenda, mas impedir o retorno dos homens armados.
Eles dizem ainda que a sede era usada por seguranças privados e por policiais do DOF, da PM e da Polícia Civil, e servia de base para vigilância com drones sobre as aldeias. Após a chegada das forças estaduais, e temendo nova ação policial violenta, os indígenas deixaram o local mediante intermediação da Força Nacional.
 



 


 
 
 
 
