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Por que o STF não quer defender a democracia?

Por Jully Heyder da Cunha (*) | 21/09/2023 16:19

Os sofistas do STF querem construir uma verdade para chamar de sua. Nesta versão, moralmente sustentada pela necessidade de defender a invulnerável democracia em que vivemos, são eles os nossos salvadores. Seres iluminados, conhecedores do bem e do mal, incumbidos, sabe-se lá por quem, da excelsa função de extirpar, a qualquer custo, a menor ameaça que seja, às sagradas e insuspeitas Instituições do Estado Democrático de Direito.

Estão respaldados pela legião de desavisados que mal sabe o que é democracia, mas entendem necessária a cruzada inquisitorial em curso, afinal de contas, no famigerado 8 de janeiro, segundo o que se propagou pela teletela da isenta mídia nacional, estivemos sob sério risco de que todos os poderes da república fossem destituídos, para instalação da ditadura dos tresloucados e das vovozinhas do zapzap, todos perigosíssimos e fortemente armados com grandes pedaços de pau, bandeiras e com seus intestinos, com os quais deixaram manchas indeléveis em algumas salas dos palácios invadidos.

Qualquer um que se oponha a esta sagrada missão do STF é um herege. Merece a fogueira ou a guilhotina. Opções à livre escolha para os fãs de Alexandre Torquemada Moraes ou de Flávio Robespierre Dino. Sinto em dizer a você, democrata do X (nome escroto que colocaram no Twitter), que ninguém da Suprema Corte Real do Brasil está interessado em democracia. Tudo é hipocrisia. Na verdade, os hipócritas supremos querem apenas aumentar seu poderio, firmando o judiciário como o “poder moderador’ da república, ou seja, acima dos demais.

E o pior, esta hipocrisia é defendida tenazmente por muitos outros hipócritas, anônimos ou não, que decidiram fechar os olhos aos abusos cometidos, por pura conveniência política ocasional, ou seja, enquanto o porrete estiver descendo no lombo de quem está do outro lado, tudo bem! Talvez você, leitor, seja daqueles que se ofenderão com o que escrevo, mas antes de me xingar e parar de ler este texto, por favor considere minhas razões.

O mundo, pelo menos para nós, homo-sapiens, sempre foi selvagem, violento, miserável e injusto. Somente muito recentemente em nossa história, há cerca de uns 300 anos, é que se pensou em uma forma de organização social em que o ser humano pudesse gozar de um mínimo de dignidade. Esta dignidade, no fundo, nada mais é do que o conjunto de várias facetas do que podemos chamar de liberdade.

Liberdade de ir e vir, de manifestar o pensamento, de possuir bens, de viver e gozar de certo conforto e, acima de tudo, liberdade para escolher quem mandará na bagaça toda. Mas para que este poder de mando não fosse usurpado e comprometesse as liberdades, a grande jogada foi distribuir e balizar o seu exercício através, primeiro, de uma Constituição, cujo papel primordial era estabelecer limites de poder ao Estado, segundo, por meio da tripartição dos poderes (judiciário, legislativo e executivo), que possibilitaria, entre eles, o exercício recíproco de freios e contrapesos. (existem outros mecanismos de controle, mas vou citar apenas estes).

Seja como for, o objetivo primordial de toda democracia é o indivíduo, sua liberdade e sua dignidade. Por isso, apesar de seus problemas, o regime democrático, dentre todas as opções de organização social que se tem conhecimento, é considerada a “menos pior”. Dito isso, concluo que é impensável, porquanto impossível, defender a democracia sacrificando liberdades individuais.

Ninguém que promova inquéritos ilegais, transformando Juízes em investigadores, que relativize a liberdade de acusados, que utilize a máquina estatal como vingança e perseguição de inimigos, que desconsidere garantias processuais de réus, que mantenha presos políticos, ou, igualmente grave, que tente coagir advogados, seja pela intimidação ou pela execração pública de defensores, repito, ninguém que age desta forma, o faz em defesa da democracia, senão por interesse próprio.

Ao fim deste processo de agigantamento do STF, de abusos de poder e restrição de direitos, não tenho dúvida de que a nossa Democracia estará muito mais frágil do que era antes. E o Leviatã, que agora é alimentado por justiceiros da internet e imbecis de toda ordem, se voltará contra todos. Salve-se quem puder!

(*) Jully Heyder da Cunha Souza é advogado.

(@jullyheyder – instagram)

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