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Comportamento

Depois da maternidade, a gente nunca mais consegue ler um livro ou ver um filme

Esta coluna se destina a ser mais um desabafo do que ditar regras e dicas, até porque eu ainda não sei nada sobre ser mãe

Paula Maciulevicius Brasil | 26/01/2020 09:38
História de um casamento está na Netflix.
História de um casamento está na Netflix.

É pegar o controle da TV ou abrir um livro que alguém me chama ou toma o que estiver na minha mão mesmo. Quem é mãe sabe que, desde que deu à luz, nunca mais conseguiu terminar de ver um filme sem pausa ou ler sem ter que voltar sempre para os parágrafos anteriores. Talvez seja por isso que eu não consiga me encantar com o que todo mundo tem elogiado.

Desde o fim de novembro, salvo engano, eu tento ler "Ciranda de Pedra", de Lygia Fagundes Telles, para participar do Leia Mulheres aqui de Campo Grande. Aliás, um adendo: o grupo de leitura entre mulheres que só lê e discute autoras femininas é um alento para a mente de quem precisa fugir do tema maternidade. Eu só consigo comprar os livros, nunca fui às reuniões mensais, mas tenho esperança de conseguir agora em 2020.

Voltando ao livro, estou na página 40 (eu acho) desde que comecei. O maior tempo que me dediquei lendo foi quando consegui fugir para fazer as unhas. No mais, é deixar o livro pela casa para ele ser desmarcado e eu, pela milésima vez, tentar lembrar onde eu parei. Isso quando o menino de quase 2 anos daqui de casa não some com ele.

Eu já falei que esta coluna se destina a ser mais um desabafo do que ditar regras e dicas. Até porque, por mais que eu já seja mãe de segunda viagem, ainda não sei nada e aprendo todos os dias. 

Ontem consegui ver o final de "História de um casamento". Para mim, a única cena que valeu foi o resumo da maternidade, feito pela advogada Nora à protagonista Nicole, que ela precisa ser perfeita, porque assim que a sociedade enxerga uma mãe, baseada na Virgem Maria, mãe de Jesus. Transcrevo aqui o diálogo que me marcou:

..."mas as pessoas não aceitam esses defeitos numa mãe. Nem estruturalmente nem espiritualmente. Porque a base dessa nossa baboseira judaico-cristã é Maria, mãe de Jesus, e ela é perfeita. Uma virgem que dá à luz, e o pai nem se quer dá as caras. Ele sequer comeu a mãe. Deus está no céu, Deus é o pai e Deus sequer apareceu. Então, precisa ser perfeita. Charlie pode ser um fodido, não importa. Você sempre será julgada um nível acima". 

A cena me marcou tanto que valeu o filme todo. Talvez justamente porque eu o assisti em três etapas e esta foi a que consegui estar mais atenta, quando a bebê caçula dormia. Eu consegui voltar e fazer stories e, para minha surpresa, parece que todo mundo amou o filme. Eu sequer chorei, e pensei que não assisti direito.

Mas o fato é que não vi mesmo. Não vejo mais filmes como antigamente, não leio mais como em outras épocas. O que me prende a atenção é o que diz mais de mim como mãe. Talvez isso seja só uma fase e depois eu consiga voltar a não precisar de pausar ou reler parágrafos para lembrar de uma história. No entanto, acho que esse é um caminho sem volta. Eu nunca mais vou conseguir enxergar as coisas sem os olhos maternos. Isso tem o seu lado bom, e também o ruim.

Quero acreditar que o que me marca em páginas de livros ou cenas de filmes é o que ressignifica o que nós, mulheres e mães, vivemos. Em História de um casamento, eu tiro a lição para a vida: a gente tem que ser perfeita, é o que esperam de nós. E nós sempre seremos julgadas um nível acima. 

Quem quiser ver, o filme está na Netflix, e se você quiser entrar no Leia Mulheres, veja como na reportagem já feita pelo Lado B.  

Cena em que a advogada, Nora, descreve o que é a maternidade para a cliente, Nicole.
Cena em que a advogada, Nora, descreve o que é a maternidade para a cliente, Nicole.
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