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O trabalho intermitente

Por José Pastore (*) | 08/06/2017 09:56

O relator da reforma trabalhista, senador Ricardo Ferraço (PSDB/ES), propôs um veto ao trabalho intermitente, aprovado pela Câmara dos Deputados. A medida tem sido criticada pelos que consideram o trabalho intermitente como forma de trabalho precário, que deixa o trabalhador sem saber quando trabalhará e quanto ganhará.

As críticas mais frequentes comparam o trabalho intermitente com o trabalho em tempo integral, por prazo indeterminado e com vínculo empregatício que, de fato, tem um alto grau de proteção e previsibilidade. Mas, o trabalho intermitente é solução para as empresas e para as pessoas em diferentes situações como nos exemplos abaixo.

TRABALHO INTERMITENTE E DEMOGRAFIA - Nos países em que a idade mínima para aposentadoria é de 65 anos ou mais, os idosos precisam continuar trabalhando. Na falta de emprego em tempo integral,muitos passam a trabalhar de forma descontínua em lojas, shopping centers, supermercados, clínicas médicas e outras atividades que necessitam de serviços descontínuos. Para muitas dessas pessoas, inclusive, estudantes e mães, esse tipo de arranjo é adequado para a sua condição de vida.

TRABALHO INTERMITENTE E TECNOLOGIA - A entrada da digitação, computorização, robotização e inteligência artificial nos processos produtivos criou um grande número de atividades que podem ser realizadas a distância ou nos ambientes das empresas, de forma contínua ou descontínua. Hoje é comum a combinação do trabalho intermitente com o tele trabalho entre profissionais que fazem projetos novos, acompanham atividades em andamento, avaliam documentos, analisam dados, fazem reservas de vôos e hotéis etc., atendendo, assim, a demandas descontínuas.

TRABALHO INTERMITENTE E SAZONALIDADE - São inúmeras as variações de demanda ao longo do tempo que exigem o trabalho intermitente. Assim ocorre na atividade hoteleira, na construção civil e na agricultura ao longo do ano. Há também os picos de demanda (feriados e fins de semana) no comércio e em inúmeros ramos do setor de serviços - hospitais, clínicas, escolas, exposições, eventos etc. Há também picos de demanda que se repetem, mas, de forma descontínua, nos serviços públicos, esporte, entretenimento e outros.

Para as empresas, não compensa manter um empregado em tempo integral, com ociosidade, durante o período em que não há demanda. Para muitas pessoas, não há condições para trabalharem em tempo integral. Nos países avançados, o trabalho intermitente é usado há muito tempo sob a denominação de trabalho casual, trabalho contingente, trabalho à chamada, trabalho por hora, contrato zero hora etc.

A contratação nessa modalidade é de curta ou delonga duração. Pode ser por prazo indeterminado ou determinado, com jornada integral ou parcial. O trabalho intermitente envolve uma pequena parte da força de trabalho - cerca de 7%nos países avançados.Raramente, tais pessoas passam a vida inteira na intermitência. Ao contrário, elas entram e saem desse regime de trabalho de acordo com suas conveniências momentâneas ou para contornar o problema de desemprego (Eurofound, New forms of employment, Luxemburgo, 2015).

No Brasil, não será diferente. Havendo emprego e disponibilidade das pessoas, elas trabalharão de modo fixo, por prazo indeterminado e com vínculo empregatício. Não havendo emprego para todos ou para atender necessidades especiais das pessoas (estudantes, idosos, deficientes etc.), elas realizarão trabalhos intermitentes, por tempo curto ou prolongado. É ilusório pensar que as empresas vão contratar todos os auxiliares de forma intermitente.

As formas de remuneração e proteção social desse tipo de contratação variam bastante de país para país. No Brasil, o projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados propõe um nível de proteção bastante alto, com registro em carteira de trabalho e garantias trabalhistas (Previdência Social, FGTS, férias, 13º salário, repouso remunerado, adicionais aplicáveis etc.). Considero o trabalho intermitente bastante útil para as empresas e para as pessoas que precisam ou desejam acomodar suas necessidades nessa modalidade de trabalho. Vale a pena manter isso na reforma trabalhista.

(*) José Pastore é professor de Relações do Trabalho da USP (Universidade de São Paulo) e presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio/SP

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