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Por que não dá para dialogar com o machismo?

Por Vivian de Jesus Correia e Silva (*) | 11/10/2017 07:21

Ele anda na frente e deixa a mulher andando mais para trás. Não quer andar ao lado dela, ou dar as mãos. Sempre com pressa, não presta atenção. Corta o assunto.

Também acha desnecessário elogiar. De repente, ela se percebe falando sozinha. Raiva, tristeza, rejeição? Não. Agradece, mulher!

A mulher podia dizer assim: “obrigada por me deixar falando sozinha, querido, percebi que, falando sozinha estou mais acompanhada, do que quando eu achava que estava falando com alguém como você.” Ou ainda, outra sugestão: “obrigada amorzinho por mudar completamente de assunto enquanto eu te abria meu coração, assim e só assim percebi que não preciso mostrar nada de mim para você”.

Obviamente, tudo isso também pode e deve ser transportado para a realidade masculina. Os homens também sofrem. E sabemos que não dá, simplesmente, para levantar e ir embora, para terminar com ele/ela é mais difícil porque ele/ela se disfarça e volta. Com outra cor de olho, com outro tipo de cabelo. Muda até de nome e de profissão. Só que as ações, ah, as atitudes são as mesmas. Saiba reconhecer esse tipo social dentro ou fora de você, independente do seu sexo:

- Pára de acreditar que, para cada homem existirá uma mulher para completá-lo e para cada mulher existirá nalgum lugar um homem para completá-la.

- Pára de dizer que as coisas certas tem hora certa para acontecer. Temos 24 horas por dia para fazer o que é certo. Vai ter que se mexer, mudar, enfim, não tem jeito.

- Pára de querer a companhia de alguém para ter segurança. Procure você mesmo pela sua segurança, olhe melhor para entender a si mesmo e aos seus medos. Existe apoio profissional para isso e fica mais barato que a cervejinha semanal.

- Pára de querer colocar um macho em casa ou de induzir alguém a achar que isso é mesmo necessário.

- Pára de procurar ajuda masculina ou feminina para criar seu filho. Assuma a criança que você fez e faça mais do que pagar as contas ou contratar a babá ou escolher a escola. Faça companhia.

Depois de refletir um pouco, desconfia se:

1º) Ele/ela não quer participar da sua rotina nas coisas simples. Isso não é um vínculo afetivo decente. Dizer que ama e deixar a louça acumulada é um retrocesso afetivo

desnecessário na vida de qualquer ser humano.

2º) Ele não aceita receber uma carona sua. Um homem que ainda estranha uma mulher que dirige e se sente desconfortável com isso é, no mínimo, um ser fora do planeta.

3º) Ela sempre quer uma carona sua. Uma mulher que não garante seu próprio deslocamento é no mínimo um ser que pode estar mais afim das suas quatro rodas do que de seus bilhões de neurônios.

4º) Alguém que, para se sentir bem, precisa fazer a mulher/homem se sentir mal. Piadinhas não são inocentes, são formas de dizer para você, covardemente, os valores que a pessoa apregoa, mas não assume; pratica, mas não percebe.

5º) Ele/ela quer te convidar para conhecer (e te converter) para a religião dele(a) mas ainda não se deu ao trabalho de perguntar qual é a sua.

6º) Você está na carência? Talvez seja o subproduto de um relacionamento onde alguém está te rejeitando, não cumprindo os combinados, não dormindo junto depois do prazer, não atendendo aos apelos por reciprocidade.

7º) Vocês são muito ocupados e vivem cansados e estão endividados. Todo mundo está nessa. Por isso, ninguém precisa limpar o banheiro da casa de ninguém ou pagar as contas de ninguém. Ou lavar e estender a roupa de ninguém.

E se moram juntos, vale uma escala, escrita no papel e pendurada atrás da porta, com direito a assinalar um X na data da realização da obrigação e de quem pagou o quê.

Porque dessa, ninguém escapa. Nas tarefas domésticas, ninguém ajuda ninguém. Nas contas, ninguém ajuda ninguém. Trata-se de uma obrigação mútua para qualquer ser vivo que habita o ambiente doméstico: homens, mulheres, idosos, crianças e adolescentes. Todos comem, bebem e sujam e tem obrigações a cumprir. E se você não se sentir à vontade para fazer essa lista óbvia de distribuição de tarefas que estão correndo de forma injusta, volte para o primeiro item da lista.

Luta com mais força para a remoção dessa semente que plantaram aí no seu peito. É dela que germina a erva venenosa que vai te matar e acabar com todas as famílias.

Ela se alimenta da sua alegria e da sua saúde e, de troco, ainda alimenta todas as suas inseguranças e o pior de todos os seus medos.

Para matar o machismo não precisa se afastar dos homens. Nem culpar as mulheres, elas já carregam culpas demais. Até a Bíblia fala que foi por causa delas que perdemos o paraíso. Faça um serviço social e ético para a humanidade inteira. Mata o machismo dentro de você, todos os dias. Vigia suas atitudes.

Dicas? Deseduque as crianças dessa escola do mal. Dê bonecas aos meninos e carrinhos para as meninas. Quem sabe elas poderão dirigir mais cedo e se responsabilizar logo pelas próprias despesas. E quem sabe eles sejam pais mais presentes e carinhosos e, por isso, mais felizes. Assuma o risco de fazer, sem reclamar, um bolo com seu filho adolescente e pregar, sem xingar, umas prateleiras com a sua filha de sete anos. É difícil e todos nós estamos aprendendo. Tenha paciência. E insista sete vezes sete.

Mesmo que cause dor, não dá para aceitar na nossa vida pessoas que não venham para somar. Porque, fatalmente, ela/ele vai te subtrair das tuas reservas mais importantes. O machismo não deseja dialogar com ninguém.

(*)Vivian de Jesus Correia e Silva é psicóloga, doutoranda e meestra em Psicologia e Sociedade pela Unesp de Assis. Contato: vivianjesuscorreia@gmail.com

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